18 - Feitiço

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A Afrodite não estava particularmente contente nem satisfeita com o que íamos fazer por isso, em sinal de protesto, recusou-se a abrir o armário outra vez. Este era um dos motivos que me faziam detestar trabalhar em equipa, estar à mercê das vontades inóspitas dos outros era agoniante.

Uma e outra vez tentamos explicar-lhe que não havia outra solução, garantindo-lhe que ninguém se magoaria, pelo menos não mais que o necessário, e que se não concordava com aquilo nenhuma de nós a iria forçar a participar. O problema é que nenhuma abordagem parecia resultar, a Afrodite estava determinada em manter a sua posição.

Andei de um lado para o outro à sua frente ponderando se tomava ou não alguma medida radical, que certamente a chatearia ou pior. A Diana percebeu imediatamente a ideia com que me debatia e optou por a verbalizar antes que me apressasse a mostrar-lhe.

- Não queres apanhar o assassino dos teus pais, do teu irmão, do Zack, da Brianna?

A Diana enfatizou cada nome de modo a tocar nas feridas mais antigas, a cor desapareceu das faces da Afrodite e sem dizer uma palavra levantou-se do cadeirão onde estava sentada e fez o obséquio de abrir a porta. Evidentemente magoada apontou para o armário deixando no ar a expressão "Satisfeitas?" e desapareceu.

Na quarta prateleira a contar do fundo, no meio de dois livros, estava uma adaga com o punho em ouro em forma de cruz, de lâmina curta e afiada forjada a titânio com a gravação "sanctus" permitindo distingui-la de uma falsificação barata. No início do século passado eram procuradas pelo seu poder tanto por humanos como por seres sobrenaturais.

- Preparada para fazer isto? - Perguntei fechando o armário.

- Preparada para cavar? - Formulou rindo-se atirando-me uma pá de jardinagem que a Brianna guardava no quintal.

A ideia não me deixara propriamente entusiasmada, apanhei a pá no ar e dei-lhe um encosto com a anca.

- Que remédio! - Respondi passando por ela.

Nenhuma de nós sabia ao certo onde se encontrava a sepultura de Marie Bishop ou a de qualquer outra das famílias fundadoras. Pelas minhas contas, estaria na parte mais antiga do cemitério numa sepultura familiar com pompa e circunstância devido à importância que aquelas famílias tiveram em toda a criação e desenvolvimento de Emor.

Para uma cidadezinha com aquela dimensão e número de habitantes tinha um cemitério bastante composto e completo. Devo ter lido duas dezenas de nomes antes de entrar na parte rica e descobrir o mausoléu da família Bishop. A fechadura, enferrujada pelo tempo, não ofereceu qualquer resistência quando a empurrei. Apenas alguns raios de sol entravam pela junta das grandes pedras e pelo vidro fosco arredondado no fundo, o pó acumulado por décadas fazia-se sentir no ar assim como o cheiro a decomposição e humidade da madeira.

- Pelo menos não é preciso cavar. - Disse pousando a pá.

Quatro gavetões, dois de cada lado, ocupavam o lugar, todos eles em madeira trabalhada escurecida pelo tempo. Os nomes, escritos a prata, de quem se encontrava em cada um permitiam identificá-los. No segundo do lado esquerdo podia ler-se "Marie Bishop 1850-1900". Peguei no caixão pelas asas de prata laterais e puxei-o da gaveta para o conseguir abrir. Como se estivesse a abrir um baú empurrei para cima a parte superior. Nada, num um estalido por parte da madeira.

- Admirava-me se não estivesse selado. - Constatou a Diana.

- Bruxas traiçoeiras! - Resmunguei sentando-me em cima dele.

- Se está selado é porque é importante. Caso contrário não estaria. – Atalhou a Diana enquanto ordenou que me levantasse.

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