Prólogo

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Olhei uma vez mais para o espelho, a pequena diadema preta cravada de safiras oscilava entre o ondulado do meu cabelo azulado meticulosamente arrumado. Suspirei pela trigésima vez, no andar de baixo todo o povo de Goulark esperava para conhecer a próxima rainha que venerariam sem dó nem piedade. O nervosismo não tinha qualquer razão plausível, de uma forma ou outra teriam de "gostar" de mim, embora preferisse que o fizessem porque o sentiam e não porque foram compelidos a tal.

- Cassandra Blake!

Uma bola de fogo atravessou o espelho passando rente à minha orelha esquerda, abrindo um buraco tanto na moldura do espelho como na parede tingida de azul que o segurava.

- Diana Locker. - Retribuí.

- Porque te dás a tanto trabalho? Deves ser a primeira que conheço que o faz.

- Porque dou importância ao livre arbítrio. - Argumentei. - Podes arranjá-lo se faz favor? - Apontei para o espelho com um ar insatisfeita.

- Se te faz diferença. - Rodou três dedos voltando a juntar tanto a pedra da parede como os vidros.

- Como se tu não gostasses de te exibir. - Sorri mostrando os dentes.

Conhecia a Diana desde o dia em que nascera, pertencia ao clã da minha mãe e vivia no palácio juntamente com muitos outros.

- Está na hora.

Respirei uma última vez e desci a escadaria o mais graciosamente que consegui, fator igualmente inato por muito que me esforçasse para o contrariar por vezes, permitindo ao vestido preto justo reluzir com a luz do luar e deslizar a sua grande cauda marcando a passagem. Alinhei junto aos meus pais e esperei que me chamassem.

- Sir Connor Blake e Lady Andrew Bishop.

O meu pai era majestoso na forma de andar e sedutor na forma de falar pelo que todos o adoravam, nunca o uso de forças sobrenaturais tinha sido precisas para manipular nenhum súbdito e o brilho da minha mãe refletia mil estrelas fazendo qualquer um esquecer o mundo em redor. Características essas, ideais para quem lidera. Não posso dizer que as sombras não me tenham abençoado, a minha beleza prendia qualquer um, homem ou mulher, sobrenatural ou humano, novo ou velho e a minha graciosidade levava o mundo a beijar a calçada que eu pisasse mas liderar implicava bastante mais.

- Lady Cassandra Blake.

Avancei para o varandim, Goulark não era uma terra pequena mas os habitantes cabiam nos grandes jardins do palácio real parecendo animais encurralados prontos para a matança. Sorri para delírio de todos os que me olhavam.

A fugacidade do momento atravessou-me o peito, desviei imediatamente o olhar para o meu pai e ambos corremos para a torre da zona norte deixando a minha mãe encarregue de entreter o povo.

- O ar mudou e as nuvens estão vermelhas. - Comentei em alvoroço.

- Ela conseguiu sair de Merwin. - Deduziu Connor.

Como se de confirmação precisássemos Dimitri Mon, um dos homens destacados para guardar os prisioneiros de Merwin, apareceu diante nós, com uma estaca de madeira enterrada no ombro esquerdo e o corpo ensanguentado conseguindo, apenas, murmurar algumas palavras antes de desfalecer.

- Ela chegou ao palácio. - As palavras da minha mãe enregelaram-me. - Sabem o que têm de fazer.

Naquele momento, cruzando o olhar com o meu pai, soube. Teria de fugir.

A Prisioneira LivreOnde histórias criam vida. Descubra agora