É hora de mudar

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Quando o dia chegou ao fim e Sebastian não voltou, a ficha finalmente caiu. Em todos aqueles anos, eu já havia ordenado que ele se afastasse, mas... Ele nunca havia obedecido de fato. Então por que o fez logo agora? Quando o contrato não nos prendia mais?

Eu estava livre agora. Algo que secretamente desejei em diversos momentos em minha vida, sempre que Sebastian se tornava alguém difícil demais para se lidar. Mas acreditar que ele havia me abandonado era simplesmente... Impossível.
E não era só eu. Apesar de não terem dito nada, os empregados estavam estranhando a ausência do mordomo, principalmente Meyre, que era sua substituta sempre que ele não estava presente.

Sabia que não podia culpar inteiramente àquele que estava por trás dos ataques dos SM's, aquele que tentava me destruir a todo custo... Eu tinha sido a única a mandar Sebastian embora no calor do momento.
Eu olhei meu reflexo no espelho do quarto. Como a maioria das minhas roupas, minha camisola cobria eficientemente a marca do contrato, então eu a puxei levemente para baixo, apenas para ver que ela não passava de uma mancha disforme em minha pele clara. As correntes que cobriam a marca também desapareciam aos poucos, embora estivessem bem visíveis ainda.
Com o indicador, acariciei minha pele, bem onde a mancha estava. Eu tinha aquela marca desde que podia me lembrar, desde o acidente. Vê-la desaparecer assim... Ver meu salvador partir... E eu não podia fazer nada, não podia recorrer a ninguém...

Ou melhor, havia sim uma pessoa.

Eu desviei meu olhar para a janela do quarto, vendo a lua já alta no céu. Eu poderia ir até lá sem nenhum problema... Talvez até fosse melhor, assim ninguém me veria.
Mas... Sair sem Sebastian enquanto eu estava sendo o alvo de diversos ataques, ainda mais a noite... Só a ideia foi capaz de fazer um arrepio gélido percorrer minha espinha.

Eu agitei minha cabeça negativamente, espantando aquelas ideias. Com certeza Sebastian apenas estava se divertindo comigo como sempre fazia, ele me acordaria amanhã pela manhã com aquele sorriso sedutor e divertido no rosto, gabando-se por eu ter sentido sua falta e me preocupado...

Eu bufei mal humorada e arrumei minha camisola de volta no lugar, voltando a encarar meu reflexo. Eu não podia ser tão... vulnerável.
Se meu próprio mordomo era capaz de me balançar assim, seria ainda mais fácil para os SM's e aquele que os controlava, não é? Chegar até mim e se divertir com meu sentimentalismo...
Lancei um olhar decidido a mim mesma, encarando meus olhos no reflexo por um segundo ou dois antes de finalmente dar as costas ao espelho e ir para a cama.

......


Eu escutei o som das cortinas sendo abertas e logo em seguida senti o calor do sol sobre minha face. Eu estiquei meus braços, com um sorriso vitorioso nos lábios, sabia que Sebastian voltaria... Estava feliz por não ter corrido atrás dele, pra variar.

- Espero que tenha gostado do seu dia de folga. - eu resmunguei, ainda sonolenta, enquanto esfregava meus olhos.

- A-ah! B-bom dia, My lady...! - A voz de Meyre me surpreendeu, fazendo com que eu piscasse rapidamente pra tentar identificar sua figura contra a luz que vinha de fora. - Bardo já está preparando vosso café.

Eu a encarei em silêncio por um longo segundo. Se ela e Bardo faziam as tarefas de Sebastian era porque ele não havia retornado, isso fez meu sorriso desaparecer de imediato enquanto eu me sentava com calma. Eu senti um desagradável aperto em meu peito, que só piorava conforme a ideia de que estava sozinha agora se assentava em minha mente.

Eu não tinha mais família. Juro estava morto. E, agora, Sebastian não estava mais ao meu lado...
A mansão pareceu gigante e silenciosa de repente. Assim como minha vida.
Eu precisava lutar e me manter firme para honrar o sobrenome da minha família, mas... Com que finalidade? Quanto mais avançava, mais perdia. Quanto mais tentava, mais parecia errar... E isso não se aplicava só a minha vida profissional, mas aos meus relacionamentos também.

Devorar-te-ei: memórias póstumas de um amorOnde histórias criam vida. Descubra agora