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Sangue a ferver ▪

Dia 24

Uma vez Ethan disse-me que as sombras dizem a verdade, que mostram as coisas como ela realmente são.
Consigo ver nas sombras das pessoas aquilo que sentem.
Não consigo explicar. É como uma sombra de fumo à volta da pessoa que demonstra os seus sentimentos.
Por exemplo, a Haidean. O fumo à sua volta é tão agitado que se vê o quanto está feliz e entusiasmada.
-Porque é que nunca reparei nisto antes? - perguntei ao Ethan.
-Porque nunca acreditaste. Agora acreditas e a tua visão expandiu-se.
Vejo a minha mãe a chegar a casa pela janela e olho para ela com mais atenção. O fumo à sua volta mal se mexe e é muito opaco.
Dor.
-O aniversário da minha irmã aproxima-se. É sempre uma data difícil.
-Vocês, humanos, sentem tudo com muita intensidade. - diz.
-Às vezes é uma benção, outras vezes uma maldição. - digo.
Não tiro o olhar da janela mas sei que Ethan está a olhar para mim.

Dia 26

-Hey! Kira!
Olho para o rapaz que me seguiu da sala de aula até aqui.
-O que é que queres, Cody?
-Tens par para o Baile de Primavera? - pergunta.
-Não mas ainda falta imenso tempo de qualquer maneira. - reviro os olhos e começo a andar mas ele impede-me agarrando-me no braço.
-Kira, vá lá! Assim fica já guardado.
Guardado?!
-Mas tu pensas que eu sou o quê? Tua propriedade?!
Ele apenas sorri.
-És um idiota!
-Tu gostas!
Agora estou furiosa.
-E o que é que te faz pensar isso?
-Isto!
Ele puxa-me e beija-me. Encurrala-me entre ele e os cacifos. Tento empurrá-lo mas não consigo e as suas mãos prendem a minha cintura.
-Larga-me!
Ele apenas ri e mordisca-me o pescoço e sinto-me repugnada.
-Hey!
Cody pára e larga-me. Ethan aproxima-se a toda a velocidade. Tão rápido que nem me apercebo que o punho dele teve um encontro com a cara do Cody.
Ethan coloca o seu braço sobre os meus ombros e encosta-me mais a si.
-Estás a meter-te com a minha miúda? - pergunta.
Cody não responde. Está demasiado ocupado a gemer de dor.
Ethan parece satisfeito e começamos a andar a caminho de casa.
-Estás bem? - pergunta, tirando o braço dos meus ombros.
-Sim. - ele parece mesmo preocupado - Obrigada.
-Vamos para casa.
Chegando a casa aterro mal a minha cabeça toca na almofada. Estava mesmo cansada.

Está frio.
Olho à minha volta e vejo neve. Mais nada. Apenas neve.
Estou a tremer de frio e parto o gelo por baixo de mim fazendo-me cair na água gelada. Tento nadar mas algo me puxa para baixo. Olho e vejo os príncipes do Inferno. Ethan também lá estava a puxar-me.
Consigo soltar-me e quando penso que estou a chegar à superfície apenas toco em gelo e mais gelo. Tento parti-lo mas não consigo. Estou presa. Estou perdida.
Estou morta.

-Shh!
Abro os olhos para ver Ethan a agarrar-me nos ombros com os olhos muito abertos.
-Está tudo bem. Foi só um sonho.
Foi só um sonho mas continuo a tremer de frio.
-E-Ethan...
-Não precisas de falar.
Ele puxa-me para si como se eu fosse uma criança a ser embalada. A t-shirt preta que veste é fina e o calor do seu corpo é fácil de sentir. A minha boca treme de frio como se o sonho tivesse sido real.
Ainda estou meio adormecida quando começo a passar a mão pelo seu braço. Passo para o peito, para o ombro e de seguida acaricio-lhe o pescoço.
-Ki...Kira...
Os meus dedos passam nos seus lábios impedindo-o de continuar a frase.
Olho agora para a parede atrás de si onde se vê a sombra. O calor não vem só dele mas também das asas. Elas cobrem-nos aos dois como se fossem mantas.
Sento-me mais chegada a ele passando um dedo pela sua clavícula.
-Sempre me perguntei...
-Kira... - Ethan fecha os olhos mas eu obrigo-o a olhar para mim.
-...de que é que são feitas as tuas asas.
Ethan agarra na minha mão de maneira a eu parar.
-Podes vê-las. Senti-las.
Abro muito os olhos e vejo uma das asas a abrir mais através da sombra. Ethan pega na minha mão e pousa-a em algo macio. Penas.
Em segundos um par de asas negras nasce das costas de Ethan.
Abro a boca e não consigo esconder o fascínio. Passo as mãos nas suas asas sem acreditar naquilo que estou a ver.
Ethan cobre as minhas mãos com as suas e puxa-me para si. Olho para os seus lábios a milímetros dos meus e não me contenho mais. Puxo-o pelo pescoço e elimino o espaço que havia entre as nossas bocas com um beijo. Os seus lábios são quentes em contraste com os meus que estavam gelados.
As mãos dele puxam-me mais para si pela cintura sem parar o beijo.
Não sei o que estou a fazer. Não consigo pensar.
O beijo é intenso como se necessitássemos um do outro desesperadamente. Há muito tempo.
Os seus lábios largam os meus tocando na pele do meu pescoço e o efeito é imediato.
Tal e qual um diabo, mal os seus lábios tocam na minha pele o meu sangue começa a ferver.
-Ethan...
Quando os seus lábios voltam aos meus é que eu percebo realmente o que está a acontecer e afasto-me saindo do colo dele.
-Não... Não podemos.
-Kira...
-Ethan, isto nunca devia ter acontecido.
Saio da cama e entro na casa de banho onde sei que ele não vai entrar apesar de ser o diabo que é.
Lavo a cara com água fria para refrescar a pele demasiado quente.
Beijei um diabo e acabei por me queimar.

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