III A nova canção do bardo

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Nas colinas gramadas à Oeste da vila estavam os moinhos de vento. Dois deles. E para além dos campos de plantação, próximo ao caudaloso e largo rio Pontife, que limitava a vila no lado Leste, havia outro: um moinho de água.

Os grãos já estavam sendo moídos e quando terminasse a moagem, seriam assados os pães no grande forno central, onde sob a supervisão da quituteira D. Gama as mulheres não paravam de sair e entrar a todo momento, sobrecarregadas com assadeiras e panelas. O cheiro bom corria longe e os meninos e meninas da vila espiavam esperançosos para dentro toda a vez que a porta se abria.

Grupos de caça eram enviados à Grande Floresta para encontrarem grandes e roliços animais, a cevada da colha anterior também já tinha se virado em boa cerveja, e desse modo, ao fim da estação, Gia seria celebrada com muita fartura.

Nesse meio tempo as árvores receberam enfeites, tochas foram dispostas ao longo das ruas e a base de uma grande fogueira triangular foi erguida. Abiel acompanhava os preparativos com muito interesse, e mesmo que o mestre não estivesse brincando quando disse que estavam cheios de serviço, eles também tiraram um dia para se juntar à caçada.

A trilha larga serpenteava por entre arvores altas e nada espaçadas, e no chão se desenhavam os trechos irregulares da luz do sol tentando atravessar as densas folhagens nas copas. De quando em quando, pequenos animais pisavam sobre as folhas secas e o pio distante dos pássaros matutinos quebrava o silêncio.

O grupo coordenado pelo próprio Monod caminhava em pares. No começo da fila, o ferreiro e seu cão de caça, Arguto, abriam passagem para os demais. O grande cão preto e branco seguia animado, entrando e saindo da mata ao redor. Velho companheiro nas caçadas do ferreiro Arguto, assim como o dono, conhecia cada centímetro do caminho.

— Nós estamos chegando perto da montanha de Trimble agora, Arguto, pare de latir ou os gnomos poderão te ouvir.

Com obediência o animal se calou e passou a caminhar ao seu lado.

— Com medo, Saga?

Sem parar de cortar os ramos e galhos com um grande facão, o ferreiro respondeu:

— Claro que não, Vianna, mas você sabe o que os gnomos fizeram com os homens no passado.

Matias Vianna gargalhou. Era um jovem de cabelos escuros encaracolados e sorriso frouxo.

— Isso aí é história para criança dormir sem manha — disse.

— De qualquer jeito, eu não vou abusar.

— Eu concordo — murmurou Artur Landau.

Caminhava ao lado do jovem que batia abaixo do seu cotovelo.

— O que você disse aí em cima? — Matias levou as mãos em concha até a boca e em seguida até a orelha. — Eu não entendi, pode repetir?

— Não dê trela para o bobo da corte, Artur — Monod disse detendo a caminhada e se virando para eles. — Todos ouvimos o que você disse.

— Obrigado — o grandalhão resmungou.

— Chegamos às ruínas da cidade de Khalo — o ferreiro falou apontando com o facão para trás, e por uma brecha recém aberta entre as ramas uma coluna tombada podia ser vista. — Nós podemos parar um pouco e almoçar antes de começar.

Pelo menos duas Eras de musgo e deterioração estavam instaladas nas pedras. Restos de uma geração passada, quando a capital do Império foi construída ali. Muito se perdera, mas os resquícios do esplendor de outrora ficaram em seu tamanho impressionante e em registros antigos.

Os deuses de Anwar, A lenda de Abiel (EM REVISÃO - PAUSADO)Onde histórias criam vida. Descubra agora