Capítulo Dezesseis - Beco Sem Saída

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   O desespero se apodera do meu peito. A pedra fria e íngreme se apertava contra minhas costas, deixando a sensação incômoda ainda maior. Não dava para saber se os tritões ainda estavam em perseguição, mas era um risco que eu não podia correr. Se eu colocasse minha cabeça para fora do esconderijo - no caso sendo a pedra -, provavelmente me viriam (se estivessem olhando na minha direção).

   Quando olhei para o lado, na direção de Miranda, percebi que ela estava assustada. Mesmo tentando conter isso, a sereia não podia negar o medo decorrente dentro dela. Seus olhos estavam fechados com força, como se dessa forma ela pudesse fazer com que toda aquela situação deixasse de existir.

   "Era o que eu queria...", pensei. Pela primeira vez desde que adentrei no lago, respirei fundo. Com medo. Assustado. Desesperado.

   Mas no segundo seguinte percebi que tinha feito a pior coisa para o momento.

   O Povo da Água - generalizando as sereias e os tritões -, quando respiravam, não produziam bolhas de ar, que subiam para a superfície. Mas humanos sim. O Assopro do Sereia apenas nos fazia respirar sem dificuldades debaixo d'água. Mas não impedia a criação das "bolinhas brancas".

   E quando eu respirei fundo, acabei esquecendo desse detalhe - de inspirar e expirar sempre o mais sutilmente possível, até porque estávamos em uma missão secreta -. O que, logicamente, acabou causando as bolhas de ar.

   Quando elas saíram do meu nariz e começaram a subir, percebi que tinha condenado à mim, Miranda, e até mesmo à Serena. Foi como se tivesse assinando minha "sentença de óbito".

   Miranda tinha aberto os olhos no mesmo momento em que eu fiz esta estupidez. Sua expressão mudou de um medo nem tão grande - a esperança ainda reinava em seu coração - para um medo voraz e persistente. Neste momento, nossos pensamentos eram os mesmos: "Estamos mortos".

   Prendi a respiração, esperando que a trilha de espuma sumisse. Mas logo percebi que isso seria impossível. Já havia feito aquilo. Agora tinha que arcar com as consequências.

   Olhei na direção de Miranda, esperando que ela pudesse ter um plano. Mas, ao olhar para os seus olhos, percebi que ainda não tinha bolado nada para nos salvar. Pelo menos não por enquanto.

   Eu queria poder afundar na areia abaixo de meus pés; queria poder me fundir a pedra às minhas costas; queria poder nadar até a superfície. Mas nada disso era possível.

   Já tinha me preparado para a morte quando Miranda pega minha mão, apertando-a mais precisamente acima do pulso. Após isso, o puxão que ela dá na sua direção era mais que suficiente para arrancar meu braço. Meu corpo entrou levemente em contato com o dela. Sua cauda tocou de leve na minha perna, mas de alguma forma o toque não foi como eu imaginava. Pensava naquela parte como sendo mole e frágil; mas aquele contato rápido foi mais do que suficiente para eu tomar a conclusão de que era rígida; forte o suficiente para locomover e sustentar o corpo.

   Encolhi os ombros, mandando uma mensagem silenciosa de questionamento. Mas ela apenas balançou a cabeça da esquerda para direita duas vezes, em sinal para que eu permanecesse em silêncio. Em seguida olhou para o seu lado direito. Me inclinei para a frente, a fim de ver o que ela estava observando.

   Havia outro aglomerado de pedras - que quase se tornavam invisíveis devido á escuridão -. O único porém é que estavam em uma distância muito grande. Com certeza os tritões nos veriam quando saíssemos do nosso "esconderijo".

   Quando Miranda voltou a olhar para mim, tentei ao máximo usar expressões para mostrar minha dúvida em relação ao plano de fuga. Sei que minha face ficou revirada para várias posições diferentes, mas acho que Miranda as entendeu, porque aproximou os lábios da minha orelha e disse:

Sereia - A Prisioneira Da ÁguaOnde histórias criam vida. Descubra agora