IV - Falta Condescendência

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Liam acaba de cometer um grave erro e que para ele será de más consequências.

Quem pede e quer ser servido, deve medir bem o tempo, o lugar e as circunstâncias, e Liam não soube conhecer que o tempo, o lugar e as circunstâncias lhe eram completamente desfavoráveis. Vai exigir que Harry o ajude a forjar cruel cilada contra uma jovem de dezessete anos, cujo único delito é ter sabido amar o ingrato com exagerado extremo.

Ora, para conseguir semelhante torpeza, preciso seria que Liam aproveitasse um momento de loucura, um desses instantes de capricho e de delírio em que Harry pensasse que ferir a fibra mais sensível e vibrante do coração da mulher, a fibra do amor, não é um crime, não é pelo menos louca e repreensível leviandade; é apenas perdoável e interessante divertimento de rapazes; e nessa hora não podia Harry raciocinar tão indignamente.

Ainda quando não houvesse nele muita generosidade, estava para desarmá-lo o poder indizível da inocência, o poderoso magnetismo de vinte olhos belos como o planeta do dia, a influência cativadora da formosura em botão, de beleza virgem ainda, de um anjo, enfim, porque é símbolo de um anjo a virgindade de uma jovem bela.

Mas Liam esqueceu tudo, e mal, sem dúvida, terá de sair de seu empenho com tantas contrariedades; o tempo não lhe é propício, porque Harry começa a sentir todos os sintomas de apetite devorador. Ora, um rapaz, e principalmente um estudante com fome, se aborrece de tudo, principalmente do que lhe cheira a aborrecimento. O lugar não menos lhe era desfavorável, porque, diante de um ranchinho de belas moças, quem poderá tramar contra o sossego delas?

Então Harry, dos tais que por semelhante povo são como formiga por açúcar, macaco por banana, criança por campainha... e ele tem razão! Por último, as circunstâncias também contrariavam Liam, pois a Sra. D. Violante havia tido o poder de esgotar toda a elástica paciência do pobre estudante, que não acharia nem mais uma só dose homeopática desse tão necessário confortativo para despender com o novo macista.

Liam tomou, pois, o braço de Harry e ambos saíram da sala: este com vivos sinais de impaciência, e o primeiro com ares de quem ia tratar importante negócio.

A inocente D. Sophia os acompanhou com os olhos e riu-se brandamente, encontrando os de Liam, que teve ainda bastante audácia para fingir um sorriso de gratidão.

Eles se dirigiram ao gabinete do lado direito da sala, o qual fora destinado para os homens; e entrando, fechou Liam a porta sobre si, para se achar em toda a liberdade. Enfim, estavam sós. Voltados um para o outro, guardaram alguns momentos de silêncio. Foi Harry quem teve de rompê-lo.

- Então, ficamos a jogar o siso?

- Espero a tua resposta – Disse Liam.

- Ainda me não perguntaste nada – Respondeu o outro.

- A minha carta?

- Eu a li, sim... tive a paciência de lê-la toda.

- E então?

- Então o quê, homem?

- A resposta?

- Aquilo não tem resposta.

- Ora, deixa-te disso; vamos caçoar com a moça.

- Tu estás doido, Liam?

- Por tua culpa, Harry.

- Pois então cuidas que o amor de uma senhora deve ser peteca com que se divirtam dois estudantes?

- Quem é que te fala em peteca?... Pelo contrário, o que eu quero é desgrudar-me do fatal contrabando.

- Não; a pesar teu, deves respeitar e cultivar nobre sentimento que te liga a D. Sophia. Que se diria do teu procedimento, se depois de trazeres uma moça toda cheia de amor e fé na tua constância, por espaço de três meses, a desprezasses sem a menor aparência de razão, sem a mais pequena desculpa?

O moreninho - l.sOnde histórias criam vida. Descubra agora