Já estava quase no fim do meu expediente e como o fluxo de clientes já tinha baixado bastante, fiquei sozinho no balcão. Uma senhora bem distinta e bem apessoada entrou e veio na minha direção sorrindo largamente.
— Olá, Daniel. Tudo bem?
— Boa tarde, tudo bem. E a senhora?
Fui tão simpático quanto meu trabalho exigia, mas tentei me lembrar de onde eu a conhecia. Ou vice-versa.
— Por favor, querido, gostaria de provar essa novidade que todos da cidade estão falando. Só ouço elogios!
— Obrigado — eu sorri, ainda forçando simpatia de atendente.
Enquanto eu preparava o pedido, ela resolveu puxar assunto.
— Como vai a Sofia?
Então ela conhece minha mãe. Deve ser amiga da família.
— Vai bem, obrigado — respondi erguendo a cabeça rapidamente e voltando ao pedido.
— E seus avós? Faz tempo que não os vejo. Esses dias me encontrei com a sua tia.
— Desculpa, mas de onde eu te conheço?
Soei mais rude do que eu pretendia e logo me arrependi.
— Ah, me desculpe, não me apresentei! Sou Arlete, conheço sua família há anos. Meu marido, que Deus o tenha, trabalhou com seu avô. Nós frequentamos muito a casa de seus avós, te peguei no colo. Achei que você ia se lembrar de mim, que cabeça a minha — ela riu brevemente.
— Sinto muito.
— Tudo bem. Mas me diga uma coisa: e Pedro, como vai?
— Ele está ótimo, obrigado — eu respondi, entregando a ela um pacote com os doces.
— E como você o chama?
— De pai... Como mais eu chamaria?
— Que bonito isso — ela abriu um sorriso tão grande que eu achei que fosse me engolir. — A maioria das crianças chamam de tio, não é mesmo? As minhas filhas mesmo, chamam meu marido pelo nome. Fiz de tudo para chamarem ele de tio, pelo menos, mas nunca consegui.
Eu não estava entendendo onde ela queria chegar com toda aquela conversa.
— Mas continue assim — ela continuou. — É sinal de que vocês têm uma boa relação.
— O que a senhora quer dizer?
Imediatamente ela fez uma cara de quem falou o que não devia.
— Nada, meu querido. Nada... Hoje eu estou impossível, estou confundindo tudo! Diga aos seus tios que eu pago pelo pedido uma outra hora — ela foi falando enquanto saia rapidamente.
Para bom entendedor, meia palavra basta. Mas era isso mesmo que ela estava dizendo? Juntando com o que minha tia disse mais cedo, só pode ser uma coisa: o Pedro não é meu pai.
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Antes de Escurecer (Pausado)
Genel KurguO que você faria se descobrisse que vai ficar cego? O que você faria se descobrisse que vai ficar cego e tem um histórico de depressão e tendências suicidas? Daniel descobre no auge da vida que tem uma doença que o levará a cegueira. Enquanto relemb...