Não posso negar que sempre senti uma certa inveja dos meus amigos. Todos tocavam e cantavam muito bem, mas quem me dava mais raiva era o Dudu, que além de ser um gênio na guitarra, ainda escrevia umas letras de cair o queixo. Ninguém nunca disse isso, mas eu sei que só entrei para a banda por ser amigo dele.
Tive três meses para aprender a tocar bateria. No quarto mês eu já conseguia manter o ritmo sem atrapalhar o resto do grupo e, no fim do ano, fizemos nosso primeiro show. Foi em um barzinho chamado Presley Rock Club. Ali não cabiam nem 50 pessoas, mas para a gente, aquilo parecia um estádio lotado.
Daquele show em diante, as letras do Dudu só evoluíram. O baixo do Carlinhos soava cada vez mais parecido com o de John Paul Jones. Os solos do Gui ficavam mais elaborados. E eu continuava me esforçando para não perder o ritmo.
Me concentrava tanto para acertar aqueles pratos e tambores na hora certa que nem notei que tinha me tornado o baterista da melhor banda do país. Logo, por acompanhar as melodias mais difíceis e elaboradas da atualidade, comecei a ser citado nas listas de melhores bateristas.
Foi aí que percebi que eu não estava apenas marcando o tempo para a banda dos meus amigos. Eu estava ditando o ritmo da vida de muitos jovens que se identificavam com nossas mensagens, baixavam nossas músicas e lotavam nossos shows.
Vender camisetas com a minha cara estampada e dar entrevistas para sites e revistas era a melhor sensação do mundo. Até que recebi aquela ligação de Carlinhos. Eu não queria acreditar, mas ele não estava mentindo quando disse que Dudu tinha sido encontrado morto em seu apartamento.
Naquele dia, eu perdi o ritmo e nunca mais recuperei. Deixei minha bateria na garagem para ficar pegando pó eternamente e comecei a levar a vida que teria levado se Dudu nunca tivesse me deixado entrar na banda. Hoje, dentro das quatro paredes do meu pequeno escritório, não preciso de um metrônomo para saber que estou perdendo o tempo.
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Presley Rock Club
ContoComo um barzinho que provavelmente nunca recebeu uma visita da vigilância sanitária conseguiu mudar a vida de tantas pessoas? Nesta coleção de contos, o Rock n Roll é o fator responsável por reunir as histórias e personagens mais improváveis em um...