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▪ O anjo apaixonou-se pelo diabo ▪

Dia 53

   Jev e eu temos trocado mensagens e acho que isso irrita o Ethan. Não por incomodá-lo que eu ande a falar com ele mas porque é o Ethan e tudo o irrita.
   O sol que entra pela janela forma sombras que seriam aterrorizantes a qualquer pessoa mas não a mim. Sinto-me mais segura com aquelas asas a cobrir-me.

   Mais tarde Ethan disse que ía aproveitar que a minha mãe tinha saído para ir comer qualquer coisa à cozinha mas isso já foi há algum tempo.
   Mas é o Ethan, mesmo que eu não queira ele vai voltar. Mesmo não sendo por questões de proteção.
   Concentro-me de novo no meu livro mas não por muito tempo, pois oiço uma melodia que me é familiar.
   Oiço a música do piano e fecho os olhos para a absorver. O piano do meu pai.
   Espera!
   É o piano do meu pai!
   Largo tudo o que estou a fazer e corro até ao sotão quase tropeçando nos degraus. Não é o meu pai que vejo, como desejava, mas sim Ethan. E inconscientemente, também o desejava. Príncipe do Desejo.
   Ele está a tocar pelas pautas do meu pai. Não consigo evitar um sorriso melancólico ao recordar as memórias passadas neste sotão com ele no piano, Jazmine no violino e eu a assistir. Nunca aprendi a tocar nada.
   Uma lágrima escorre pela minha face e limpo-a discretamente.
   -Não sabia que os diabos sabiam tocar piano.
   Ethan pára de tocar e olha na minha direção. Mesmo a esta distância sinto o calor dos seus olhos nos meus.
   -Kira...
   Tento sorrir mordendo o interior da bochecha para me impedir de chorar. Ethan não repara nisso quando me sento ao seu lado. A sua perna está a tocar na minha e isto parece o gesto mais íntimo do mundo.
   -Nós nascemos com certas aptidões de atração. Não precisamos de as aprender como vocês, simplesmente nascemos assim. Faz tudo parte de sermos diabos. Tudo em nós e feito para atrair. Uns mais que outros. Como um predador atrai a sua presa. - diz.
   Nunca tinha pensado nisso dessa maneira, mas faz sentido. Tudo neles é perfeição e o que não é só as sombras o conhecem.
   Apesar de eu achar as asas de Ethan a coisa mais linda e cativante que eu já vi.
   -Sabes tocar? - pergunta.
   -Não. - faço uma pausa e tento que a minha voz não trema - O meu pai sabia. Essa melodia que tocaste foi ele que escreveu.
   Ele parece não saber o que dizer. A mão dele pousa no meu joelho apanhando-me de surpresa e fazendo-me olhar para ele.
   -Não era minha intenção... - Ethan a pedir desculpa?
   Cubro a sua mão com a minha.
   -Está tudo bem. Soube bem ouvi-la de novo. Traz-me boas recordações.
   Tento sorrir sem que o queixo me trema. Ethan passa um dedo pelo meu maxilar deixando um rasto quente.
   Quando acho que apaguei qualquer chama de sentimentos que pudesse sentir por Ethan o seu toque é o suficiente para me queimar de novo.
   A sua boca aproxima-se da minha. A distância entre nós está quase eliminada. Mas eu afasto-me. Não muito mas o suficiente para manter a distância.
   Engulo em seco e levanto-me. A mão de Ethan cai no seu colo e ele fita o vazio agora.
   Abro a boca para falar mas nada me parece correto por isso limito-me a descer as escadas do sótão até ao meu quarto. Ethan não me segue. Acho que precisamos ambos de espaço. De tempo.
   Tempo. Uma coisa que não temos.
   Uns minutos mais tarde oiço um barulho e penso que é Ethan, mas não é. É Lilith e o resto dos príncipes. Olham para mim intimidantes mas a verdade é que já não me metem medo.
   -Pareces em baixo. - diz aquele que eu penso ser Gabriel. Ira.
   É bonito. Olhos cinzentos quase sem cor, cabelo escuro. Perfeito até. Como qualquer diabo. Na sua sombra vejo cornos compridos mas não iguais aos de Lilith que encaracolam nas pontas. Os de Gabriel são direitos. As asas são semelhantes às de Ethan e vejo ainda umas garras compridas.
   Lilith ri-se.
   -És ridícula, humana!
   -Fala a princesa da Luxúria.
   -E achas que isso para mim é um insulto? - a sua cara está perto da minha agora.
   -E achas que me metes medo, Lilith?
   Ela ri-se de novo e recua.
   -O que é que fazem aqui?
   -É assim que tratas os teus salvadores? - pergunta o que tem a sombra com uma cauda comprida, cornos curvados para trás e as habituais asas. Haziel. Orgulho.
   -Salvadores? - a ideia quase me faz rir - Prolongaram a minha vida mais uns dias mas mal podem esperar para que acabe.
   -Tiraríamos a tua alma agora sem qualquer problema. Mas não podemos. - é o mais baixo de todos e as asas parecem consumi-lo. Zuriel. Gula.
   -Sabes o trabalho que nos dás? - pergunta aquele que eu tenho a certeza que é Quinlan. Preguiça. Os seus cornos são curtos e finos e as asas grandes.
   -A vocês penso que nenhum. Só o Ethan é que não pára desde que isto tudo começou.
   Lilith solta uma gargalhada.
   -Já me tinha esquecido deste pequeno pormenor! - comenta - Parece que o anjinho não conseguiu tirar os olhos do diabo.
   A gargalhada desvanece-se e com ela os Príncipes do Inferno.
   O pior é que Lilith tem razão. Desde o beijo que é como se fosse um feitiço. Como um diabo a sussurrar ao anjo que se apaixone por ele.
   Como um predador atrai a sua presa.
  
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Oii!
Deixem comentários para eu saber o que estão a achar, se estão a gostar e isso tudo!
  

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