Me dei conta de que a carta da qual ela falava era sobre a minha relação com o Gui, sobre o que as pessoas chamam de "dar mais um passo no relacionamento", e eu precisava muito falar sobre isso.
- O que a senhora tem para falar sobre esta carta?
- Primeiramente, quero saber, até onde vocês foram?
- Do que exatamente a senhora está falando?
- Ótimo, já vi que não foram muito longe. - me senti uma garotinha ingênua. Filha, sinceramente, te acho muito nova, na minha época mãe e filha só tinham esse tipo de conversa depois dos 18 anos.
- Mãe, as coisas mudaram.
- Eu sei, eu sei bem, Isadora. - respondeu impaciente. Só espero que entenda porque não toquei no assunto antes e que será difícil para mim falar disto, porque você ainda é uma garotinha pra mim. - fiquei envergonhada por parecer precipitada demais, e mamãe percebeu. Não precisa fazer esta cara, não vou te condenar. Veja a contradição: apesar de eu te achar muito nova, não penso que exista uma idade certa para cada coisa acontecer, como você disse na carta. Nossa vida não segue, por mais que a gente tente, um planejamento minuciosamente pensado, às vezes, as coisas simplesmente acontecem. Talvez também não estivesse nos seus planos ter essa conversa agora, mas aí você começou a namorar e tudo mudou.
- Sim, sim, foi exatamente isso! - tentei me explicar.
- Sinceramente, - mamãe soltou os ombros num suspiro profundo - não sei se sou a melhor pessoa para você conversar. - recuou.
"O QUÊ??? Se ela não era a melhor pessoa, quem seria???", pensei.
- Como assim, mãe?! Por quê?!
- Filha, em todas essas cartas você questionou a educação que te dou, questionou meus atos, minhas decisões, falou de mal de mim... Por que agora eu pareço a pessoa certa para te aconselhar sobre isso? Por que você confiaria em mim? Não faz o menor sentido. - "Não, não, não, pelo amor de Deus, não!", entrei em desespero.
- Mãe, por favor, a maioria das cartas foram escritas em momentos de raiva e, além do mais, era fácil falar sobre todos os outros assuntos porque eles envolviam só eu e você, mas este assunto envolve eu e o Gui e eu não posso pedir esse tipo de conselho a ele.
- Aja conforme sua consciência.
- Minha consciência não funciona bem quando ele começa a me pegar.
- Ah, Isadora... - mamãe esfregou a mão na testa sem saber o que fazer.
- Mãe, por favor!
Um silêncio demorado aumentou minha aflição enquanto minha mãe parecia escolher suas palavras, até que disparou.
- Filha, se você confia no Gui, se sente que ele respeita seus limites, se você está com vontade também e se acha que conseguirá segurar a barra caso ele te deixe amanhã ou depois, não precisa dizer "não". Se permita, deixe ele beijar e tocar seu corpo, guie ele conforme sua vontade e vá aos poucos, não tem porque se precipitar, curta uma coisa de cada vez. Até chegar lá.
Meu queixo caiu.
- Não diga não sem motivo, mas diga sim com responsabilidade. Está entendendo?
Ainda estava imóvel.
- Não diga a seu pai que falei isso e não volte a falar comigo sobre este assunto! - começou a caminhar de um lado para o outro. Ainda te acho uma menina, mas preciso me acostumar com a ideia de que não mando em você. Não era isso que você queria? - parou de repente.
- Sim!
- Então pronto. - voltou a caminhar pelo quarto. Seja responsável o bastante para lidar com a liberdade que estou conferindo a você.
- Sim senhora. - respondi balançando a cabeça para cima e para baixo.
- Preciso de um copo d'água para me acalmar. - e saiu do quarto.
Levantei da cama rapidinho e espiei as cartas que faltavam. Elas não eram muito legais, peguei pesado com minha mãe. E, agora, ela tinha sido tão legal comigo ao conversar sobre minha possível primeira vez que eu não tinha coragem de seguir adiante, não para magoá-la. Precisava sumir com as cartas restantes e fazer morrer toda essa discussão. Enquanto pensava e controlava sua aproximação pelo barulho dos seus passos meu coração se acelerou e eu podia senti-lo forte se expandindo e retraindo dentro do meu peito, numa sensação de adrenalina intensa e real.