Um

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Ele simplesmente era assim, fazia tudo por vontade própria, não tinha medo de viver a vida, mesmo que isso arrancasse a sua própria vida, bem, no final, arrancou.

Ele simplesmente era assim, porque ele tinha de ser, porque para ele não havia outra opção.

Ele era tão "assim", que decidiu ser cremado, estava lá no testamento, quem faz um testamento aos 19 anos? Malik fez um.

Já não bastasse a perca, ele achava algo normal demais ser enterrado, e ele não alguém comum, ele fazia tudo de um jeito único, então decidiu ser cremado, em partes essa decisão foi tomada porque ninguém nunca na família dele havia sido cremado, e ele iria se rebelar contra os pais até o ultimo momento.  

Esse "assim" dele, foi mais alem da revolta, pois ele colocou no testamento que quem ficaria com as cinzas dele, seria a melhor amiga dele, vejam só, a melhor amiga dele, era eu. O que eu faria com as cinzas do meu melhor amigo morto? Aquela era o tipo de brincadeira que ele faria, aquele tipo de brincadeira de mal gosto que eu recriminei, odiei, e xinguei desde o inicio, mas quando cheguei para os pais dele e disse:

- Eu não quero, o filho era de vocês, isso não é justo. Malik era um maluco, maluco! – falei sem nem me importar, com o fato de que estava falando do filho falecido deles.

- Querida, esse foi o pedido dele, esta no testamento, se esse era o desejo dele, é assim que vai ser. – falou a Sra. Whittemorr, depois de um longo suspiro.

- E o meu desejo, é que vocês fiquem com as cinzas dele.                                                    

- Nós não podemos, ele vivia dizendo que não fazíamos as vontades dele, uma das últimas conversas dele aqui nesta casa, foi exatamente a respeito disso.

- Uma das últimas brigas que vocês tiveram com ele, você esta querendo dizer? – falou Kalik, que até então não tinha falado nada.

- E isso importa agora Kalik? Não, não importa, seu irmão morreu, o que aconteceu, aconteceu. – falou a Sra. Whittemorr.

- Não importune a sua mãe Kalik. Em fim, o que a minha mulher esta querendo dizer, é que esse era o desejo do Malik, e se esse era o desejo dele, nós não vamos contestar. – falou o Sr. Whittemorr.

- E o meu desejo não conta? Não basta a dor da perda que estou sentindo, vou ter que ficar com esse jarro com tudo o que um dia foi o Malik? Isso é muito macabro. O que eu posso fazer com isso? O que? As cinzas não são para ser jogadas por aí? A onde eu vou jogar? A onde?

- Que tal naquele ferro velho? Ela vivia lá! – falou Kalik.

- Aquele lugar fede a xixi. – falou Sra. Whittemorr.

- Mas era o lugar que ele mais gostava.

- Kalik fique de boca fechada, se você não tem nada que preste para falar. – falou Sr. Whittemorr.

- Quer saber? Eu não sei nem o que estou fazendo aqui mesmo. – falou se levantando.

- A onde você vai Kalik?

- Viver. – falou colocando a jaqueta de couro preta no ombro e saindo porta a fora.

- Perdoe-me, o Kalik nunca foi um menino fácil, mas com a morte do irmão, parece que piorou. – falou o Sr.Whittemorr.

- Sem problemas, eu no momento tenho algo mais importante para resolver, do que ligar para o temperamento do Kalik. – falei, olhando para o jarro na mesa de centro.

- Olha minha querida, nós vamos aproveitar essa saída do Kalik e ir fazer algumas coisas no centro também, mas nós já tomamos a decisão, e as cinzas do Malik ficam com você. – falou o Sr. Whittemorr.

- Mas...

- Você não disse que amava ao Malik? – falou a Sra. Whittemorr, pegando a minha mão. Mas do que você pode imaginar, pensei.

- Sim, Sra. Whittemorr.

- Então atenda a esse pedido dele e fique com as cinzas.

- Eu ainda não sei a onde jogar isso.

- Bem, essa escolha tera que ser com você, você também pode optar por ficar com as cinzas e não jogar em nenhum lugar. Mas pense nos lugares que você já foram juntos, tenho certeza que algum desses lugares será um bom lugar. Se ele confiou isso a você querida, nós temos certeza que foi uma boa decisão, confiamos em você para isso.  – falou a Sra.Whittemorr.

- Vamos querida? – falou Sr. Whittemorr.

- Vamos. – respondeu ela, se levantando.

- Certo. – falei pegando o jarro.

- Até a próxima Endy. – falou ela.

- Até a próxima Sr e Sra.Whittemorr. – falei saindo, e indo em direção ao meu carro.

Deixei o jarro na parte da frente, coloquei minha blusa em volta, e coloquei um cinto para prender.

Dirigi para casa, ainda não acreditando naquela palhaçada, eu teria mesmo que ficar com o jarro, não tinha outro jeito.

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