7- E agora nós?

35.8K 3.6K 216
                                    

Alex não disse nada em resposta a minha revelação bombástica, apenas pegou minha bolsa e disse que me esperaria no carro. Tive que esperar mais um pouco até que as enfermeiras me livrassem daquele soro, eu pudesse pegar a receita médica e assinar minha alta. Um vazio enorme instalou-se dentro do meu peito, mas não havia muito que pudesse ser feito para remediar aquela situação. Não poderia culpar o acaso, nem mesmo a bebedeira daquela noite, nem ele, nem ninguém. Qualquer ser humano em seu perfeito estado mental me chamaria de louca, eu mesma pensava isso, não seria a primeira vez. Assinei a papelada em silêncio e aguentei os olhares recriminatórios das enfermeiras, provavelmente por já saberem que eu carregava no ventre o bebê de um dos homens mais deliciosos que elas já viram na vida.

- Obrigada. - Murmurei quando ele estacionou o carro na frente do prédio de minha mãe.

- Você não tem mais nada a dizer? - Ele falou com a voz meio presa na garganta.

- Acho que não.

- Incrível! - Alex deu uma porrada no volante com tanta força que me assustou. - Você pretendia me contar, Ana?

Fiquei em silêncio.

- Puta que pariu!

Abri a porta e deixei o carro. Nunca na vida Alex me chamou pelo nome, nunca antes, em nenhum momento de nossa amizade. Eu tinha ido longe demais e tinha convicção disso. Era a consequência da minha escolha, não de uma escolha dele. Estávamos quebrados, arrasados, aquilo mudava tudo. Destruí tudo de melhor que tínhamos, o melhor que eu tinha e não havia nenhuma ligação com o fato dele ser um deus, e além disso ser um deus do sexo. Eu sabia que ele era cuidadoso, sabia que era rígido, conhecia perfeitamente seus mecanismos e entendia como Alex funcionava. Ele nunca tinha sido descuidado, nunca tinha errado a mão. Era o tipo de pessoa que conseguia levar a vida dentro de um esquema que funcionava perfeitamente, com prazos, metas e planos que se concretizavam dentro do planejamento. Meu amigo era um homem bem sucedido em todas as áreas da vida, eu sabia reconhecer uma pessoa inteligente quando via. Não poderia dizer o mesmo a meu respeito. Eu era uma confusão ambulante, desregrada e indisciplinada, impulsiva e rebelde. Minha vida era movida pelos meus sentimentos e nunca fui adepta a seguir um programa de 60 dias para mudar minha vida. Eu era apaixonada pelo acaso, pelas surpresas e por tudo que estivesse fora do script.

- A conversa ainda não acabou. - Ele segurou meu braço antes que eu conseguisse tocar o interfone do prédio em que minha mãe morava. - Você não vai simplesmente me deixar de fora, Ana.

- Primeiro... - Falei com a voz monótona. - Não me chama de Ana. Segundo, solta o meu braço.

Observei pelo canto do olho quando o braço dele caiu ao lado do corpo. Respirei fundo algumas vezes tentando criar coragem para me virar e encará-lo, mas não conseguia fazer isso, a culpa me consumia com muita força e eu já sabia o que encontraria no olhar dele: Mágoa, frustração, decepção, tristeza. Não queria aquele olhar registrado na minha memória agora e nunca. Não queria ter magoado o Alex, mas magoei. Não queria tê-lo colocado naquela situação constrangedora e improvável, mas fiz.

- Me ajuda, Kika. - Ele pediu baixinho. - Me diz o que fazer. Você sempre sabe o que fazer. Como eu te alcanço? Sozinho eu não consigo, você sabe que sou lerdo. Você é a espertinha aqui e tem que me dizer o que fazer.

As palavras amorosas dele me quebraram por dentro. Eu tinha feito a maior merda das nossas vidas, e ele estava parado atrás de mim cheio de compreensão. Nada seria como antes, será que Alex não tinha entendido isso ainda? Houve uma mudança permanente no planejamento e nada que fizéssemos ou disséssemos mudaria aquela realidade. Num movimento brusco me joguei nos braços dele, obrigando-o a me abraçar de volta, mesmo que ele tivesse retribuído prontamente. Ainda não queria olhar nos olhos dele, mas receber um abraço cheio de afeto tinha aumentado a esperança de que ele poderia me perdoar em algum momento.

- Tenho que falar com minha mãe que estou bem antes de ir para casa.

- Vai ficar sozinha naquele apartamento? - Ele ainda me segurava nos braços. - Por que não dorme aqui?

- Dona Ursula vai fazer mil perguntas sobre a consulta médica, vai querer ver os exames que o médico pediu e o que ele prescreveu de medicações para mim. - Meu ouvido estava colado no peito de Alex e as batidas fortes e rápidas do coração dele estavam agitando ainda mais meu estado de espírito. - Não quero enfrentar isso agora.

- Você não quer enfrentar nada pelo visto.

Ignorei a alfinetada sofrida e sorri amarelo antes de virar novamente de costas para Alex e apertar o interfone.

- Acho melhor você não vir comigo. - Sentenciei.

- Por que?

- Você não sabe mentir.

Alex deu um passo para trás e cruzou os braços em frente ao peito.

- Vou esperar aqui. - Avisou. - Se vai pra casa, eu te levo.

Não adiantaria dizer que poderia ir sozinha, pois ele ignoraria. Tinha convicção que a notícia recebida daquele jeito no hospital não foi bem recebida por ele. Precisaria de uma estratégia para lidar com Alex, mas precisava me livrar das perguntas de Dona Ursula primeiro. Minha mãe atendeu o interfone e abriu o portão para mim, em pouco tempo estava na porta dela explicando que tinha passado mal por causa de desidratação, que precisaria tomar alguns suplementos alimentares e regular melhor a rotina de exercícios.

- Eu te aviso há anos que precisa beber mais água! - Ela ralhou.

- Sim, agora vou precisar colocar este compromisso na agenda de verdade. - Fiz gracinha enquanto verificava se tinha esquecido alguma coisa casa dela.

- Não vai dormir aqui?

- Alex está lá embaixo. - Pontuei enquanto a abraçava. - Ele vai me levar para casa.

- Ele não quis subir? - Minha mãe sabia fazer as perguntas incômodas nas horas mais inconvenientes.

- Sabe como é... Vocês ficam conversando e a hora passa.

- Ele é um excelente rapaz, Kika. - Ela me levou até a porta. - Quando é que vão assumir esse namoro de uma vez?

Sorri para ela e sacudi a cabeça.

- Esqueça isso, mamãe.



O bebê do meu melhor amigo (Livro 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora