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O som do teu coração ▪

Dia 80

-Kira...
Alguém me abana para me acordar e basta ouvir a sua voz, diria de anjo se não o ofendesse, para abrir imediatamente os olhos e agarrar-me ao seu pescoço.
-Ethan! - mergulho a minha cara na curva do seu pescoço - Pensava que me tinhas deixado para sempre!
-Kira,tu sabes que... - nunca te deixaria, queria ele dizer. Mas nós sabemos que não vai ser assim. Não é ele que me vai deixar. Sou eu, forçadamente, mas vou ser eu a deixá-lo. Dez dias.
-Senti a tua falta! - quase grito. Olho nos olhos dele e desta vez sem medo de me perder. Deixei de ter medo e comecei a desejá-lo.
-Desculpa. - sussurra e desvia o olhar.
Coloco a minha mão no seu queixo delicadamente e faço-o olhar para mim.
-Eu é que tenho de pedir desculpa. O facto de saber que és tu quem me vai tirar a alma consumiu-me, mas quero que saibas que não escolheria outra pessoa para o fazer. Talvez o facto de o dia estar cada vez mais próximo também ajude.
Ethan puxa-me para si abraçando-me. Com a minha face contra o seu peito poderia ouvir, sentir o seu coração. Ou não...
Fico chocada quando me apercebo que eu não sinto o seu coração contra mim. Nem o ouço. Nem sequer há sinal de haver um coração.
-Ethan... O teu coração.
Passo a mão pelo seu peito e ele fala.
-Sou um diabo, não tenho sangue, logo o coração não bate.
Ele diz estas coisas como se fossem óbvias para mim. Contudo, respira. Há coisas que nunca vou entender.
-Mas posso garantir-te uma coisa - continua - Eu sou completamente viciado no som que o teu coração faz. Sou capaz de passar noites inteiras acordado só para o ouvir e só para te ouvir respirar.
Sorrio e deixo os meus lábios tocarem suavemente nos seus para um beijo doce e delicado. Porque é que demorámos tanto a entregarmo-nos um ao outro?
Abraço-me de novo a ele.
-Eu acho que te amo. - murmuro mais para mim do que para ele.
Consigo sentir o seu sorriso contra o meu cabelo e contra o meu ombro quando o beija.
-Bem, eu tenho a certeza.
Aquilo faz o meu coração acelerar, e o meu corpo encher-se de correntes quentes agradáveis.
Mas estes momentos de felicidade e paixão nunca duram muito, pois acabo sempre por me lembrar do tempo. O tempo que não temos.
Pergunto-me se ele me irá esquecer quando isto tudo acabar. Se no fim ele vai pensar "Amei-a muito mas é passado". Eu não gostava do pensamento de ser o passado do Ethan, a única coisa que queria era ser o seu presente e futuro. Mas eu sei que haveria de fazer sempre parte do passado dele, porque ele é imortal e eu não. Um dia eu acabaria por deixá-lo mesmo que não fosse nestas circunstâncias. Serei sempre eu a deixá-lo e o sentimento despedáça-me por dentro.
Agarro-me a ele como se desta maneira conseguisse fazer o tempo parar. Conseguisse prolongar o tempo que ainda nos resta.
Ethan que sempre me abraça como se eu fosse de vidro aperta-me também contra ele. E ficamos assim durante algum tempo.
Tempo.

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