O Outro Eu

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Eu olhava incrédula e assustada para Kyro, meus pulsos começavam a doer por conta da força que ele exercia sobre eles....

— N-não sei do que está falando Kyro.... — eu tentei manter minha voz firme — Agora solte-me.

Kyro apertou ainda mais meus pulsos, sentia como se a qualquer momento eu fosse quebrar nas mãos dele...

— Não minta para mim! — ele gritou, fazendo com que eu me encolhesse de medo

— Eu já te falei, não sei do que está falando! Eu fui embora da festa antes de toda a confusão começar! — gritei enquanto tentava soltar meus braços.

— Então como você estava lá minutos depois fechando a porta para o jardim?! Você não tem nenhuma irmã gêmea para culpar, como espera sair dessa?! — ele me puxou, os olhos dourados transbordando de raiva.

Nunca vi Kyro desse jeito... Ele estava me fazendo tremer dos pés à cabeça de tanto medo.

Mas eu não sabia de nada. Não tem a mínima chance de eu ter feito algo. Na hora do acidente, eu já estava na carruagem com Sebastian voltando para casa.

— Kyro, eu juro pela rainha que não era eu.

Apesar de dizer, eu não tinha mais tanta certeza se era verdade ou não.

Ele estava certo, eu não tinha uma irmã gêmea, então como eu poderia estar em dois lugares ao mesmo tempo?

Não tínhamos relatos de nenhum SM por perto, o que eliminava qualquer chance de ser um impostor ou um doppelganger.

Eu pensava rapidamente numa saída, sentia como se meus braços estivessem se partindo pela força que Kyro usava. Já até podia ver a roxidão por sob os dedos finos do meu noivo....

— Agradeceria se o senhor soltasse a senhorita Luna, senhor Tokudaiji... — a voz de Sebastian ecoou pelo quarto, fazendo com que eu e Kyro olhássemos para a porta.

Sebastian o encarava como a uma presa fácil. Eu sabia que na primeira oportunidade, Kyro seria atacado por meu mordomo...

Como se lesse meus pensamentos, o que não duvido que tenha sido o caso, Sebastian sorriu para mim.

— Irei terminar com isto rapidamente então... — logo depois de dizer isso, ele caminhou até Kyro, apertando suas mãos que ainda seguravam meus pulsos. — A senhorita Luna está acomodando-o de bom grado em casa, não é nada cavalheiro tratá-la assim....

Kyro olhava assustado para Sebastian, que com certeza o estava machucando com aquele simples toque em suas mãos.

Tão logo Kyro me soltou, Sebastian deu um passo para trás, ficando ao meu lado e fazendo uma reverência para meu noivo assustado. Em seguida, pousou a mão sobre meu ombro levemente, indicando que o acompanhasse.

— Agora, peço para que o senhor vá descansar. Amanhã cedo uma carruagem estará aguardando para levá-lo para casa. — Sebastian sorria enquanto dizia isso, mas sua expressão era a de um assassino. Ele olhava para Kyro com um olhar penetrante, que deixava o garoto a sua frente imensamente perturbado. — A senhorita Luna irá se retirar agora... Se nos dá licença...

Olhei rapidamente para Kyro, mas continuei caminhando até sair da sala. Eu sentia as marcas que as lágrimas tinham deixado em meu rosto, esfreguei meus olhos com a manga de meu vestido e olhei para Sebastian, que caminhava firmemente ao meu lado.

— A-arigatou Sebastian.... — eu disse com a voz baixa

— Não fiz mais que o meu dever. Como um bom servo, devo sempre proteger meu mestre... — ele sorriu para mim, abrindo a porta do meu quarto e me dando passagem.

Ele entrou atrás de mim e pegou uma caixa na cômoda, logo indicando que eu me sentasse na cama e ficando de joelhos aos meus pés.

Eu observava atentamente enquanto ele retirava suas luvas e abria a caixa, ele melou um pouco os dedos com a pasta que estava em seu interior, passando-os sobre meus pulsos arroxeados.

As mãos de Sebastian me tocavam com uma delicadeza incapaz de ser sentida pelas mãos de um homem. Uma delicadeza que, apesar de não poder provar, eu tinha certeza que não existia em nenhum outro demônio.

Ele era o meu demônio e o meu mordomo, era o único que podia me tocar tão gentil e respeitosamente...

— Perdoe-me, my lady.... — eu voltei a olhar àqueles olhos rubros à minha frente, pelo que ele estava se desculpando dessa vez? — Mesmo jurando que não deixaria ninguém lhe ferir, mesmo depois de ter prometido que ninguém a tocaria.... Eu permiti que algo assim acontecesse com a senhorita....

Eu senti meu rosto queimar e desviei o olhar, fitando a parede cor de vinho.

Em um momento ele era Sebastian, meu mordomo ágil, pervertido e forte; um demônio. No outro, ele era apenas o Sebastian, o demônio que me encontrou e cuidou de mim por todos esses anos, o meu demônio.

— Não se desculpe com isso.... — eu disse baixo, logo olhando para ele. —...Você sempre está lá para mim quando eu preciso, então você não quebrou nenhuma promessa...

Ele sorriu para mim com olhos brilhantes, colocou minhas mãos entre as suas e as beijou.

— Eu sempre estarei ao seu lado, my lady.... — ele se levantou e fez uma reverência — Estarei com você até seu último suspiro... Farei da sua vida a minha.

A expressão dele era triste, mas mesmo assim ele ainda mantinha seu sorriso. Logo ouvimos um barulho de passos do lado de fora do quarto, deveria ser Kyro. Sebastian fez uma reverência e, após eu assentir, saiu do quarto.

Eu olhei para o porta-retratos na escrivaninha, já começara até a duvidar de se esta sou eu mesma. De que eu sou meu eu real....

Minha cabeça dói.... É como se alguém estivesse entrando na minha mente e tirando tudo do lugar... Deito-me e permito que meus olhos se fechem, esperando por uma noite tranquila e descansada.

Antes da escuridão dominar, vejo a figura de alguém do outro lado da janela olhando para mim.

Aquela sou eu?


Devorar-te-ei: memórias póstumas de um amorOnde histórias criam vida. Descubra agora