A Origem dos Guardiões - Livro I (Em Revisão)

3 - Confissões

Cinquenta anos passaram em um piscar de olhos. Não ocorreu qualquer mudança física em Jack ou em mim, envelhecer nessa vida nova não era uma consequência que nos afetaria externamente. O tempo deixou de ser um vilão para nós. Durante esses anos, Jack e eu só fortalecemos nossa união. A parceria entre nós dois estava indo em frente a todo vapor. Contudo, durante esse período, pude ver crescer em mim um sentimento diferente pelo rapaz, algo que nunca tinha sentido nem quando humana. Sim, Jack virou minha primeira paixão, meu primeiro amor. Entretanto, contar a Jack o que sentia não era uma opção, pois não sabia se esse sentimento era mutuo. Não iria por em risco nossa parceria porque cai nas garra do amor, então apenas guardei aquele sentimento para mim mesmo. 

Ao longo desse cinquenta anos, com árduo treinamento, fui capaz de desenvolver meus poderes pouco a pouco. Eu conseguia emanar uma espécie de luz por todo o corpo, ao qual me permitia clarear lugares escuros com o auxilio de um único dedo. Também era capaz criar uma barreira protetora a minha volta e de quem mais eu quisesse proteger. Meus sentidos também foram aguçados, me tornando capaz de ouvir o menor dos barulhos, enxergar mesmo sem luz e adquirir um sexto sentido. Eu não era capaz de voar ou sequer planar, não havia conseguido desenvolver tal dom, nem sei se iria algum dia. Contudo, com o pouco que já era capaz de fazer me alegrava, faziam com que eu não fosse mais a única "normal". Jack foi a maior e principal ajuda para descobrir meus dons, fato que só nos aproximou. Existia uma conexão natural entre nós difícil de explicar, tanto que aprendemos a nos entender muito rápido. E um dia essa conexão respondeu aos meus anseios mais profundos.

No final de mais um dia de treino, estávamos descansando próximo do precipício do monte onde decidimos constituir nossas base. Havia sido mais um treino puxado para ambos, onde pudemos desenvolver mais nossas habilidades físicas. o objetivo poderia ser descobrir novos poderes, mas se manter em forma era um bônus para usar contra qualquer ameaça que pudesse surgir. A noite estava linda aquele dia, onde o céu se tornou uma obra de arte estrelada. Não resisti e me sentei na beirada do precipício para contemplar aquelas lindas luzes. Foi inevitável não me lembrar das poucas coisas boas que aconteceram em minha vida humana, as únicas que pretendia permitir permanecer em minha memoria. Era sempre assim quando eu contemplava as estrelas, o mundo parecia sumir e só existia eu e aquelas vagas lembrança de um passado muito distante, antigo e perdido muito antes de eu renascer como Angel. Nunca contei para Jack sobre minha história passada, sentia que ainda não era o momento. Muito ainda me assombrava, mesmo passando-se esses anos todos, haviam muitas feridas profundas a serem cicatrizadas completamente antes que eu estivesse pronta para mencionar sobre qualquer coisa sobre.

—Adoro esse seu jeito de olhar para as estrelas. — Jack senta ao meu lado, me tirando de meus devaneios.

—Que jeito? — estranhei, não sabia que tinha alguma mania enquanto estava no piloto automático.

—Você todas as vezes apoia suas mãos para trás de seu corpo, balança as pernas e abre um lindo sorriso quando observa as estrelas. É como se elas te trouxessem boas lembranças.

—Só um singelo passado distante. - dei de ombros -Nunca havia percebido que tenho certas manias quando faço isso. - mudei de assunto, não querei manter o foco em minhas lembranças.

—Eu particularmente amo quando fazes. — Jack passou a mão com carinho em meu rosto e me prendeu numa espécie de transe com o seu olhar terno.

Apesar de suas mãos estarem naturalmente geladas, seu toque me aqueceu. Tudo que eu mais queria naquele momento era beija-lo. Meus sentimentos gritavam dentro do meu peito para eu executar aquela ideia. Foi só então que eu percebi que a pressão que eu fazia para esconde-los estava me sufocando aos poucos. Eu teria de externa-los mais cedo ou mais tarde.

—Posso te contar um segredo que guardei por muito tempo? — Jack perguntou, ainda acariciando meu rosto com delicadeza.

—Pecado seria se você não confiasse na sua confidente favorita. — empinei o nariz, arrancando boas gargalhadas do rapaz —Mas diga lá, em que posso ajudar?

—A verdade, Angel, é que, desde o dia em que te encontrei na floresta, sinto algo diferente por você. No inicio pensei que era gratidão, você foi uma luz na escuridão pra mim, um guia quando eu estava sem rumo. Tudo mudou no momento em que ti vi sair detrás daquela árvore. Não sei como e o por que, mas eu me senti fortemente atraído por você. — Jack pausou o carinho e me olhou fixamente —Com o tempo percebi que te amo Anjo, de verdade. Pensei que conseguiria manter esse sentimento escondido de você, temia perder até sua amizade caso esse amor não fosse recíproco. Meu medo de perda era maior que meu desejo por você. — ele pressionou seus lábios em uma linha reta, pareceu estar se reprovando pelo que dizia —Mas não dá mais, não consigo mais. Tudo o que mais quero agora é você.

Fiquei momentaneamente sem reação. O garoto por quem eu nutria sentimentos estava ali diante de mim se declarando, dizendo tudo aquilo que não tive coragem de dizer. Sem pensar em qualquer outra reação ao tamanho do momento, aproximei mais nossos rostos e encostei meus lábios de leve nos dele, aguardando por sua resposta. Jack gentilmente colocou sua mão livre em volta de minha cintura e passa a mão que estava em minha bochecha para minha nuca, correspondendo ao meu beijo. O beijo de Jack era como saborear um sorvete delicioso em um dia de sol em um parque de diversões. Só conseguia querer mais e mais daquele beijo. Mas infelizmente o ar foi necessário e tivemos de ceder por um breve momento.

—Pensei que eu fosse a única que estivesse com medo de revelar seus sentimentos. — colei nossas testas e dei uma leve risada —Eu também te amo Jack. Desde que ouvir sua voz, antes mesmo de ti ver, senti algo diferente, uma atração magnética. Como você, eu tinha medo da rejeição e da perda. O fato de poder perder ao menos sua amizade me doía mais do que a dor de esconder meus verdadeiros sentimentos, por isso não falei nada até hoje. — olhei fixamente em seus olhos.

—Não vou sair do seu lado, Angel, nunca. — Jack me abraçou forte -Te amo!

—Também te amo Jack! — o abracei de volta com a mesma ternura que senti em seus braços.

Tudo o que mais queria era ficar ali, naquele momento. Não queria que nada mudasse dali e diante, que tudo permanecesse assim. Que ingenuidade da minha parte. Noticias ruins costumam vir logo em seguida a algum acontecimento bom, isso é um fato. E não seria diferente naquele momento. É como dizem, jamais profira a palavra "nunca", pois ela pode se voltar contra você.