Sentia-me totalmente exultante. Mal consigo descrever como meu corpo parecia flutuar ante aquela serie de boas vitórias que vida havia me proporcionado enfim. Minha vendetta particular ronronava satisfeita e sossegava num canto confortável da minha alma. A noite havia sido a melhor da minha vida com aquela apresentação triunfal e a humilhação de meu ex, mas ainda não havia chegado ao seu ápice. Eu não sabia disso, obviamente, mas o momento de glória estava me aguardando na penumbra de meus aposentos, no silêncio que ronda o mundo depois da meia noite.
Não foi a porta aberta que denunciou que havia uma presença humana no meu quatro, mas um aroma leve que parecia estar suspenso no ar. Quando percebi que havia uma safada nota masculina almiscarada, uma onda elétrica percorreu minha espinha respondendo baixinho de quem era aquela presença.
- Demorei? - inquiri buscando a figura de Marcello com o olhar, que já se acostumara a penumbra do quarto.
- Achei que teria que buscá-la - a voz dele respondeu denunciando que seu dono estava encostado num canto do quarto.
- Garoto abusado... - resmunguei baixo com um meio sorriso. Desde aquele beijo, tinha a sensação de que parte da minha guarda havia sido abatida fatalmente e aquele menino havia penetrado nas minhas recém-construídas defesas.
- Apenas alguém querendo ajudá-la, mia bella...- respondeu com aquele ar levemente devasso. - Acredito que apenas minha presença durante toda a noite neste quarto irá salvá-la da perseguição daquele seu antigo homem..
- Ora, ora, e o que mais? - perguntei avançando um pouco mais pelo aposento sem, no entanto, me aproximar muito dele.
- Acho que você sabe... - ouvi-o se aproximando de onde estava e vi o brilho gatuno daqueles olhos cravando-se em mim.
- Talvez... - suspirei com certa indiferença. Na verdade, era uma indiferença fingida, pois a verdade era que havia algo, um pequeno espírito transgressor em mim que queria seguir aquela vereda junto com Marcello. Talvez Carmen havia se instalado em definitivo no meu corpo.
Ele já estava perto. Pude sentir sua respiração roçar a pele do meu rosto e o calor do corpo dele me atrair de forma fatal. Ainda não me tocava e nem eu a ele, mas podia sentir crescer uma tempestade, algo elétrico cujas as faíscas ainda tímidas, mas veladas de promessas. O primeiro relâmpago veio num beijo. Na verdade, não foi apenas um beijo, mas todo o processo que o envolve. O tato, a junção dos corpos, o olfato, o paladar, as respirações descontroladas, os toques. Tudo isso unido ao fato de que lá estava a mulher que fez sexo aborrecido por dez anos com o mesmo homem sendo apreciada por nada mais do que um homem em pele de rapaz. Acho que dei a definição correta para o que foi o primeiro movimento de Marcello: apreciação. Apesar de intensidade avassaladora do beijo, ele parecia me degustar, suas mãos me acariciavam de uma forma que era o equilíbrio entre a devoção que o corpo de uma mulher merece e a devassidão que um homem precisa.
Claro que esses pensamentos só me veem agora que minha mente não esta sendo bloqueada pela força da atração que me acometeu na época. Meus neurônios não conseguiam processar nada além de sensações, suspiros, arrepios, o toque e o fato de estar ali. Quando dei por mim, o tecido frio do vestido que usava jazia emaranhado nos meus pés e estava gloriosamente de lingerie. Lembro de soltar uma prece mental agradecendo por estarmos na penumbra que escondia os detalhes menos agradáveis do meu corpo. Besteiras femininas! Pequenas futilidades que nem mesmo a maturidade apaga.
Foi naquela noite que redescobri que, bem como minha voz, meu corpo, marcado pelas marcas do tempo e adormecido para as paixões depois do divórcio, podia ser apreciado por mãos habilidosas. Voltara sentir a pele formigar na cama. Por um tempo, tais sensações só foram sentidas no palco quando encarnava as mais variadas personagens. Ali, nos braços de Marcello, não havia encenações. Era a Fiorella, a mulher ardente que se havia perdido e renascia na penumbra daquele quarto.
As mãos de Marcello deslizaram pelas curvas formadas pelo meu quadril e minha cintura. Ele não falava, mas soltava pequenos grunhidos roucos de aprovação com as minhas proporções totalmente fora do padrão.
Não sei quando foi exatamente, mas em dado momento, me senti muito passiva naquele jogo e resolvi reagir. O alvo foi a camisa e confesso que fiz algo que desejava: rompi os botões com puxões vigorosos deixando o torso dele nu. Marcello riu e me olhou como se finalmente estivesse com a mulher que desejava. Alguém que correspondesse seus desejos.
Aos poucos, fui desnudando o corpo dele. Peça a peca, ganhava algum controle sobre a situação. Ia, lentamente, descobrindo com as mãos o que fazia com que ele murmurasse meu nome entre os dentes e desatar um sorriso devasso, misterioso e ameaçador. Sob minhas mãos, conduzia uma pequena sinfonia de sensações. Aquele corpo firme e quente era meu instrumento. Como era bom causar aquelas reações no garoto, levando-o a se perder um pouco.
Quando ele me arrastou de volta às torturas provocadas por suas mãos, seu toque me queimava e cada beijo acabava com o folego de quem sempre me gabei de ter bastante. Ao buscar meus seios, presos num sutiã capaz de disfarçara ação da gravidade, senti-me a beira de um abismo delicioso. E assim foi pelo resto do corpo. Aquele menino ia me arrastando a lugares desconhecidos, roubando meu autocontrole e devolvendo-me a capacidade de arder em desejo como uma italiana.
Marcello amou-me de forma tão intensa e despudorada que meus gemidos, segundo ele, eram agudos como havia ouvido nos momentos de êxtase das árias que cantara naquela noite. Era vigoroso e cavalheiro nas doses exatas e Deus sabe quantas vezes me arrastou para baixo naquele precipício antes de cair exausto na minha cama.
A cada orgasmo, e nem sabia que eles eram reais, eu sentia-me livre de Bill e do que ele fizera. Enfim, desejada como mulher e sem o compromisso e expectativa de um novo relacionamento. Naquele momento, senti-me no auge da minha feminilidade. Não por estar na cama com um garoto italiano. Estava ali por prazer, apesar da minha relutância inicial. O meu prazer, um prazer devasso, sedento e delicioso.
- Fazer amor te faz bem, Fiorella - sussurrou-me o rapaz perscrutando meu rosto com o olhar. O sol lançava seus primeiros raios e o quatro ia recebendo alguma luz. O suficiente para um estudo matinal pós-coito. Ele estava deitado sustentando a cabeça com a mão parecendo de fato tão jovem com os cabelos desgrenhados. - Faz é? - lancei mão de um sorriso irônico e tipicamente inglês enquanto arranjava-me entre os lençóis e o corpo de Marcello, que brindou-me com um delicioso sorriso irônico como resposta silenciosa antes de virar meu travesseiro pelo resto daquela manhã.
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Primma Donna
ChickLitAos 45 anos, Fiorella Castromanni acumulou num curto período de tempo um número grande de perdas. Perdera o marido; o emprego como cantora lírica no Royal Ópera House; a voz e, a maior crueldade do destino, foi a perda da avó, a grande diva da ópe...