Acordo pouco antes do amanhecer. Tenho de ser rápida antes que Catarina e as meninas despertem. Então, ainda de pijama, desço na ponta dos pés até a biblioteca. Azul já está lá me esperando. Para nosso alívio, encontramos o livro mágico ainda na prateleira, escondido no meio dos outros volumes.
Azul se senta na prateleira de mogno à altura dos meus olhos, no espaço entre dois livros inclinados um no outro.
— Você acha que precisamos chamar Rumpel pra nos ajudar? — pergunto a ela enquanto folheio brevemente o livro.
— Não — Azul responde. — Não agora. Se queremos convencer os Caçadores, temos que causar uma boa impressão primeiro. Eles não vão confiar em nós com Rumpelstilzchen por perto.
Concordo com a cabeça. Procuro a página onde vi a gravura do corvo outro dia.
— Azul, preciso te contar uma coisa. — Ergo a ilustração para que ela veja. — Tenho recebido visitas desse corvo.
— E você não pensou em me contar? — Ela ergue uma sobrancelha azulada.
— Não imaginei que ele fosse da Terra Encantada. Ele apareceu algumas vezes desde que encontrei o colar, mas só tive a certeza de que ele é um encantado quando falou comigo hoje de madrugada.
Azul se aproxima do livro.
— Não me parece coincidência ele estar na página ao lado da ilustração de Catarina. Deixe-me ver... — Ela passa os olhos pelo texto que se move pelas folhas, concentrada. — Não consigo entender direito essa língua. É uma língua feérica, mas muito antiga. Apenas consigo ler umas palavras soltas. Transformação. Rainha.
— O que você acha que significa, Azul?
— Bem que eu gostaria de saber — A fada encolhe os ombros. — Se ele tiver alguma relação com Catarina, meu palpite é que ele seja um ajudante. E deve estar nos espionando, com certeza.
Pensar na janela escancarada hoje mais cedo me causa um arrepio na nuca. Se o palpite de Azul for verdade, ele esteve me vigiando todo esse tempo?
Se bem que... Ah meu Deus.
Subitamente me lembro daquela vez em que espiei a conversa de Catarina atrás destas portas, discutindo acaloradamente com uma voz masculina. Uma voz calma, e macia. Como a voz do corvo. Conto isso a Azul.
— Então ele deve ser mesmo um ajudante. Agora quem será ele... — Azul faz uma cara conspiratória.
— Tem uma coisa que não entendo. Ele disse ser um mensageiro, e me disse pra derrotar Catarina.
— Não seja tão crédula, Sophia. Nós feéricos adoramos nos transformar em animais, e alguns de nós adoram fazer jogos com os sem-magia. Precisamos descobrir quem ele é antes que ele nos traga problemas.
— E se ele for... — Um pensamento sombrio surge. Não termino a frase, mas a fada entende minha suspeita.
— Rumpelstilzchen? — ela pergunta. — Também pensei o mesmo. Vamos torcer para que não seja ele. Caso contrário, você está bem encrencada.
Sinto meu poder se encolher dentro de mim, enquanto peso a possibilidade. Desejo com todas as forças que Rumpel não seja realmente o corvo, ou terei caminhado com minhas próprias pernas para dentro de uma armadilha.
Azul bate suas asas e se aproxima, pousando uma mão minúscula no meu ombro.
— Sophia, olhe pra mim. Vamos levar nosso plano adiante primeiro. Pensaremos nisso assim que falarmos com os Caçadores. Está bem?
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O destino de Cinderela
FantasyANTIGO "COMO SER UMA BORRALHEIRA". NOVOS CAPÍTULOS TODA SEXTA-FEIRA, 18H. Falta apenas um ano para que Sophia se veja livre de sua tia Catarina, uma mulher capaz de fazer a garota passar pelos piores sufocos só pelo prazer de humilhá-la. Convivendo...