Capítulo 13 - Marcas do Passado.

3.6K 402 36
                                    

Meu corpo se esticou na cama, meu corpo se virou e meus braços foram de encontro a cama, com os olhos fechados sussurrei pelo nome de Doug, mas não houve resposta. Abri meus olhos devagar e o relógio marcava meia noite meia em números vermelhos, só fazia uma hora e meia desde que me deitei.

Meus olhos seguem até a porta do banheiro, Doug costumava acordar a noite para ir ao banheiro, mas a luz estava apagada. Espreguiço-me e sento-me na cama, olho para o quarto quase escuro a não ser pelo relógio e o pequeno abajur que ficava do lado de Doug em cima do criado mudo. Levantei-me e procuro pelas minhas chinelas com a sola dos meus pés, mas sem sucesso.

Então me direciona a porta sem elas. Sigo pelo pequeno corredor, até chegar as escadas, a cozinha estava iluminada, ouvi vozes enquanto descia as escadas. Ao me aproximar da entrada da mesma, percebo que Caio e Aline estão ali com Doug. Por alguma razão decido ficar parado do outro lado da parede que separava a sala da cozinha, eu queria saber o que eles conversavam enquanto eu dormia.

- Quer um copo? – perguntava Aline.

- Você virou uma alcoólatra quando? – perguntou Caio.

- Depois que descobrimos a doença de Noac eu comecei a beber um pouco para esquecer, mas pouco depois do primeiro surto de lembranças do Noac, minha válvula de escape é isso... – disse ela balançando o copo de bebida.

Surto? – pensei. – Do que eles estão falando?

- Deixe-a Caio, acabamos criando nossos vícios nesse meio tempo, quanto tempo já se passou? Um ano?

- Dois, para ser exata. – disse Aline, logo depois de beber um gole de uma vodka. – E desde então todos os dias lhe contamos uma mentira e ele dorme acreditando que é uma verdade e assim que fecha os olhos ele as esquece.

- Com uma exceção. Se ele acordar pouco tempo depois que dorme, a mente dele não aperta o delete. Havia esquecido de comentar isso com vocês.

- Isso é um avanço não é? – disse Aline animada.

- Eu já sabia disso, pode acontecer, mas não muda o quadro dele. Seria um avanço se ele mantiver a lembrança de um dia para outro, mas ainda assim ele teria lapsos de memorias. – disse Caio suspirando. – Noac não vai acordar? – perguntou preocupado.

- Não. – disse Doug indiferente – Ele sempre acorda quando vou ao banheiro, fui e ele não se moveu de onde estava, estava muito cansado, então só amanhã de manhã. Ele nunca descobriu que dormiu sozinho nesse tempo que estamos juntos.

- Isso é serio? – disse Aline surpresa.

- Claro. – disse ele pegando o copo da mesa e o enchendo de vodca. – Não preciso dormir com ele. Não concorda Caio?

Caio dá um pequeno meneio de cabeça.

- E se ele acordar e não te vê lá e sair procurando pela casa? – fala Aline um pouco irritada pegando o copo de sua mão.

- Eu invento algo. Ele me ama, sempre aceita que somos casados quando acorda sem as memorias de manhã. Não há nada o que temer.

- Não há o que temer? Você é louco? Caio por favor...

- Deixe ele Aline... – disse ele ainda sem expressão.

- Faça-me o favor Caio. Não vai dizer que apoia ele só porque tem ciúmes? Estamos nisso a quanto tempo? Há quanto tempo mentimos para Noac? Nem mesmo eu que teria todas as razões para desaprovar isso estou fazendo.

- Isso é esquisito – diz ele em meio a um pequeno sorriso – Não foram vocês dois que transaram como loucos e tiveram um filho?

Silencio.

- O que me lembra... – continuou Caio – Vocês estão se arriscando com Doug indo lá sempre Aline.

- Ele é o pai do Lucas. Meu filho tem direito de ver o pai dele. – disse ela irritada em um tom mais alto.

- Aline... – os dois recrutaram olhando para a entrada da cozinha.

- O quarto é forrado e deixei a porta fechada, acho que pelo menos isso deve evitar que ele ouça algo. Mesmo que minha esposa grite para os quatro cantos do mundo que temos um filho. – disse ele se aproximando de Aline e dando-lhe um beijo.

- Os dois já podem parar com isso. – disse Caio se levantando da mesa e indo ate a janela.

- Desculpe Caio... – disse Aline quase inaudível.

- Caio sei que concordei com isso, porque Aline me pediu que eu o fizesse. Mas não posso mais fingir para ele, que gosto dele, quero dizer que o amo. Sinto falta de estar nos braços de Aline e do meu filho. Por favor precisamos acabar com isso logo.

- Porque não acabam? – apareço em pé na frente deles.

Seus olhos se arregalam, minha mão abre a gaveta do balcão e pego uma faca que estava lá. Caio se aproximava de mim cautelosamente.

- Eu sou um fardo não é? – as lagrimas que já se acumulavam em meus olhos começavam a cair. - Como vocês puderam fazer isso comigo?

- Noac por favor se acalma – Caio pedia.

- Não! Vocês mentiram para mim esse tempo todo!

- Solta essa faca Noac – pedia Aline.

- Eu confiei em vocês, como puderam fazer isso comigo? Como puderam me magoar desse jeito?

- Era o único jeito – Caio começava a chorar.

- Não era o único jeito, você... – apontei para ele – Você não pensou em mim em nenhum momento. Como eu pude...

- Eu posso aceitar que você me odeie pelo resto da vida, mas não faça nada que nos tire você.

- Não! Você sempre pensou apenas em você, foi exatamente isso o que você fez, me colocou em um mundo que não existe, me trancafiou com um animal em exibição – então desferi uma facada contra si mesmo.

O sangue escoria pelo meu braço e caia no chão em pingos grossos enquanto eu repetia o mesmo movimento em todo o meu braço.

- Noac! Para com isso, não faz isso meu amor! – ele suplicava.

- Amor? – eu ria de uma maneira esquisita enquanto meus joelhos começavam a ficar bambos. – Quem você acha que é?

- Olhe para a sua mão esquerda, para o anel. – disse ele se aproximando. – Olhe agora para a minha mão. – ele me mostrou o anel – Está vendo.

Olhei incrédulo para os anéis que faziam um par. As informações passaram rápido de mais em minha mente.

- Eu te odeio! – gritei.

Levantei a faca e mais uma vez ela foi em direção ao meu pulso, e antes que eu desferisse mais um golpe contra mim mesmo, alguém por trás me segurou e me imobilizou. Eu me debatia com tudo o que podia enquanto Aline e Caio me seguravam. Meu corpo pesou e fui de encontro ao chão.

- Ele perdeu muito sangue, precisamos levar ele para... – dizia Doug.

As vozes deles foram desaparecendo até que houve apenas um zumbido, senti meu corpo sendo erguido e então tudo se apagou.

Meus olhos se abriram devagar, meu corpo estava mole, mas eu podia ver Caio sentado do meu lado, minha visão era limitada pelos meus cílios. Não tinha forças para abrir meus olhos mais do que já estavam.

- Volta, por favor... – ele suplicava entre o choro. – Porque meu Deus. Porque está fazendo isso comigo?

Surreal | Romance BLOnde histórias criam vida. Descubra agora