11 - Um cara muito bem arrumado me esperando

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Sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Eu nunca fui o tipo de pessoa que pensa antes de agir. Aprendi a ser assim desde cedo porque do contrário a vida me daria uma surra a cada cinco minutos. Mas o que eu estou prestes a fazer hoje foi há muito tempo calculado. Esperei meses para que minha cabeça estivesse bem fria para que eu pudesse agir e depois de muito procurar em vão, finalmente descobri a verdade.

O sol está se pondo atrás das árvores e eu estou parado na calçada, em frente a uma casa grande e alaranjada com janelas apertadas. A casa não tem quintal e muito menos campainha, então eu bato palmas algumas vezes e rezo para que me ouçam. Pouco tempo depois ouço o barulho de uma porta pesada se abrindo e de passos arrastados. Vejo uma sombra pela fresta do portão e em seguida o som de vários trincos se abrindo. E quando eu digo vários, eu quero dizer no mínimo 7. Foi o que eu consegui contar. Depois, me perdi nos pensamentos de como aquela família era neurótica com a segurança. Eles poderiam ser gangsters!

Antes de qualquer outra coisa maluca passar pela minha cabeça, o que era provavelmente a última tranca foi destrancada e o portão finalmente aberto.

— Boa noite, eu gostaria de falar com o Sérgio.

A mulher, que aparentava ter por volta de 45 anos, me olhava espantada, as rugas do canto da boca ficando em evidência enquanto ela mordia os lábios nervosamente. Ela não falou.

— O Sérgio, por favor - eu precisei repetir para arrancar alguma reação dela.

— Claro! O Sérgio. Um momento - e entrou, me deixando esperando do lado de fora.

Fico pensando se ela realmente esperou que eu pedisse com educação, usando o por favor, ou se a falta de expressão era por estar surpresa em me ver ali, já que eu não era esperado. Ou poderia ser botox também, claro. Muito provável que seja a segunda opção.

Longos minutos se passaram e eu estava quase desistindo daquilo tudo e indo embora quando Sérgio apareceu.

Ele não era tão velho - pelas minhas contas, tinha 43 anos -, mas os cabelos eram todos brancos. Nem grisalhos, nem rajados, completamente brancos feito neve pura. Era pouca coisa mais baixa que eu e estava vestido de forma muito formal para quem estava em casa. Acho que demorou tanto para me atender porque estava se arrumando. Sério, quem faz isso? Cara estranho...

— Daniel! Que surpresa boa. Vamos entrar, por favor.

Por dentro, a casa era escura e combinava com o clima que pesava entre nós. O ar estava pesado e eu tinha dificuldade em respirar. Não sei dizer se era pela atmosfera daquele lugar ou somente o meu nervosismo.

Sérgio me levou até a cozinha, onde me apresentou formalmente à Vivian, sua esposa. Ela ainda me olhava com grandes olhos e seus movimentos eram calculados em relação a mim, como se estivesse com receio.

— Casa bonita - eu finalmente disse, para quebrar o gelo.

— Obrigado - Sérgio respondeu. — É grande, mas infelizmente foi mal calculada. Priorizamos as áreas de convivência e outros cômodos sofreram com isso, como os quartos por exemplo.

O desconforto no semblante dele era visível enquanto ele falava, e eu não pude deixar de pensar que ele estava dando uma desculpa - esfarrapada, diga-se de passagem - caso eu dissesse que queria morar ali. O que sequer passou pela minha cabeça.

Conversamos por cerca de uma hora e, nesse intervalo de tempo, tanto Sérgio quanto Vivian me fizeram inúmeras perguntas a fim de me conhecer e eu fiz o mesmo. Fomos de perguntas triviais sobre times de futebol e música até algumas mais específicas, do tipo como eu me sentia com tudo aquilo que estava acontecendo e a situação em geral.

— Não vou mentir - comecei. — Tudo isso é bem estranho e desconfortável para mim.

Deixei uma risada fraca escapar entre a respiração e tentei disfarçar o nervosismo.

— Em uma hora a minha vida está normal, como sempre foi, e logo depois parece que o mundo virou de cabeça para baixo e eu sou uma outra pessoa, com uma origem diferente e com um passado que poderia ser completamente diferente.

Eles se entreolharam e olharam de volta para mim como se fossem se desculpar, mas continuei antes disso ser possível:

— Eu tenho muitas perguntas, minha cabeça não para um minuto sequer de tentar buscar respostas e você é a única pessoa que pode esclarecer isso para mim - olhei diretamente para Sérgio. — Mas agora não é a hora, acredito que vamos ter bastante tempo daqui para frente e poderemos conversar sobre tudo isso com mais calma.

Os dois concordaram e então eu me despedi.

Durante a volta para casa eu tento processar tudo o que aconteceu durante aquela conversa e não sei dizer exatamente como me sinto. Ainda não sei o que de fato aconteceu, os motivos que levaram meus pais a se separarem ou mesmo porquê Sérgio não quis me assumir, mas uma parte de mim se dá por satisfeita. Pelo menos eu finalmente conheci uma parte da minha história e no momento isso já me basta.

Antes de Escurecer (Pausado)Onde histórias criam vida. Descubra agora