Capítulo 30 - Rock

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Abby segue pelo corredor em direção ao banheiro, independente de nunca antes ter estado no apartamento. Pela forma como sua caminhada é constante e os ombros estão erguidos, tenho a impressão de que ela está se preparando para uma batalha e não em busca de um kit de primeiros-socorros.

— Abby — chamo ainda parado na porta do apartamento.

Ela para no pequeno corredor e me encara por sobre o ombro. Um vinco surge em sua testa quando ela olha para o ferimento em minha sobrancelha esquerda. Eu tenho vontade de dizer que não está doendo, mas ao julgar pela expressão em seu rosto, sei que ela não acreditaria.

— Eu já tive ferimentos bem mais graves que isso — aponto para o machucado como se não passasse de um arranhão. Ela cruza os braços, insatisfeita com o comentário. — O kit de primeiros-socorros está no armário da cozinha.

— Na cozinha?

Confusa, ela olha para a cozinha integrada ao cômodo em que estamos. O apartamento não é muito grande, além das duas suítes de Chuck e Brad, o outro ambiente é usado como sala de jantar, sala de estar e salão de festas em algumas ocasiões. Um canto da sala foi transformado em uma cozinha integrada pelo proprietário, que tem um fascínio inexplicável por porcelanato vermelho e cobriu todo o piso do apartamento com azulejos cor de tomate.

— Com Chuck e Brad morando juntos, qualquer coisa que aconteça na cozinha é perigosa. Eles seriam capazes de iniciar um incêndio cortando legumes.

— Isso é impossível — ela diz com um fantasma de sorriso nos lábios.

— Só porque você nunca viu nenhum dos dois tentando cozinhar. Acredite em mim quando eu falo que eles conseguiriam.

Rindo, Abby muda o curso e segue na direção da cozinha compacta. Ao passar por mim, ainda parado, seus olhos vagam na direção do ferimento e ela acelera o passo. Observo-a abrir cada um dos armários suspensos, pensando que eu poderia muito bem apanhar o maldito kit, mas ver a preocupação estampada em seu rosto e saber que é direcionada a mim me faz pensar duas vezes antes de correr até ela. Apesar de bem egoísta, me faz muito bem ter a consciência de que ela só está fazendo isso pelo meu bem-estar. Quase me faz acreditar que Abby sente muito mais por mim do que deixa transparecer.

O que é tolice minha, porque ela deixou óbvio desde o início que não me vê como nada além do seu colega de quarto. Talvez eu seja algo próximo de um amigo agora, porém não mais.

Eu me forço a sentar no sofá de couro no centro da sala e aguardar pacientemente por Abby. Enquanto ela fica na ponta dos pés em busca da caixa de plástico eu me pego rindo sem nenhum motivo aparente. O modo como ela estica os braços e mesmo assim só consegue tocar com a ponta dos dedos no estojo na prateleira mais alta é adorável.

— Você precisa de ajuda? — Pergunto decidido a não sair do lugar mesmo que ela pedisse. Eu me divertiria vendo o que Abby poderia aprontar para ficar alguns centímetros mais alta. E também já a conheço o suficiente para saber que ela não aceitaria ajuda. Não por causa de algo relacionado a sua altura. Apesar de baixa, ela é bastante teimosa.

— Nem pense em sair daí.

Para se certificar que ainda estou distante, olha por cima do ombro para mim. Ao me ver sentado ela parece satisfeita e volta a se concentrar no objeto na prateleira. Abby pula algumas vezes até finalmente alcançar o kit e volta sorrindo para a sala.

— Estou impressionado com a sua habilidade. Você já pensou em fazer parte da equipe nacional de saltos?

— Claro — ela sorri com uma confiança fingida. — Mas eu deixaria meus companheiros de equipe desconfortáveis com o meu nível de habilidade e técnica, por isso acho melhor me afastar do esporte.

Um olhar para o amorOnde histórias criam vida. Descubra agora