DEZESSETE: Clímax

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Sentia-me no clímax das emoções. Algo me pinicava a pele, me cutucava o ombro, me atormentava as ideias. Um mesclado muito forte das inúmeras sensações causadas por inúmeras pessoas. Tudo cada vez mais estranho.

Até a minha casa parecia conturbada, eu me sentia agarrado pelos lençóis da cama onde dormi por quinze anos. Sentia-me acompanhado por estranhos que, na verdade, eram apenas os meus pais. Colocava a cabeça para fora da janelinha do quarto, inalava bastante do ar enfermo da cidade, exalava a fumaça dos cigarros.

Estava longe do campo gravitacional da terra. Tudo que me prendia ali era aos poucos apagado.

Eu caminhava fraco do peso do próprio corpo em direção ao colégio. Eu via o movimento logo de manhã e os homens trabalhando às inchadas, retiravam do meio-fio tudo quanto era gramínea que nascia. Acabavam com todas as cores que restavam naquele asfalto, tiravam toda a vida.

Minha cabeça martelava de dor, era aos poucos esmagada pela pressão atmosférica e todos os milhões de pensamentos. Cada vez mais a ideia de deixar aquele lugar crescia. Eu sempre dizia estava cansado da monotonicidade da minha vida e agora cansado estava de tê-la conturbada a cada dia que passava.

Lentamente meu coração ganhava uma nova forma, uma evolução mais resistente. Tudo o que eu via, tudo o que eu sentia, aquilo me deixava cada vez menos assustado com o que o mundo tinha a mostrar. Era isso que eu pensava sentir: uma metamorfose.

Nunca ansiei tanto pelo fim de um dia quanto esse. Era não só o fim de outro dia, mas o fim de tudo. Eu passava as aulas com pressa, mas sem preocupação nenhuma. Eu gastava várias folhas de caderno por cada palavra errada que eu escrevia, eu recomeçava, eu não importava-me mais naquele ponto.

Eu dobrei a folha de papel recém-arrancada do caderno. Coloquei-a entre as coisas de Taehyung quando todos estavam dispersos ou fora da classe. Peguei minhas próprias coisas e andei o corredor pouco iluminado em direção às portas de vidro. Tinha os passos desajeitados, mas vagarosos. Encarava pela ultima vez aquela cidade tão cinza e ao mesmo tempo tão azul.

Os carros na rua eram barulhentos, não que aquilo tudo fizesse diferença. Na minha cabeça tudo o que eu conseguia era ouvir uma sinfonia melancólica de piano. Era tudo indiferente. Com exceção da música que acabava encorajadora.

Lá estava eu, de pé na barragem da ponte, minhas coisas no chão, os pássaros no céu, os carros na rua e o início do mar que dividia minha cidade de todo o resto debaixo do cimento. Maldita sinfonia que fizeram meus olhos escorrerem. Onde estava o coração impassível? Onde estava o frio da cidade a congelar as mágoas? Minhas pernas fraquejavam e bambeavam diante da altura onde me encontrava.

"Parece um déjá vu, não?" Ouvi uma voz bem próxima. Fez-me secar depressa as lágrimas e tentar entender o que se passava.

Era Namjoon na calçada logo atrás de mim e Yoongi, que falava sentado ao meu lado.

"A única diferença é que ele não merece ser salvo." Retrucou Namjoon.

"Eu tinha a idade dele, não é?" O de cabelo colorido questionava.

"A culpa é toda sua, Hoseok, você fez isso com eles." O mais velho continuava a cuspir-me palavras de mal.

"A culpa não era minha, também não é dele. Faça com que seja uma reconstituição fiel do passado." E o mais velho que eu a comparar-me com ele. Ambos pareciam conversar entre si, mas sem qualquer coerência.

"Jimin quase a morrer, Jeongguk violentado, Taehyung em crise existencial, Seokjin não amado. Você causou tudo isso com seu orgulho enorme."

"Você não tem coragem de fazer? Eu tinha." Yoongi inclinou o corpo para que pudesse encarar meu rosto baixo. "Você precisa de ajuda?"

Não conseguia aguentar ouvir todas aquelas coisas ao mesmo tempo, apenas forcei-me a fechar os olhos e no mesmo instante ele puxou-me pelo braço em direção ao mar. Porém, tudo o que eu sentia era o peso do meu próprio corpo empurrando-me para baixo. Abri novamente os olhos antes de cair para fora da ponte, não tinha ninguém ali além de mim. Apenas carros.

A água gelada bateu contra o meu corpo, flagelando-me. Eu afundava aos poucos, não fazia esforço para retornar à superfície. Eu inalava água e acelerava o processo. Minha visão ia se desvanecendo, assim como as forças para manter os olhos abertos. Então eles fecharam por vontade própria.



Não é um sonho. Você não pode acordar.

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