15_ Força maior

82 18 1
                                    


Quando Dona deu por si, já era hora de ir pra escola e acordou com o despertar de um belo dia. Por um instante pensou que a fuga alucinada de uma floresta viva em chamas, no lombo de um Unicórnio, não havia passado de um sonho. No impulso de olhar pro trincado pra certificar que ele ainda estava lá, Dona se deparou com um espelho perfeito que refletia uma menina doce e bela.

Não havia sido um sonho. Embora Dona não soubesse que mundo era aquele, seu nome, ou quem aquele velho encapuzado carregando um alforje curtido em couro de dragão era, ela sabia, no fundo, que aquilo tudo era real e que algo importante estava acontecendo lá. Sabia também, no fundo, que sua existência, de alguma forma, teria uma razão e um propósito que ela era incapaz de imaginar qual. Era como uma pequenina peça de relógio que, mesmo parecendo insignificante, era essencial para a engrenagem de todo o mundo.

Na escola, a diretora reuniu as crianças no pátio para um anúncio importante, confirmando o que os jornais já haviam noticiado por toda a semana.

- Por questões de força maior, sexta-feira não teremos aula - Disse segurando o microfone.

As Unidades de Polícia Pacificadoras (UPP's) haviam sido instaladas antes da Copa do Mundo de 2014 tornando-se uma das políticas de segurança mais ousadas de todos os tempos na história do Brasil. Mesmo com o fim da Copa, essa medida de segurança se estenderia até os jogos olímpicos de 2016 realizado na cidade maravilhosa. No entanto, as UPP's não eram suficientemente eficazes no mantimento da paz e da ordem nas comunidades cariocas. Operações especiais eram realizadas corriqueiramente em busca de foragidos, drogas e etc. Tiroteios intensos, mortes de moradores vítimas de balas perdidas e abuso de autoridade e poder já faziam parte da rotina dos cidadãos da Rocinha.

Naquela semana, prevista para sexta-feira, estava prestes a acontecer mais uma dessas "operações especiais". Uma operação de magnitude considerável, já que aconteceriam simultaneamente em todas as comunidades do Rio de Janeiro. As razões variavam. Uns diziam que a violência havia aumentado consideravelmente. Outros ressaltavam a proximidade dos jogos e o aumento da chegada dos turistas. Tinham até os que multiplicavam o boato de que a Tocha Olímpica iria passar pela Estrada da Gávea tornando-se no "maior acontecimento da história da Rocinha".

- Evitem sair de suas casas e façam o dever - Continuou a diretora.

Sexta-feira seria o céu caindo e mundo se acabando.

Unicórnios, Vestidos Vermelhos e um Mar Bem PertoOnde histórias criam vida. Descubra agora