Estava lá eu, enquanto entardecia, no terreno baldio que costumava ser nosso, aliás, deles. Nunca senti-me na liberdade de chamar de meu, não era nada além de vazo, tudo que estava ali, nada daquilo foi feito por mim, apenas por eles. Eu era apenas um intruso.
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O inverno rigoroso dava início. As tardes começavam a durar cada vez menos, já quase parecia noite. No centro uma fogueira grande aquecia-nos e iluminava-nos. Cervejas descongelando no chão, o eflúvio da erva que misturava-se com a madeira a queimar e uma pequena caixa de som que tocavam músicas extremamente sinônimas da cena, casava-se tão perfeitamente que fazia-me acreditar que, por um instante, estávamos dentro de um videoclipe.
Jimin ria escandalosamente, como sempre, o rosto saudável e a harmonia n'alma que era refletida pelos seus olhos, alaranjados da luz do fogo. Yoongi ao seu lado, quando decidia falar empolgava-se e quem o interrompesse recebia o olhar icônico de descontentamento. Os outros o provocava, o interrompia no propósito de vê-lo emburrado. Arrancavam-lhe risos. Era tudo uma brincadeira compreensível.
Seokjin finalmente enturmava-se. Não bebia, não fumava, não precisava de nada disso – o que punha-me a pensar, às vezes, que sou um babaca por fazer tudo isso –, ele apenas dialogava e ria em voz alta. Deixou ser criança com seu riso infantil. Seus pulsos enfaixados fazia-me quase esquecer o que havia escondido em baixo.
Taehyung, como todos os outros, era sempre barulhento, fazia graça e divertia-se imitando os mais novos. Mal parecia um dos mais velhos. Mesmo que um pouco embriagado o seu humor era extremamente pacífico. Ele estava feliz.
Jeongguk era levado pelos mais velhos, extremamente descontraído pelo efeito daquilo que tabaqueava, jogado nos escombros do sofá velho, movia seu corpo levemente no ritmo da música que tocava.
Namjoon acabava de chegar, de voltar, carregava algumas sacolas plásticas que deixava em algum canto onde não fosse chão e sentou-se ao lado do de mesma idade.
A madeira estalava, virava cinzas e alguns pequenos resíduos flutuavam pelas chamas e navegavam pelo ar, destacando-se, em laranja chamativo, na escuridão do céu nublado.
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Utopia.
Eu caminhava pelo local, era extremamente gelado. Restos de cinzas no chão, restos de noites que nunca existiram.
Auto questionava-me sobre aquele lugar. Por quê? Pra quê? O sentimento de nostalgia é uma desgraça. Eu era um filho do romantismo; dividido em três. Começa com o amor exagerado, caminha até a melancolia e, por fim, liberdade. Ultrarromântico. Vivendo o meu singelo momento de pessimismo extremo.
A ponta dos dedos corria a extensão dos móveis velhos. Sentia a textura deteriorada de tudo aquilo. Questionava-me de como conseguiam chamar aquilo de lar. Agora era deserto, não era mais de ninguém. Chegava a ser triste.
"Perdeu-se por aqui, Hoseok?" A voz que surgia repentinamente, sem nem sombra de aviso assustava-me. Virei-me para ele por impulso. "Fica calmo, não vou te bater ou algo assim." Ele nitidamente ironizava acontecimentos de imensa desgraça.
Yoongi era o típico sem importância. Nada o afetava de fato. Nunca tinha expressão nenhuma na cara, apenas mostrava ser bem-humorado quando queria. Os problemas alheios não o atraem. Ele aparentava guardar mais segredos que qualquer outro. Independente do quanto você tentasse notar em seus olhos pequenos algum sentimento, tudo que ele tinha era opacidade nos castanhos escuros.
Não era de dialogar comigo, porque, como dito, ele não dava a mínima. Por muito tempo achei que o que ele sentia era algum tipo de repulsa, desgosto ou ciúme, mas ele incrivelmente só tinha nada na cara para quem o encarasse por mais tempo que um relance.
O que me chamava atenção, porém, além do corpo extremamente esguio, eram os brincos nas orelhas e o cabelo colorido. Amenizava com toda a delicadeza dos tons pastel a face ríspida.
"Achei que morreria sem ter uma palavra sua direcionada a mim." Devolvi-lhe da mesma ironia que gostava de usar.
"Não seria nada mal." Debochava quase monossilábico.
"E o que você está fazendo aqui? Veio me culpar pelo Jimin?"
"Não. Não é culpa sua ele ser um idiota. Nem dele por estar cego. Se ele foi para o hospital três vezes só nessa semana é porque ele procurou por isso." Ele esperou por uma possível resposta, coisa que obviamente não recebeu. Eu estava calado pelas verdades que me eram ocultadas. Em consequência, retomou: "Julgar culpa entre o que há legislação é complicado demais, é por isso que a culpa sempre é das divindades e do destino."
Novamente o silêncio sufocante. Eu estava possuído de perturbação enquanto o mais velho encarava qualquer coisa sem expressar absolutamente nada, com seus olhos vazios, não parecia sequer sentir alguma coisa.
"Eu—"
"Na verdade, eu vim por um motivo." Ele interrompeu-me. Causava-me o anseio de não esperar nada vindo dele, mas ao mesmo tempo sentia-me completamente aliviado de não ter que passar pela vergonha alheia de não ter nada pra dizer. "Esse."
Esse. Uma única palavra para conseguir explicar muita coisa. Caminhou até mim e entregou-me um frasco de comprimidos qual eu me lembro de entregar para Jimin. Eu esperava pelo momento que ele explicaria o mote de encontrar-se com aquilo, eu esperava por ele dizer que eu mentia para todos os outros, mas ele apenas encarou-me com os olhos levemente tortos que tinha e deixou o lugar.
Passei a encarar o vidro em minha mão, girei-o até que pudesse ter a etiqueta adesiva em sua superfície em minha direção. Ainda estava escrito, mesmo que fraco, o meu próprio nome na letra d'outro menino.
Ele cuidou tanto de mim que esqueceu-se de cuidar de si mesmo.
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Desfecho.
Fanfiction[longfic | bangtan | drama | hoseok!pov | hopexall] "[...] Joguei tudo que carregava no chão, sem o menor cuidado, antes de atirar-me contra os lençóis brancos. Encarava o gesso, também branco, do teto e repensava sobre toda aquela semana. Tudo pare...