Capítulo 11 - Doug: Sob as estrelas

4.2K 435 40
                                    

Eu estava caminhando devagar pela rua, a lua estava no céu, ainda haviam algumas nuvens enquanto as estrelas já brilhavam. As pessoas iam e vinham conversando animadamente ou apenas compartilhando momentos. Eu poderia sentir inveja deles.

Uma vida normal. Há quanto tempo eu não tinha isso? Depois da escola e emprego e um casamento não tem como as coisas ficarem normais, sorrio e abaixo a cabeça. Meu aniversário de vinte e três anos se aproxima, é incrível que já faça tanto tempo assim.

Ao contrário de alguns amigos eu era o mais promissor, mas acabei me tornando de certa forma o mais fracassado. Sai do médio em direção praticamente a escravatura e ao casamento. Meu celular começa a vibrar, o puxo do bolso e olho para a tela onde estava a foto de Noac e eu em seu último aniversário, ele estava feliz.

Abri a mensagem que eu havia recebido, a li atentamente e suspirei. Apesar de Caio e Aline serem amigos e os que mais tiveram contato – principalmente Aline – eles não pareciam conhecer Noac como eu conhecia. Deve ser os anos de casamento, ri comigo mesmo.

Sempre havia um lugar quando ele se sentia enganado, ou mesmo triste e vazio, ele sempre ia até lá. Era o primeiro lugar que ele ia, além de mais dois que apenas eu conhecia. Dei meia volta e fui em direção ao meu carro. Se ele foi da casa da Aline e vendo a distância de onde eu estou agora, ele deve estar chegando nesse momento e como "eles" só me avisam depois de meia hora que fazem a merda, nessa ocasião – como sempre – eu deveria traze-lo de volta. Meus dedos passaram rapidamente sob o teclado e em seguida posicionei o telefone em meu ouvido, ele chamou algumas vezes.

- Achou ele? – a voz de Aline era urgente.

- Não. Mas tenho uma ideia de onde ele esteja. O que vocês fizeram?

- Nada.

- Como nada? Algo ocorreu para que ele fugisse de vocês.

- Bem ele...

- Fala logo de uma vez Aline, não quero ser pego de surpresa.

- Lucas. Ele queria saber quem era o pai dele. Ele ficou inerte, tipo quando ele tem uma lembrança de alguma coisa, e logo depois ele saiu correndo.

- Vocês falaram quem era o pai dele?

- Não. Não chegamos a falar sobre isso.

- Ok. Quando eu encontra-lo eu aviso vocês.

Entrei no carro e segui, pela avenida principal da cidade até chegar em uma rotatória, peguei a entrada a direita e segui por uma estrada cheia de curvas e na primeira clivagem peguei a esquerda em uma estrada de terra. O vento frio adentrava o carro enquanto a pouca luminosidade clareava vagamente minha visão ao longe.

Os faróis do carro rompiam a escuridão quando finalmente chego, vejo o carro elétrico dado pelos seus pais de cor avermelhada estacionado. Desço do meu e sigo até a velha cabana da família dos meus pais, eu nunca havia levado ninguém ali, há não ser ele, depois de nosso casamento.

- Ai esta você... – disse ao vê-lo sentado na beira do lago. – Já faz algumas horas que eu procuro você.

- Desculpe. Acho que não vi o tempo passar. – disse ele dando um breve sorriso. – Eu sempre dando trabalho.

- Você não da nenhum trabalho. – disse me sentando ao seu lado.

- Você tem certeza disso?

- Claro que tenho. – disse confiante.

- Não me referi a isso, falo de tudo isso. Vocês acham mesmo que eu não desconfiaria disso?

- Mas do que você esta falando? – o olhei curioso.

- Vocês esquecem que sem uma ancora, uma embarcação continuar a navegar e fica a deriva, mas isso não significa que ela esteja perdida.

Naquela época Noac ainda conseguia manter uma "lucidez" quanto a tudo o que ocorria em sua vida, mas já dava sinais que suas memorias começavam a desaparecer, ele chegou a me dá um soco quando acordou do meu lado.

- Aaaaah – a voz de Noac ecoava em meus ouvidos.

Em uma fração de segundo eu me levantei da cama e peguei o bastão que ficava abaixo da cama, meus olhos percorreram rapidamente o quarto todo até pararem nele que estava parado do outro lado da cama.

- O que houve?

- O que você faz aqui? Deitado comigo? O que você fez?

- Eu não fiz nada.

Então senti seu pulso chocar-se com o meu rosto. O bastão caiu no chão, e minhas mãos foram de encontro ao meu rosto.

- Puta que pariu Noac, não precisava me acertar. Somos casados lembra? Meu Deus. Que força você tem hem? Nem parece... Ai...

Não aconteceu de uma hora para outra, mas sua mente começava a bloquear aquele dia, o problema disso é que as outras coisas começaram a ser bloqueadas.

Noac estava sentado na ponta da pequena ponte de madeira que ficava sob o lago assim como todas as outras vezes, segui em sua direção e me sentei ao seu lado. Ele não me olhou, meu braço se enroscou em seu ombro e o puxei para meu colo. Ele não falou nada.

- Sempre sei onde encontra-lo. – disse esboçando um leve sorriso.

- Acho que preciso achar um novo lugar. – disse ele olhando para o reflexo da lua na agua.

- Espero que não. Pelo menos assim sei que está bem.

- Eu só queira ficar sozinho e pensar.

- Sobre?

- Tudo. São tantas coisas acontecendo aqui dentro – apontou para a sua cabeça – e tão poucas respostas.

- Eu sei disso. Você sempre deixa Aline e Caio preocupados.

- E você não?

- Eu sei que pode até ser um pouco confuso, mas sei que meu garoto vai sempre estar bem, um pouco perdido, talvez, mas eu sei que estará bem.

Ele sorriu.

- Gosto quando você sorri assim... – digo segurando seu rosto.

Meus olhos se prendem nos dele, sua respiração se acelera – como todas as outras vezes em que isso aconteceu – meus lábios tocam os dele, sua boca se abre institivamente enquanto minha língua pede passagem se entrelaçando com o dele. Seus braços se prendem ao meu pescoço e puxo o seu corpo para mais perto do meu. Me afasto devagar, terminando o beijo com alguns selinhos até que ele me olha com aqueles olhos brilhantes e um sorriso no rosto.

- Sempre quis saber o porquê de você sempre vir aqui, quando se sente triste.

- Não sei explicar, eu apenas sei para onde eu devo ir. Esse lugar me tranquiliza de alguma maneira.

- Eu sei bem disso. – suspirei.

- Onde estamos?

- Humm, esta é a cabana de inverno dos meus bisavôs. Herdei dos meus avós. Passamos alguns dias aqui há um tempo atrás. – disse a ele que me olhava.

Ele apenas assentiu e se encontrou novamente em meu ombro. De todas as outras vezes em que isso aconteceu eu jamais tinha beijado Noac, nem mesmo em nosso casamento. Esse havia sido o primeiro em anos, e eu havia gostado.

Ľpnr

Surreal | Romance BLOnde histórias criam vida. Descubra agora