TREZE: Ninguém

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Jeongguk parecia aos poucos se distanciar. Eu sequer o prendia, mas ele exercia força para escapar; debatia-se, machucava-se. O barulho que o giz fazia contra o quadro enquanto eu tentava adormecer era insuportável.

Pedi permissão e saí daquela sala. Troquei o ar abafado por um leve soprar da corrente que passava pelo corredor completamente inabitado. Caminhei lentamente até o banheiro, eu tinha a sensação de que algo pesava sobre mim, não culpa, mas olhares. Apoiei-me no requintado granito da pia e joguei água fria sobre meu rosto, molhando também as pontas do cabelo e a gola da camiseta.

Ergui meu rosto e encarei-me no espelho, encontrando o reflexo de Taehyung atrás de mim. Meu corpo todo gelou e um leve tranco foi dado pelo susto.

"Pelo amor de deus, Taehyung, você quer me matar?"

Fez que não com a cabeça. Patético. Era uma pergunta retórica.

Vi pelo espelho o maior aproximar-se e senti meu corpo sendo forçado a virar e encará-lo não mais através do espelho. Impulsionava o corpo contra o meu, prendendo-me entre si e a pedra úmida da extensa pia.

"Eu deixei que você pegasse Jeongguk pra você, porque eu quero a felicidade dele, eu confiei em toda a sua ambição de querer todo mundo só pra você, mas tinha que, no mínimo, fazer o que eu fazia." Ele sussurrava quase em tom normal.

"O que você...?"

"Você não soube o que aconteceu, não é? Porque você não estava lá. Eu acreditei que você podia cuidar dele, mas não sabe cuidar nem de si mesmo, quem dirá de outro." Ele agarrou-me a blusa e puxava até que eu sentisse o limite da elasticidade do tecido quase cortar-me a pele da nuca. "Você deixou isso acontecer, a culpa é sua!" Percebia que quase gritava, olhou para a porta assegurando-se de estarmos ainda sozinhos e despercebidos naquele local.

Seu humor mudava, isso assustava-me. Sua respiração era pesada. Fechei os olhos e esperei pela agressão que receberia, mas tudo que eu recebi foi o corpo diminuindo a pressão contra o meu. Ao abrir aqueles novamente eu o via com o rosto baixo e a expressão dolorida. Ele chorava.

"Do que você está falando?! Explica-me o que está acontecendo!" Sentia-me cada vez mais angustiado pelas palavras dele.

"Você não vai entender, Hoseok, não adianta de nada eu te contar dos problemas dele. Ele sofrerá da mesma maneira e você só o verá com os olhos da pena."

"Eu quero ajudá-lo, mas com ele me evitando sem eu saber os motivos acaba dificultando todas as vias. Eu preciso que você me conte." Retruquei.

"Se você quer ajudar-lhe, apenas saiba fazer."

Ele soltou-me no instante que o sinal para o intervalo soou. Antes de deixar completamente o local, ele anunciou: "Eu matei uma pessoa por ele. Uma pessoa ruim. Com minhas próprias mãos. Você acha que os seus beijos ou suas noites de núpcias são o suficiente por ele?"

Eu tentei fazê-lo parar de andar e explicar-me com detalhes da situação, mas era em vão. Eu não fazia ideia sobre o que ele tratava, a única coisa que ele deixou claro era que eu fui culpado do que acontecera. Eu sentia um aperto enorme no peito.

Eu corri até a classe onde Jeongguk estava. No caminho eu sentia as lágrimas escorrerem sem lástima alguma. Há muito tempo que eu deixei de me importar com os olhares sobre mim e as faces de preocupação fingida.

"Jeongguk!" Apoiei-me no batente da porta após dizer em tom alto, fazendo com que eu tivesse a atenção de todos ali dentro.

Ele encarou-me tentando não demostrar os olhos piedosos por assistir-me chorar. Veio em minha direção, olhou ao redor e caminhou para mais próximo dos armários, fazendo os olhares da classe não mais nos alcançar.

Não disse nada de início, apenas manteve o lábio inferior preso entre os dentes e secou-me o rosto com as mãos delicadas e seus dedos magros e compridos. Eu segurei-as e as mantive contra meu rosto, sentindo a pele macia. As dobras dos seus dedos estavam avermelhadas, havia marcas roxas por toda a sua pele que não estavam ali antes.

"O que aconteceu com você, Jeon? O que eles fizeram?!"

"Hoseok, eu quero esquecer isso, já é difícil demais todos os flashbacks, todos os hematomas e toda a dor. Nada nunca aconteceu, certo?" Finalmente ele pronunciava-se.

"Eu só quero o meu menino durão de volta, hm?"

"Eu não sou durão e não sou seu." Arrebatava as palavras com velocidade.

"... E você quer ser meu?"

"Não. Eu não quero mais nada de ninguém, eu não sou de ninguém eu não sou ninguém eu só quero morrer em paz."

"Você é alguém sim, você é tudo pra mim! Deixa-me cuidar de você, me deixa tomar a sua dor."

"Você não aguentaria isso por muito tempo, eu não desejo essa dor para ninguém, eu só..." O choro que se iniciava forçou uma pausa no que dizia. "... Eu também não aguento isso, não aguento mais."

Ele levou o punho de encontro à parede, batendo com força que fazia emitir um som alto. Sentia-se a dor apenas de ouvir o estrondo.

Minha única reação foi abraçá-lo com força contra mim. Deixei-o chorar com a cabeça contra a curvatura do meu pescoço, enquanto tentava suprir a dor de ouvi-lo tão desoladamente. Ele conseguia parecer, para mim, ainda extremamente crescido e resistente mesmo quando estava a chorar feito criança.


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