Capítulo XXVIII

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No passar de uma semana, eu fui todos os dias ao hospital em todo o tempo que me era livre. Eu ia de manhãzinha, durante o almoço e no final da tarde, até de madrugada quando me permitiam. O resto do tempo eu passava no prédio do Governo cuidando – ou tentando – dos assuntos do reino. Eu evitava a mansão e só ia ver como Austin estava quando ele estava dormindo; mudo e de olhos fechados.

Chris, na maior parte do tempo, estava comigo e quando não podia, esclarecia meu desaparecimento aos repórteres, e a quem quisesse ouvir, que eu estava atolada de trabalho. Eu me sentia como se todo o mundo quisesse falar comigo, me sentia constantemente vigiada e sozinha. Incerta do que eu estava ou deveria estar fazendo.

Mas eu continuava visitando-a, mesmo que Lauren não me aguentasse mais lá. Eu entrava em seu quarto e ela rodava os olhos e dizia "a senhora de novo, alteza" e eu sorria, falando alguma bobagem. Isso se repetia todos os dias e eu me sentia confortável com essa estranha rotina. Às vezes conversávamos (nunca civilizadamente, a gente sempre acabava discutindo por alguma bobagem) ou eu só ficava ali, olhando-a de esguelha para não intimidá-la. Bem, não tanto quanto eu já havia intimidado.

O médico dissera que era bom levar alguma coisa que a fizesse se lembrar de mim e eu levei todo o tipo de coisa esquisita: o travesseiro que compartilhávamos, sua jaqueta de couro, meu blusão branco, até uma calcinha minha eu tinha levado – o que fora extremamente engraçado vê-la corar daquele jeito. Mas nada a fazia se lembrar. Às vezes, por baixo da dúvida e da irritação que ela expressava, eu conseguia ver que ela estava se esforçando. Mas isso a deixava com dor de cabeça e mais mal humorada que nunca.

Lauren conseguia se levantar e até andar um pouco mas os remédios que ela estava tomando eram muito fortes e na maioria das vezes ela dormia. E eu adorava quando ela a fazia porque aí não teria olhares sarcásticos e raivosos para cima de mim e eu podia passar o tempo todo admirando seu sereno rosto bonito. Desde o primeiro dejá vu, só mais dois ocorreram, tão rápidos quanto o primeiro.

Um foi quando eu passei a noite lá e estávamos assistindo TV; ela em seu leito e eu no pequeno sofá desconfortável. Quando percebi, eu já estava cochilando, mesmo que numa posição horrível. Na hora que eu acordei de bruços (eu tinha essa estranha mania de me movimentar demais durante o sono), e levantei a cabeça meio dormindo ainda, Lauren me olhava com os olhos fixos e vagos, imóvel.

Mesmo quando eu me levantei e cheguei perto, ela só respondeu quando eu a toquei. Ela gritou surpresa e se afastou como se meu toque fosse fogo. Não comentou mais nada e passou o resto da noite mais calda que o normal. No outro, eu tinha chegado no seu horário de almoço e ela se recusava a comer a comida de sua bandeja, oh surpresa, branca. Eu estava morrendo de fome e para persuadi-la a comer, experimentei brincando que a comida não estava envenenada; para que vossa alteza não se preocupasse.

Como ela não queria de jeito nenhum comer agora que eu pusera minha "boca em seu garfo", palavras suas em tom fresco, eu continuei comendo, adorando tudo o que punha na boca. Novamente, quando levantei a cabeça, minhas bochechas cheias de comida, ela me encarava com os lábios tremendo.

Quase cuspi pra fora quando ela começou a gargalhar com os olhos fechados, algumas rugas ao redor de sua expressão surpreendentemente divertida. Quando eu lhe perguntei, um tanto emburrada, qual era a graça, meu coração falhou ao ouvir sua resposta.

"- Você parece uma porca comendo, Camz"

Depois de alguns momentos de aturdimento de ambas as partes, eu inclinei minha cabeça, apontando a colher para ela e dando o maior sorrido que eu me lembrava de dar nos últimos dias.

Charmed |Camren|Onde histórias criam vida. Descubra agora