20° - Talvez não dê certo

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Pérola abriu os olhos e fitou o teto do seu quarto, sentia os olhos estranhamente cansados, pesando como chumbo, como se sequer houvesse dormido. Se espreguiçou e então as lembranças do acontecimento vieram a mente, como um soco inesperado e doloroso. Sentiu um aperto no peito e junto disso veio toda a culpa; ela havia sido uma pessoa horrível, havia machucado Patrick, tanto por fora quanto por dentro e agora ele devia estar mal por sua culpa.

Ele era um bom garoto, ciumentos mas uma pessoa legal. Ela o amaria, se pudesse, amaria com todas a suas forças se seu coração não fosse tão rabugento ao escolher as pessoas para amar. Pérola odiava machucar as pessoas e inconsequentemente fazia isso muitas vezes.

Passou a mão no rosto, tentando afastar o resto de sono que ainda sentia. O que tinha de errado consigo? Por que ela era essa mistura louca de destruição e bizarisse? Suspirou e resolveu manter a mente ocupada em alguma coisa, a fim de fugir de tais sentimentos. Resolveu fitar um dos seus posters dos Beatles, talvez ajudasse...

"A vida é aquilo que acontece enquanto você está fazendo outros planos."

Por algum motivo essa frase veio a sua mente, junto com a imagem de John Lennon. Talvez ela devesse ir atrás de Patrick e explicar tudo, pedir desculpas e talvez tudo ficasse bem de novo!! Talvez John Lennon houvesse salvado seu dia, indiretamente. Sentiu uma euforia invadir o peito, deu um pulo da cama e estava prestes a ir se arrumar quando novos pensamentos vieram a mente: Mas o que ela iria explicar? Não havia muito o que... Como ela pediria desculpas mesmo depois de ter machucado a mão dele defendendo alguém que mal conhecia? Ele estava errado?! Estava mas ela também tinha uma certa culpa.

Suspirou e se jogou em um dos pufs ao lado da janela, enquanto apoiava as cotovelos no colo e o queixo nas próprias mãos. Sua barriga roncou,  estava faminta sequer havia almoçado mas antes iria escovar os dentes e tomar um banho.

[ • • • ]

17:00

A casa estava em um silêncio absurdo, sem nenhum som aparente exceto pelo barulho da TV ligada, Pérola olhou para o sofá e como não viu ninguém, desligou o aparelho a fim de acabar com o barulho que o mesmo fazia. Passeou os dedos pelos fios bagunçados e andou em direção a cozinha, ainda se sentia sonolenta mesmo após o banho frio. Sem prestar muita atenção no que havia a sua frente esbarrou em Connor que estava sentado no balcão, acabando por cair de bunda no chão gelado da cozinha. Connor acabou rindo da sua expressão brava, saindo do balcão e estendendo a mão para ajudá-lo a levantar porém Pérola acabou por levantar sozinha.

- Dormiu bem?

- É... -  Deu de ombro e foi em direção a geladeira, examinou o interior do eletrodoméstico e por fim, pegou um pote de sorvete. - Já me sinto melhor. - Mentiu mas não forçou um sorriso.

- Hm, sei ... - Connor concordou,
ironicamente. - Sua cara mostra bem isso.

- O que tem de errado com minha cara? - Bufou, vendo o próprio reflexo através da colher que havia pegado.

- Com a sua cara? Nada. Mas os seus olhos estão tristes, tipo, muito!!

Pérola revirou os olhos e lhe atirou uma colher, esta que foi pega no ar antes que atingisse o chão. Pegou outro talher na gaveta e puxou um banco para sentar ao lado dele, abrindo o pote e depois de apoiar os cotovelos sobre o balcão, indagando:

- Ora, eu machuquei alguém, como quer que eu me sinta?

- Não foi culpa sua.

- Não, claro que não, nem era a minha mão que estava segurando a dele!!

- Ei, não desconta sua raiva em mim!! - Resmungou, Pérola suspirou, enfiando uma colher cheia de sorvete na boca.

- Desculpe. Onde está o meu irmão?

- Não sei direito, ele não explicou muito, era algo como tirar um porco espilho da garagem do pai dele ou coisa do tipo...

- Oh. - Concordou com a cabeça. - Sabe, as vezes a vida é uma droga.

- Eu sei, odeio porcos espinhos, eles furam nossas mãos.

Pérola riu do comentário idiota e lhe deu uma leve cotovelada na barriga, o vendo levar uma porção de sorvete a boca e a encarar, como se estivesse esperando que falasse algo mas estranhamente, ele quem falou.

- ... Acho que a vida é como um filme. - Sussurrou em um tom quase inaudível, batucando com a colher sobre o superfície plana do balcão.

- Por que?

- A maior das partes são tristes mas quando a parte feliz finalmente chega o filme acaba.

- A menos que veja um filme de comédia...

- O que quer dizer com isso?

- A vida é aturavel quando você deixa de levar certas coisas a sério.

Connor sorriu e ficou fitando o pote de sorvete por um tempo, até parar os olhos em Pérola. Seus cabelos estavam bagunçados, os fios completamente desgrenhados, deixando transparecer que havia acabado de acordar. Usava um pijama lilás, com dois foguetes desenhados, não usava sombra preta, como de costume, nem lápis, seu rosto estava completamente natural, o que não a deixava menos bonita. Connor sorriu involuntariamente, não conseguindo desviar o olhar.

- Que foi? - Indagou, desconfiada.

- Nada. Você fica bonita usando esse pijama. Bem bonita mesmo.

- Que audácia, vir na minha casa me cantar!! - Resmungou rindo, o socando levemente no ombro.

- Foi só um elogio. - Ergueu as mãos em defensiva, enrugando o nariz.

- Vou ver o que tem de legal na TV.

Pérola desceu do banco e se até dirigiu a sala, sentando em um dos sofás. Não se viu na obrigação de convidar Connor, já que não o via como o tipo de visita que você obrigatoriamente chama para fazer tudo para que a pessoa não se sinta desconfortável afinal o garoto a havia visto chorar e isso era o nível mais alto de intimidade que julgava que poderia ter com alguém. Após guardar o sorvete Connor seguiu para sala, sentando - se ao seu lado e casualmente apoiando a cabeça em seu ombro, passando a ver qualquer que fosse a reportagem que estava passando na tela.

[ • • • ]

Pérola arregalou os olhos assustada, examinando o ambiente ao redor até se dar conta de que havia dormido no sofá, observou Connor dormindo ao seu lado enquanto babava no sofá, o que lhe arrancou um riso alto, o fazendo acordar atordoado.

- Que foi? - Indagou confuso enquanto coçava os olhos.

- Você baba quando dorme. - Respondeu, ainda rindo.

- Não babo não!!

- Baba sim!!

- Não babo nada !!

- Assume, seu babão. - Levantou e foi em direção a cozinha, Connor agarrou uma almofada e arremessou em direção a sua cabeça, a acertando em cheio. Pérola se abaixou e recolheu a almofada, a jogando de volta.

- Olha quem fala, você me chutou umas duas vezes.

- Azar o seu, babão.

Pérola mostrou a língua em sua direção e se virou, indo em direção ao quarto, era melhor escovar os dentes e arrumar o cabelo primeiro antes de fazer o café da manhã.

GUARDIÃ DO OLIMPO [01]Onde histórias criam vida. Descubra agora