"Se não houvesse escuridão não distingüiríamos a luz".
Profeta Leí¤¤¤
Era mais um dia desses que se tornou normal no cotidiano de Dona na Rocinha; escola pela manhã, almoço e afazeres domésticos, dever de casa, vestido vermelho e, por fim, lixão.
A escola era uma obrigação que Dona cumpria com real desprazer e desprezar. Mangada das outras crianças, se isolava e, preferia continuar na sala de aula a sair pro recreio. Pequenos insultos, puxões de cabelo, risadas debochadas... Dona se sentia humilhada e não compreendia porque sofria tamanha perseguição. Nordestino é um povo tão sofrido que na primeira oportunidade não exita em fazer sofrer, mesmo se sendo um dos seus. Ou será que era apenas coisa de crianças? Dona se esquivava o quanto podia e, por vezes, até revidava as agressões. Pensava mesmo na mãe. Queria orgulhá- la e, quem sabe um dia, tirá- las daquele estado de miséria por meio do estudo.
Depois de colocar seu vestido, desceu o beco rumo à rua do Valão. "Quem sabe uma cortina pra combinar com o sofá?", ela pensou.
Um espelho trincado, uma boneca de pano encardida, um jogo de dominós incompleto e um... "o que era aquilo? ", pensou erguendo de súbito seu corpo esguio, "seria? ...". Dando pequenos saltos, desengonçado, além de horroroso, o pássaro sem asas surgiu em meio ao lixão. Dona o seguiu cada vez mais adentro dos entulhos. Pensou tê- lo perdido. "Por favor não vá ainda" , sussurrou baixinho tentando encontrá- lo. Encontrou-o. E ergueu a mão em forma de conchas na esperança que a criatura subisse em sua palma. Nesse instante de reencontro com seu pássaro sem asas, surgiu, acima de sua cabeça, uma luz. Sim, uma luz intensa mais brilhante que o Sol. Uma luz tão poderosa que Dona teve que lançar as mãos sobre os olhos e, ajoelhada, foi envolvida por um calor que aquecia o corpo e o coração. Teve medo. Mas tão logo a luz a envolveu o medo foi disperso, dando lugar a um sentimento de paz e conforto na alma.
Quando, por fim, abriu os olhos, Dona já não estava mais na Rocinha. Dona já não estava mais no lixão. Dona estava, agora, em um outro lugar...
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Unicórnios, Vestidos Vermelhos e um Mar Bem Perto
Fantasy#Wattys2016 ¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤ Capa por @RodolfoSalles, autor de "Absolutos". ¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤¤ 'Unicórnios, Vestidos Vermelhos e um Mar bem Perto' Quando uma luz te conduz para um novo mundo... Dias atuais. Zona Sul do Rio de Janeiro, Rocinha. Don...