O céu manchado de rosa e roxo dizia a Camila que ela estava encrencada.
Durante anos, Camila havia organizado sua vida cuidadosamente em função do encontro com Sofia ao pôr do sol, e não havia margem para erros. Ela sabia que, naquela noite, tinha até exatamente às 18h51, o momento preciso do crepúsculo civil, quando o centro do disco solar descia seis graus abaixo da linha do horizonte e o playground secreto ficaria às escuras.
Isso lhe dava 21 minutos para correr no seu velho Rambler para pegar os filés de peixe-espada na Lobster Company e depois zarpar para o outro lado da cidade para pegar ingredientes para a salada e sobremesa. Seria por pouco.
Ela pensava em Lauren em pé no alto da colina e não conseguiu acreditar na sua presença de espírito. Ela havia convidado a moça para jantar na sua casa, e os olhos verdes dela se iluminaram quando ela disse sim. Shawn ficaria espantado. Será que ele já esteve com uma mulher como aquela, tão cheia de brilho e tão orgulhosa?
Apenas falar com ela fez com que Camila se sentisse mais viva.
"Relaxe, você só passou quinze minutos com ela", disse a si mesma. Ela era uma mulher pragmática em todos os aspectos, incluindo o seu coração.
Ela tinha de ser. Em sua vida governada pelo sol poente, não havia espaço para se empolgar com as coisas.
Realmente, fazia quatro anos desde que ela havia se envolvido com outra pessoa. Becca Jones fora sua última namorada. Elas haviam se conhecido no Pub, na Noite da Cerveja. Ela era uma professora primária em Peabody, divertida, insinuante e mais velha. Ela definitivamente havia lhe ensinado uma coisa ou duas durante o verão que passaram juntas, correndo por entre os esguichadores do jardim, nadando nuas na represa, e aconchegando-se nos braços uma da outra na casa da floresta. Mas, quando o outono chegou, Becca queria viajar nos fins de semana para ver as folhas mudarem de cor, ou usar os bônus do seu programa de milhagem, ir a Paris e visitar o cemitério Père-Lachaise, onde estava enterrado Jim Morrison.
Camila nunca lhe contou o segredo que guardava a respeito de Sofia, e logo a sua necessidade de estar no cemitério todas as noites ao pôr do sol havia se tornado ridícula para ela. Quando ela esgotara suas desculpas e ficara exausta pela insistência irritante dela, ela tentou relaxar um pouco a regra do pôr do sol. Não aconteceu nada de mal, e então ela tentou empurrar o limite um pouco mais.
Uma noite, ela chegou ao playground quando já havia escurecido, e percebeu que Sofia havia começado ficar mais etérea, mais insubstancial. No início, a mudança era quase imperceptível, mas logo ficou assustadoramente óbvio que ela estava perdendo seu dom.
A dureza dos fatos era que, quanto mais ela vivesse em um dos mundos, menos ela conseguia ver o outro.
Então ela traçou o limite, voltou aos seus hábitos antigos, e recusava—se a discutir o assunto com Becca. Quando o ano novo chegou ela terminou namoro. Camila encontrou um bilhete colado no volante carro de manutenção do cemitério: Estou farta desse cemitério — ela tinha escrito — e terminei minha relação com os mortos-vivos. É uma que não consegui libertar você.
Doeu vê-la partir, mas a escolha entre Sofia e Becca era óbvia. Ela não enxergara possibilidade de um acordo. Depois de Becca, ela se manteu trabalhando de maneira cada vez mais dura e evitando qualquer de contato mais íntimo, especialmente do tipo feminino. Ela mantinha a aparência alegre e descuidada, e sempre tinha uma piada ou uma história na ponta da língua. Mas, quando o assunto era relacionamentos verdadeiros, ela havia se tornado mestre da esquiva. Ela sabotava todas as oportunidades e, todas as noites, ela se lembrava da razão pela qual fazia isso.
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Butterfly
Fanfiction― Confie em seu coração se os mares explodirem em chamas... ―...e viva pelo amor ― Lauren continuou -, mesmo que as estrelas se movam para atrás.