Capítulo Quinze

23 3 0
                                    

Acho que nunca tinha corrido tanto, exceto quando diziam que a loja de jogos tinha lançado promoção (Modéstia à parte, eu era um bom corredor, mas só porque os garotos maiores costumavam correr atrás de mim para tirar meu dinheiro do lanche). É como se nossas pernas estivessem se movendo sozinhas, incentivadas pelos gritos do gordo atrás de nós. Com essas corridinhas, meu All Star acabava se desgastando, aquilo fazia aparecer orelhas gigantes nas laterais do tênis, não sei porque não pensei em pegar sapatos nos aviões de carga. Johnny já não tinha aquela camisa branquinha com a estampa chamativa, a jaqueta cobria uma parte da blusa encardida, a estampa meio rasgada, estávamos parecendo garotos com um bom tempo sem tomar banho (o que era verdade). Se eu não me engano, nossos dias fora de casa até agora são seis, embora pareça ter mais de um mês. Para você que acha moleza, imagine estar longe de seus pais, ou mãe, no caso, ter passado o aniversário dentro de um avião de carga, estar cheio de machucados pelo corpo, num lugar desconhecido e com pessoas que não conhece, se ainda acha moleza, pega um vôo o mais rápido para cá e então nós discutimos melhor. Chegou a um ponto que estávamos chegando num lugar sem canais, eram largas ruas cheias de árvores e bicicletas, o gordo continuava correndo atrás de nós, apesar de parecer ter cento e vinte quilos, ele tinha energia, até eu estava quase morrendo, corremos por volta de um quilômetro e meio. Mais à frente, apareceram três caras com farda militar e olhos puxados, segurando uma arma na mão e algo que deveria ser uma metralhadora nas costas. O susto fez todos se separarem, Jimmy e Lua viraram uma esquina, eu, Johnny e Meg viramos outra, Tom, Sammy e Annie ficaram para trás e não vi o que houve com eles.
- Ferrou tudo! - ouvia Johnny gritar.
- Que nada! - eu dizia, com o vento lutando contra minha boca.
- Já corremos perigos maiores!
Porém, sabia do que ele falava, aqueles caras eram os mesmos que nos perseguiram na China.
- Concordo com o Tommy. - disse Meg.
- Johnny. - corrigi.
- CADÊ O HOTDOG?! - Johnny berrou, parando de correr.
- Quer morrer? Continua correndo, depois procuramos por ele!
Mal terminando de falar isso, tiros atingiram a parede, vários estilhaços voaram, atingindo nós três.
- Não quero morrer agora! - Johnny bateu em disparada.
- Concordo novamente - Meg o seguiu.
- Você acha que eu quero?! - tentei alongar a distância que a perna chegava para correr mais.
Chegou um ponto que a quantidade de pessoas começava a aumentar, por um lado era ruim porque tinha menos espaço para correr, o lado bom é que nós éramos menores e mais flexíveis, passávamos com mais facilidade por lugares fechado e dava para desviar dos pedestres que andavam ali. Corremos um pouco até que surgiu um beco um pouco mais na frente, à nossa esquerda, segurei a jaqueta de Johnny e entrei no beco, era um lugar mais estreito que o corredor da minha casa, tinha alguns caixotes de madeira com frutas podres, uma lata de lixo, roupas velhas e um grande lençol felpudo cinza. Coloquei uma touca, sentei no chão, e enrolei nós dois com o lençol, cobrindo Johnny e fazendo parecer que eu era um mendigo obeso, Johnny pegou uma maçã verde que estava no chão e me entregou.
- Finja que está saborosa... - ele riu por baixo do cobertor - Mano, isso aqui fede.
- Acho que estou com gases. - brinquei.
- Não está não, segura aí.
Logo os caras chegaram no beco, reviraram os caixotes, olharam em volta e por fim nos perceberam, tentei virar a cabeça discretamente sem parecer suspeito, ouvi apenas os passos atrás de nós, era só um andando, a cada metro a menos que ele estava de nós eu ficava mais nervoso, o suor já corria pela lateral do rosto. Alguém do outro lado da rua gritou, mas não em inglês ou holandês, estava mais para coreano, mandarim ou japonês, o que levou a concluir que eram realmente os chineses. Os dois recuaram e correram, provavelmente indo na direção de onde veio o grito, joguei o lençol para o lado e tirei a touca, me limpando da poeira.
- Pegaram alguém do nosso grupo - deduzi.
- Como pode saber? Eles podem ter recebido uma ordem superior para recuar.
- Nós nos envolvemos com eles, sabemos de coisas que não eram para serem reveladas, entendeu?
- Aaaaah sim, não entendi...
- Já sei porque repetiu tantas vezes na escola - eu disse, tentando colocar algum sarcasmo naquele momento.
- Por que?
- Porque você é muito inteligente, vamos, eles devem estar em alguma emboscada... eu sempre quis dizer isso...
- Ah, obrigado.
Decidi ignorar o alto QI de Johnny e prosseguir, seguindo os caras de olhos puxados. Ele nos levou a uma rua aberta, cinco a seis policiais mantinham Tom, Annie e Sammy. Isso me estranhou, porque achava que eles talvez preferissem fazer isso num lugar discreto, é como se não estivessem muito preocupados, já que vimos parar aqui e isso é uma viagem onde praticamente passa em vários tipos de regiões envolvidas com algum tipo de tráfico. É possível que eles tenham vista grossa pela polícia, não que sejam todos os policiais, mas pelo menos uma unidade de doze ou quinze, sem incluir os com alta patente.
- Aaaah!!! - Johnny parecia ter surtado, arrancou para frente numa velocidade que nunca tinha ido. - Soltem meus amigos!
Então ele me fez entrar num pensamento profundo sobre amizade e outros laços, é chamativo o fato de querer ajudar pessoas que acabamos de conhecer, bem meloso e sensível, tem uns metido à machão por aí que diria "que viadagem", mas, fazer o que? É o intelecto humano, não estudo psicologia, mas sei que é difícil controlar a comoção, às vezes lhe toca tão profundo que volta com petróleo. Numa explosão confusa de sentimentos, disparei junto a Johnny, que pulou nas costas de um "militar" e bateu incansavelmente com a mão fechada em sua cabeça, fazendo-o grunhir como um palhaço que engoliu um trompete. Sem pensar muito, abri o zíper da mochila, que agora estava mais leve do que antes (Às vezes o peso da bolsa simplesmente parecia desaparecer, mas era somente pelo fato de estar acostumado, o fardo nas costas sumia igual ao momento em que você percebia que sua nota não foi tão baixa quanto pensava, quem não costuma estudar muito deve saber como é. Ao conferir o que tinha pegado aleatoriamente na mochila, me decepcionei com a pouca sorte que tinha por ter uma escova de cabelo azul para competir contra metralhadoras e fuzis. Um dos asiáticos riu ao ver a arma potente que eu tinha em mão, ele deveria estar pensando, "O que ele vai fazer? Pentear meu cabelo? "
- Vou te mostrar qual é a do pentear cabelo! - avancei gritando, ainda em dúvida se era um grito de guerra ou de medo.
Todas aquelas bolas de queimado que já levei quando era um nerd magrelo, aquelas que me acertavam na cabeça e me colocavam no chão, que parecia uma bala de canhão atingindo estômago e fazer tudo o que eu comi de manhã subir para a boca. Todas aqueles grandões mirando, a raiva que eu sentia por todos eles subiu à mente.
- Essa é por todos os nerds magrelos que já foram nocauteados em quadra por uma bola!
Segurei bem o cabo da escova, que ainda tinha alguns fios cheios de gel do cabelo de Johnny, e lancei para frente jogando o peso do corpo junto. A escova saiu da minha mãe e girou pelo ar em alta velocidade até acertar o nariz do cara que riu de mim.
- Ha! Acertei! - a pancada o derrubou, me fazendo querer correr e sair comemorando, mas preferi dar uma de metido a macho confiante - Trouxa, vou te fazer voltar para onde você não deveria ter saído.
Eu sempre quis falar isso, sempre me olhava no espelho e ameaçava o meu próprio reflexo, a fim de reproduzir a típica cena em filmes de agente secreto e ação.
As pessoas na rua só então pararam para observar o que estava acontecendo. Me virei para Johnny, que ainda estava dando tapas consecutivos na cabeça do homem de antes. Queria saber o que ele tinha contra aquele cara, o rosto do coitado estava parecendo um balão de água vermelho, se os olhos dele já eram puxados, agora os cílios já ficavam escondidos entre as pálpebras, agora inchadas.
- Nunca gostei de seu pastel de flango! - ele dizia.
Atrás de mim tinha uma garota com um vestido florido e boina segurando o celular em posição de filmagem. Ela mascava chiclete e calmamente nos filmava como se aquilo fosse um teatro. Senti um braço se enrolando em meu pescoço, apertando minha garganta, logo um outro segurava minha cabeça, presumi que tentavam fazer um mata-leão em mim. Ao invés de tentar me livrar puxando os braços de quem me imobilizava, como geralmente acontecia em filmes (agradeço Hollywood por me mostrar tantas coisas que poderia usar na vida, ao invés da professora me ensinando fórmulas e achar o valor de x), tentei machucá-lo com o cotovelo, golpeando sua barriga ou socando o ar tentando atingir sua cabeça. Parecia que o cara era de ferro, nada o machucava, bem que estava sentindo músculos formando aqueles braços que queriam me matar. Foi aí que me faltou ar, tentei respirar, tentei contrair o diafragma ou algum maldito músculo que possibilitasse minha respiração, não consegui. Sentia meu olhos inchando e querendo pular para fora, minha visão escurecia aos poucos.
- Ordem, esquadrão, atacar! - Jimmy estava de pé um pouco mais longe de nós, erguendo um pedaço longo de cano como se fosse uma espada.
Acho que isso atraiu a atenção do grandão, porque os braços que me apertavam afrouxaram e consegui respirar, ainda que desesperado, aliviou bastante. Luanna e Meg surgiram atrás de Jimmy, cada uma segurando um estilingue carregado, apontando para nós. Elas vieram correndo em nossa direção ainda de olho na mira, então atiraram. Uma pedra atingiu o pescoço do cara que estava querendo me estrangular, fazendo-o cair para trás, infelizmente me levou junto. Minha queda foi amortecida pelo corpo de um bodybuilder asiático. Me livrei dos braços assassinos e rolei para o laço, me levantando com dificuldade.
- Filho da... - mirei um chute onde a minha pouca educação acha melhor não dizer.
Ele grunhiu, levando uma das mãos que seguravam o pescoço, ao meio das pernas. Foi gratificante. Olhei para o lado e vi outro cara caído com a testa sangrando.
- Isso! Ganhei! - Meg saltitava com as mãos para o alto, sorridente.
- Pelo menos eu acertei o pescoço do outro... - Luanna murmurou.
- Morra! - o cérebro pequeno de Johnny não processava que o homem já estava inconsciente.
Jimmy veio caminhando lentamente até mim, girando o seu bastão de cano quebrado entre as mãos.
- Bom, a parte boa é que acabamos com alguns deles e ajudamos vocês, mas... - ele parou de girar o cano e engoliu seco.
- O que?
- Onde estão Tom e os outros? - concluiu Jimmy, quase me causando um infarto.


Bom, finalmente o capítulo saiu, foi mal pela demora. Estou pensando nessas pequenas caixas de diálogo no final dos capítulos, vocês curtem ou acham chato? Comentem aí em relação a isso, talvez a gente possa conversar um pouco aqui, quero saber a opinião de vocês.
~Álvaro

 O VideoGameOnde histórias criam vida. Descubra agora