7.2 - Arroz e frango

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Ou eu estou em uma cidade deserta, ou eu não estou em cidade nenhuma. Estou caminhando há algumas horas e não vejo nada ao meu redor a não ser uma imensa estrada reta que se perde no horizonte ao se juntar com o céu. É frustrante, porque um dos motivos pelos quais eu decidi abrir mão de tudo que eu tinha era conhecer vários lugares e aproveitar por onde eu passasse, mas aqui só tem vários nadas. Eu olho para o céu e a posição do sol indica que já passou do meio dia há algumas horas. Meio da tarde, provavelmente. Algumas nuvens mais escuras começam a se aproximar e provavelmente vai chover, mas eu não me preocupo.

Eu realmente não sei o que fazer, nem para onde ir e todo aquele papo na lanchonete me deixou mais pensativo do que eu esperava e gostaria. Isso tudo somado ao problema de que eu não tenho para onde ir e nem sei o que fazer agora, que estou aqui sozinho. Continuo caminhando sem pressa na beira da estrada e pensando em pedir carona, mas a vontade de voltar está se tornando maior e isso é ridículo. Não posso me afeiçoar a ninguém, essa era para ser uma viagem só minha, de autoconhecimento e assim vai continuar até o fim. O fato é que eu sinto falta de me conectar com as pessoas. Essa jornada está sendo mais solitária do que eu imaginava.

Finalmente eu encontro algo naquele lugar além de estrada e poeira. Há alguns metros de mim eu vejo uma espécie de celeiro na beira da estrada com as portas abertas. Eu me aproximo e percebo que é um restaurante, mas com um menu bem reduzido: arroz e frango. Como minha última refeição foi há horas eu decido entrar e pedir um prato, pois precisei sentir o cheiro de comida para me dar conta de que estava morrendo de fome.

Um casal de idosos está atrás do balcão e eu como ali mesmo, para conversar um pouco. Eles me contam que moram ali há pouco mais de 50 anos — eu noto uma casa bem ao longe, atrás do restaurante, pela janela dos fundos — e que decidiram construir o lugar porque perceberam que muitos caminhoneiros passam por ali e eles logo imaginaram que todos eles estariam com fome, já que não tem muitas opções pelo caminho. A senhora, Dona Magdalena, me pede desculpas por frango ser a única coisa a ser servida e o Sr. Oswaldo logo explica que é por causa do tempo seco no lugar que atrapalhou a criação, fazendo as vacas ficarem magras, literalmente.

— Não precisam se desculpar porque está tudo maravilhoso! — eu digo. — É tudo tão saboroso, o tempero é tão especial. Não como algo assim há anos.

— É porque é feito com amor de avó — Sr. Oswaldo sorri enquanto olha para a esposa.

— Então é por isso. Minha avó faleceu quando eu tinha dois anos.

— Eu sinto muito — diz Dona Magdalena, colocando a mão em meu ombro.

— Tudo bem. Eu nem me lembro mais dela.

— Aposto que ela foi uma grande mulher — ela tenta me confortar.

Eu dou de ombros.

— Por que vocês decidiram morar logo aqui, no meio do nada?

— Quando viemos para cá, essa era uma terra promissora, muita gente queria investir aqui. Mas no fim, a prefeitura impediu que qualquer coisa fosse feita porque estabeleceram que aqui é área de mananciais e nada pode ser construído. Como já tínhamos começado a construir nossa casinha, precisamos lutar muito para mantê-la em pé. Foram anos de disputa até eles desistirem e nos deixarem ficar.

— Por fim esse se tornou o nosso lugar de paz — Dona Magdalena sorriu, com os olhos cheios de lembranças.

— E você, meu jovem, o que está fazendo por esses lados?

— Tentando encontrar o meu lugar de paz, eu acho.

Me levantei e abri a carteira para pagar pelo almoço, mas eles se negaram a aceitar e insistiram até eu guardar a nota de volta. Disseram que era uma cortesia da casa e que eu tinha pago a eles com uma conversa agradável. Eu sorri e agradeci.

— Que você encontre o seu lugar, meu querido! — gritou Dona Magdalena antes de eu desaparecer porta afora.

Eu sorri e continuei meu caminho.

Antes de Escurecer (Pausado)Onde histórias criam vida. Descubra agora