Ainda resta dúvidas?

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Pouco mais de três anos antes do prólogo...

Eusébio - Ceará - Chácara da família Vicente.

Estava um dia ameno, o calor característico da terra cearense parecia tirar férias naquelas semanas ou talvez fosse apenas o sentimento de leveza e felicidade dos pais de primeira viagem que estava deixando os dias agradáveis.

Júlio estava deitado em uma das redes da varanda da chácara olhando o tempo passar com a pequena Tiê nos braços. Ana olhava escondida através da janela da primeira sala o pai e sua filha interagindo: Cocielo contava animado alguma história para a passarinho que apenas dormia brandamente. Eles finalmente tinham se entendido, Ana só agradecia por isso. Tiê, nos primeiros dias de vida, fazia um enorme escândalo quando saía dos braços da mãe para os braços do pai.

- Não ligue, meu filho. - Seu Nelson deu tapinhas nas costas do pai de sua neta - Quando a Aninha nasceu ela também nem quis olhar na minha cara - Suspirou - Essas mulheres que não aguentam a nossa beleza.. Vou te dizer, viu. - Riu.

Júlio apenas decidiu esperar e se acalmar, Tiê ainda era muito novinha, claro que ia estranhar todos aqueles que não eram sua mãe. Ana uma semana depois de seu casamento com Ian voltou para o Brasil. Ela queria que sua filha tivesse as suas mesmas raízes, ela queria que a pequena Tiê fosse cearense cabeça chata igual a ela. Claro que isso deixou sua família e amigos eufóricos, Cocielo então nem se fala, ele temia que não pudesse acompanhar o nascimento de sua filha. Apesar de a ficha de que ia ser pai não ter caído completamente, Júlio sentia que era importante ele estar com Ana naquele momento, ele sentia necessidade de ser o primeiro a segurar sua filha nos braços, de ver o rostinho dela minutos depois de vir ao mundo.

Então assim se fez, Tiê nasceu saudável e amada pelos pais e família. No momento que foi liberada da maternidade ela foi levada junto com a mãe para a chácara da família, todos falavam que lá era o melhor lugar para que a bebê passasse suas primeiras semanas. Cocielo havia cancelado todos os seus compromissos dos próximos dois meses para poder ficar no Ceará com Ana e Tiê já que Ian afirmava que não tinha interesse de vir ao Brasil nesses meses - o americano achava melhor deixar que o Cocielo ficasse confortável com a filha no início, já que seriam poucas as vezes que o paulista teria a oportunidade de vê-la pois Ana voltariam para Nova Iorque o quanto antes.

POV's Júlio

Ela parecia um pedacinho de carne pequeno e vermelho nos meus braços. Como que eu tinha feito alguém tão perfeita e branda quanto a passarinho? Isso era possível? Eu um cara porra louca, sem juízo e escrúpulo algum tinha posto no mundo uma pessoinha angelical que já amava mais que a minha vida toda.

- Não se preocupe, passarinho, seu pai vai criar vergonha na cara e lhe dar orgulho em algum momento da vida. - Trouxe ela para mais perto e depositei um terno beijo entre seus olhos.

Nesse momento Ana sentou em uma das cadeiras que estava ao lado da rede.

- Parece que vocês se entenderam - Ela sorriu.

- É, eu prometi uns trocados pra ela se ela parasse de chorar quando eu chegasse perto - Ri.

- Era só questão de costume, Júlio... A Tiê é meio temperamental. - Ana explicou.

- É, ela é a sua cópia mesmo - Suspirei. - Sabe o que eu estava pensando?

- Não, o que? - Ana falou ajeitando a touca lilás que protegia a cabeça careca da passarinho.

- Que não vai ter problema nenhuma para a Tiê se passar de filha do Ian... - sentia um enorme peso nos ombros.

- Que história é essa, Júlio? - Ana se mostrou um pouco mais irritada do que eu esperava. Ela alisava a aliança que tinha no dedo, talvez pensasse em como se sair daquela minha afirmação.

- A passarinho nasceu com os seus olhos azuis e com a sua pele branquinha, e isso é bom, se ela tivesse puxado a mim ia ser tão feinha... - Resolvi rir para tentar dissipar a tensão que havia se formado ali.

- Você falando assim parece que não criou amor nenhum pela nossa filha. - Ela bufou.

- Não seja estúpida, Ana - Depois de tudo ela ainda se sentia no dever de apontar o dedo pra mim e me julgar - Eu estou exatamente lamentando o fato de a minha filha ir embora e o seu marido poder andar com ela de um lado ao outro naturalmente que todos os gringos acharão que a minha filha é filha dele.

- Não comece, Cocielo. - Começou a andar nervosamente pela varanda - Você sabe muito bem que a minha vida é em Nova Iorque, eu simplesmente não posso abandonar tudo lá para voltar para o Brasil... - Suspirou - E outra, eu sou uma mulher casada agora.

- Uma mulher casada que é mãe da minha filha - Eu estava ficando com a cabeça perturbada, há dias que não brigávamos, talvez fosse o fato de logo logo Ana ter que voltar para a gringa que estava me deixando tenso - Não precisa me lembrar que você é uma senhora casada pois quem te levou ao altar fui eu.

- Ótimo. Então não venha me encher o saco com isso, Júlio. - Ela sentou na cadeira mais perto e virou o rosto - Isso tudo foi uma escolha sua...

- Minha? Do que você está falando?

- Nada. Esqueça. - apertou os punhos, parecia furiosa.

- Não venha me dizer que se eu tivesse insistido você teria desistido do casamento com o gringo para ficar comigo? - meu coração estava prestes a explodir.

Nesse momento Dona Margarida, mãe de Ana, apareceu rapidamente de dentro da casa e veio em minha direção.

- Olha vocês vão brigar na puta que pariu porque na frente da minha neta não - Ela ralhou e tomou cuidadosamente Tiê dos meus braços.

Esperei que Dona Margarida entrasse com Tiê na casa, me levantei da rede e fui até Ana.

- Olhe na minha cara e diga que se eu tivesse insistido você teria deixado o gringo e voltado comigo para o Brasil. - puxei pelo braço de Ana e fiz com que ela me encarasse.

- Claro que não.

Ana apenas disse e se desvencilhou de mim.

- É melhor ir se despedindo da Tiê pois o nosso voo de volta para Nova Iorque é na próxima semana.

Antes que eu pudesse responder essa provocação da cearense um carro estacionou em frente a varanda, eram os amigos de Ana.

- Cadê a minha pequena Beyoncé? - Luba gritou quando desceu do carro carregando várias sacolas.

- Meu Deus, nunca tive tanta saudade de um pedacinho de joelho como eu  tive da minha afilhada. - Pathy passou direto para dentro da casa.

- Gente, onde tem uma coca-cola? eu to pra morrer de calor - Cellbit me deu um rápido aceno de cabeça e um beijo na bochecha de Ana.

- OiOiOi - Luci sorriu para nós dois e, sentindo o clima tenso entre mim e Ana, puxou Luba e Rafael na mesma direção que Patrícia fez.

O irmão mais velho de Ana, esse que tinha ido buscar os amigos dela no aeroporto, ficou algum tempo me encarando - ele nunca tinha ido com a minha cara mesmo.

- Está tudo bem aqui, Aninha? - Perguntou.

- Sim, Daniel.

Com essa afirmativa da irmã ele nos deixou sozinhos.

- Me desculpe, Júlio, eu... - Ela tentou.

- Não, tudo bem. - Suspirei. - Eu entendi que a Senhora Hecox irá levar a minha filha de volta para a gringa... e a única coisa que eu posso fazer é  aceitar.

Desci as escadas da varanda e fui na direção do lago de patos que tinha lá perto, eu precisava espairecer

MonoMania - Júlio CocieloOnde histórias criam vida. Descubra agora