Azul Marinho

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- BRENDA!

- Eu mesma, só que com uma parte da costela a menos, mas ainda sou eu!

Eu pulei do décimo degrau para o último como se eu tivesse acabado de saber que os livros do Nicholas Sparks estavam em promoção, eu a abracei como se só fossemos nós duas no mundo:

- Aperte um pouco menos Valentina.

Brenda respondeu com uma voz triste, de dor, como se eu estivesse esmagando ela.

- Ah, claro, claro, você tá bem agora, certo meu esquilo favorito?

- Nada que uma boa massagem nas costas não resolvam senhora Chevalier.

Ótimo, Frederico está no fogão fritando bacon, nada melhor que fritura a essa hora da manhã.

- O Heitor não vem, Frederico?

- Ele me disse que só vem a noite pra nossa sessão de cinema.

- Mas que sessão de cinema?

- SURPRESA!

Obrigada, mais uma surpresa, já estou vendo que o Fred vai chorar vendo Titanic pela décima oitava vez, a Brenda vai ficar deitada se entupindo de pipoca, a Liz vai rir das cenas de morte, Heitor vai ficar no celular a noite toda e eu vou ser a única que vai prestar atenção ou vou acabar dormindo ouvindo o Fredinho chorar.

- Quanta gordura!

- Se não quiser vai plantar o que comer, Eliza! - Frederico respondeu rindo

Mais um dia na minha adorável família, devem estar se perguntando "Mas cadê o seu pai?" é uma longa história mas eu adoraria contar.

Meu pai se chamava Azure Chevalier, e ele era realmente um grande pescador, segundo a minha mãe, ele que fez o nosso nome ficar conhecido na cidade. Mas ele não era um simples pescador, ele capturava baleias, golfinhos, pra vender para aqueles parques aquáticos sabe? e coisas do tipo, minha mãe disse que já me levou em um, e que eu passei a mão em um golfinho e disse:

- Amarelo!

O grande Azure enfrentou diversas noites em alto mar, tanto tempo nas águas e se alimentando somente de animas do mar, que ele se recusou a comer peixe até nos últimos dias de vida, é engraçado se você sabe que ele é um pescador. Tia Rose disse que a vela do navio do meu pai era um branco forte, que dava pra ver de longe, que quando a luz do farol batia nela reluzia em toda a costa da praia, forte igual aquele navio, que ele carinhosamente apelidou de Tina, e que hoje só restou uma miniatura em uma garrafa que a gente guarda na estante da sala de estar.

Minha casa é no topo da cidade, da pra ver toda a costa, e o mar lá longe, e já da pra sentir o quão grande ele é, as vezes eu imagino meu pai vindo de navio com aquela vela estiada, gritando "Valentina venha ver de perto" com um monte de peixes, que dariam pra um mês todo.

- Valentina volta aqui, pare de pensar longe! - diz Frederico colocando o bacon em um prato

- Meus pensamentos tão no mar. - respondo baixinho 

- Como poderia uma coisa tão grande, grande em tamanho e em sentimento, caber dentro de uma garrafa dessas? - pergunto olhando pra miniatura

A Brenda olha no fundo dos meus olhos e sussurra no meu ouvido:

- Você também não é muito grande, mas tem o amor do seu pai todo ai dentro.

Foi quando eu percebi que não era pra eu pensar muito naquilo, Brenda estava certa. Vamos passar a tarde ouvindo música alta enquanto a minha mãe dorme, ou respondendo a testes de revistas femininas.

- TARDE DAS GAROTAS! - diz a Liz olhando pro Frederico

- Ai como eu queria que o Heitor estivesse aqui.

- MESMO ASSIM AINDA IA SER A TARDE DAS GAROTAS!

Olho pra Brenda e sinto a dor por ela, será que o sorvete valia mesmo aquilo tudo? Ou, sorvete não é uma boa história, ela poderia estar inventando, isso é coisa pra se falar amanhã, essa é a nossa noite, a noite antes de mais um ano de livros didáticos e discussão com professores, vamos ser o agora.


Cor FavoritaOnde histórias criam vida. Descubra agora