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Meio dia

Assim que Rick me soltou, terminei de estender o vestido e o acompanhei até o quarto que Joe havia cedido para dormirmos.

- Mas só tem uma cama de casal... - Sussurrei.

- Então, eu queria conversar com você sobre isso.

Lancei um olhar confuso para Rick, em resposta ele continuou o discurso.

- Enquanto você estava no banho conversei com Joe. Disse a ele que nós...

- Nós?

- Namoramos.

Incrédula, foi como eu fiquei ao ouvir tal coisa.

- Mas nós não namoramos!

- Karen, não é hora de se importar com isso. A casa tem apenas dois quartos: o de hóspedes com uma cama de casal e o quarto do Joe. Ele mesmo já disse: "Vocês são um casal? Não tenho nada mais do que isso". Entenda que não temos a mordomia de escolher onde dormir. Você prefere a sua cabana de galhos?

As coisas começaram a fazer sentido, por isso que Richard havia me pedido para abraça-lo.

- Eu sei. Mas é que...

- Karen, eu não sei você mas eu tô muito afim de sair dessa ilha. Eu faria qualquer coisa.

- Eu também!

- Então acho melhor dançarmos conforme a música.

- Não tem um plano melhor do que isso?

- Por enquanto não. Agora vamos arrumar esse quarto que parece que não vê a luz do dia há séculos!

+++

Pó. Isso poderia definir o quarto por completo. Rick tinha razão, aquele cômodo não via a luz do sol há séculos. Havia teias de aranha abandonadas e uma quantidade de traças fora do normal. Entretanto, conseguimos arrumar e limpar tudo.

- Almoço.

Joe disse num tom elevado. Encontramos com ele na cozinha, Rick disse que havíamos terminado de arrumar o quarto, em resposta o homem apenas acenou com a cabeça. Nos assentamos e comemos em silêncio.

A quietude me incomodava, procurei por alguma distração e a encontrei nos talheres. A faca de pequenas cerras era afiada e cortava facilmente os legumes e pedaços de carne. Não demorou muito para todos terminarem de comer e eu, já com um plano em mente, prontificar-me a lavar a louça.

- Gostei disso. - Joe sorriu de modo cínico.

Recolhi da messa, os pratos e talheres sujos. Joe me indicou onde ficavam bucha, sabão, guardanapos e o lugar que cada louça deveria ser guardada. Como esperado, eu fui a única a ficar na cozinha. Assim que terminei de lavar e enxaguar, peguei um pano de prato para secar tudo. Guardei os pratos e panelas, por último os talheres, prestando muita atenção nas facas. Uma foi parar entre o elástico frouxo da calça de moleton e o meu quadril, o restante foi gentilmente guardado em suas respectivas gavetas. O que eu pretendia fazer com aquela faca? Não tinha ideia, tudo o que eu sabia é que precisava de algo para me defender.

Fui ao banheiro para me certificar que a pequena faca estava escondida. A Karen de antes nunca faria algo do gênero. Mas as circunstâncias são outras, e assim como Rick disse, temos que dançar conforme a música.

+++

Do lado de fora da casa, Richard conversava com Joe sobre o nosso resgate e se era possível estabelecer contato com alguém de fora da ilha.

- Aqui pega sinal de rádio muito bem, mas televisão é bem ruim - o homem mudou a postura assim que me aproximei.

- E telefone? Celular?

- Raramente.

- É por que precisamos voltar, né? Antes que abandonem as buscas. Já se faz três dias.

- Precisamos voltar pra nossa família - completei.

- Esperem, tudo bem? Aguardem e fiquem despreocupados. Eu tenho que trabalhar...

Joe se levantou foi para dentro da casa. Rick e eu trocamos olhares que apesar de silenciosos, diziam muito. Olhares questinadores e esperançosos. Quando o homem já estava distante o suficiente, me aproximei de Rick e perguntei em um tom cauteloso:

- Você acredita nele?

- Não muito. Mas, é nossa única esperança.

- Tem um plano B?

- Não.

Esvaziei os meus pulmões.

- Estou tentando bolar um, - disse - não é muito bom e por enquanto tem grandes chances de dar errado.

Richard tocou em meu pulso.

Segundos depois Joe apareceu vestido botas de plástico e segurando um balde com coisas dentro.

- Uma parte do acordo é: ninguém entra nas estufas. Ninguém. Nem tentem bancar os engraçadinhos por que se fizerem isso, vão apodrecer nessa ilha.

+++

Não havia o que fazer na casa, por isso decidi voltar a praia, crente que a guarda-costeira poderia passar por ali. Durante o trajeto, várias dúvidas surgiam em minha mente, posso dizer que todas elas eram relacionadas a Joe. Como ele veio parar aqui? Ele deve ter um barco, certo? Estamos a quantos quilômetros da costa? Como ele consegue comida, roupas, produtos de higiene e limpeza? Há quanto tempo ele vive aqui?

Eu não tinha resposta para nenhuma delas e aparentemente, estava longe de descobrir. Richard é muito bom em obter segredo dos outros, mas Joe caiu em nenhum dos truques que Rick havia criado, parecia que o homem de meia idade já lidava com esse tipo de coisa. Parei. Ele já lidava com esse tipo de coisa. Se Joe vive numa ilha, isolado e longe das pessoas, logicamente ele deveria ser ingênuo e uma presa muito fácil para as artimanhas de Richard, entretanto o que acontece é o contrário.

Joe não é inocente, ele se esquiva e mantêm-se firme diante das investidas de Rick. Pensei em tudo isso enquanto voltava à praia, o fato de estar perdida em pensamentos fez com que eu não percebesse o quanto havia andando. Eu estava apenas seguindo uma trilha que serpenteava entre as árvores.

- Agora vamos tentar achar o acampamento.

Peguei um galho e fui até metade da praia, onde cavei um pequeno buraco e enterrei o tronco, deixando os ramos bem visíveis, assim seria fácil encontrar a trilha de volta. Agora que já tinha feito isso, eu precisava descobrir exatamente por onde é como começar.

Perdida Na IlhaOnde histórias criam vida. Descubra agora