Será?

35 10 5
                                    

Quando estou prestes a ir com ele, minhas pernas ficam bambas e não  consigo andar.
- Vinícius, você pode me ajudar a andar? - digo e ele me olha preocupado.
- Como assim? O que seu pai fez com você além de tudo que ele já fez? - diz com um ar de raiva, e respondo:
- Eu acabei quebrando uma das regras que ele impôs sobre mim ontem, me derrubou no chão com muita força, e machuquei meu pé.
- FILHO DA PUTA! - diz ele com muita raiva.
- Calma, só pedi ajuda - digo.
- Calma? Olha o que ele fez com você. Está defendendo ele? Você é a melhor pessoa do mundo para depois de tudo, ainda ter gratidão por ele - diz.
Não respondo, então ele me pega no colo e dou um grito de felicidade.
- Vinícius, seu idiota! Eu pedi ajuda, não para me carregar - digo dando risada.
Andando, ele me responde:
- Eu sou um cavaleiro Franciny, se acostume.
Vinícius me leva até o carro que estava em frente ao apartamento onde moro, e fico espantada.
- Você tem um carro? - digo e ele abre a porta me colocando sobre o banco.
- Tenho, por quê? - pergunta curioso enquanto coloco o cinto.
- Nada. Só estou dizendo que só um adolescente muito rico tem um carro. Quem diria. - digo e ele se senta no banco do motorista, ligando o carro.
- Dinheiro não tem muita importância pra mim, só usei pra comprar esse carro mesmo. Sempre quis ter um carro. Os seguranças do meu pai me cansam. O único segurança que é meu amigo é o Iago. Ele é realmente uma pessoa maravilhosa...
Sorrio pra ele, e saímos. Andando de carro, digo:
- Vamos perder aula.
- Já pedi para o Iago avisar à diretora que não iremos hoje - diz ele.
- Aonde vamos? - pergunto.
- Vou te levar a um médico, ele vai dar um jeito no seu machucado no canto do olho, e ver se você tem hematomas - diz ele, e me assusto.

- O QUÊ? - digo em pânico.
- Calma, ele não vai te machucar e muito menos te julgar. Não precisa ficar assim - diz ele, calmo.
- Eu tenho mesmo que ir? Por favor, entenda meu lado também, foi há poucos dias, estou assustada - digo.
- Eu entendo, mas é para o seu bem. Vai que aquele filho da puta tem alguma doença e passou pra você - diz, aumentando o tom de voz.
- Vini, não o chame assim, ele ainda é meu pai. Por mais triste que seja... - digo, cabisbaixa.
- Eu vou chamar ele assim o quanto quiser, porque é o que ele é - diz ele.
- Outra coisa, me diz que você toma anticoncepcional. A última coisa que espero ouvir é que você está grávida dele.
- Eu tomo sim. Mas, agora chega, vou ter que ir nesse médico? - pergunto irritada.
- Sim, e assunto encerrado. - responde me dando um sermão.
- Como você é mandão! Às vezes seu signo parece de Áries - digo, debochando dele que ri.

Ele para o carro na frente do Hospital Albert Einsten, um dos melhores hospitais de São Paulo.
- Vini, eu não tenho dinheiro para uma consulta particular - digo e ele me olha.
- Eu vou pagar... Não se preocupe - diz pegando minha mão em direção a porta do hospital.
Passando pela entrada, dois homens me encarando, dizem:
- Olha só aquela ali, gostosa pra caralho!
Vinícius escuta, e pega na blusa de um deles.
- VAI PEDIR DESCULPAS PRA ELA?
O homem em pânico, diz:
- Qual é, cara? Me solta!
Vinícius segura com mais força a blusa e digo:
- Vinícius, para. Não precisa disto.
- DESCULPAS À ELA! - exige Vinícius, e o outro homem diz:
- Vai Miguel, pede desculpas pra saírmos daqui!
- DESCULPA, MOÇA - diz o homem e Vinícius o larga, eles saem depressa e com vergonha.
- VINÍCIUS! - grito, constrangida.

- Sem comentários sobre o ocorrido, Franciny - diz ele, me puxando para a sala de espera.
Sinto um cheiro maravilhoso de vanila, adoro vanila. Fico maravilhada com o cheiro, mas Vinícius me puxa para o balcão da recepção. A recepcionista muito educada, diz:
- Vinícius, quanto tempo...Tudo bem?
- Oi Lívia, tudo bem sim, e você? A doutora Larissa está atendendo hoje? - diz Vinícius.
- Estou bem, e sim, a doutora Larissa está. Gostaria de consultar com ela? - diz Lívia, sorridente.
- Na verdade não é pra mim, é pra minha amiga, Franciny - diz ele, e comprimento Lívia.
- Oi, prazer, Franciny - digo, tentando ser o mais simpática possível. Não sou boa em socializar.
- O prazer é meu, Franciny! A doutora pode lhe atender agora. São R$ 150,00 reais a consulta. Vou pedir para ela atender você - diz ela, checando os dados no computador.
Me espanto pelo preço, mas Vinícius tira com muita tranquilidade da carteira o dinheiro e paga Lívia. Para ele talvez não fosse uma grande quantia, mas para mim era o bastante para comprar um tênis novo. Afinal, eu estava precisando.
- É só ir até a sala 17, no final do corredor - diz apontando para o corredor à esquerda.
- Obrigada, Lívia! Até mais - diz Vinícius.
- Até mais, e foi um prazer lhe conhecer, Franciny. - diz Lívia, contente.
- O prazer foi meu. - digo toda tímida.
Eu e Vinícius saímos em direção à sala. Enquanto andamos ele me encara, digo:
- Por que está me olhando assim?
- PORQUE VOCÊ É LINDA! Diz ele e fico corada.
Até que chegamos na sala, ao entrar uma moça loira, alta, nos cumprimenta:
- Olá! Eu sou a doutora Larissa, irei atende- lá. E olá, Vinícius, quanto tempo, desde que era um adolescente birrento.
Ele ri e responde:
- Ainda sou um adolescente, mas não sou birrento.
Eu comprimento ela, sentamos e ela me pergunta o que tenho. Fico nervosa, não consigo responder. Olho para Vinícius e ela me diz:
- Não se sente à vontade para falar com o Vinícius presente?
- Não consigo falar sobre isso - digo e Vinícius se levanta, saindo, ele diz:
- Te espero lá fora.

Então sozinhas, ela me pergunta novamente:
- O que você tem?
Não posso evitar as lágrimas que escorrem sobre meu rosto.
- Eu fui abusada sexualmente pelo meu pai - digo com muita dificuldade.
- Não se sinta como se você não fosse nada. Eu sei o que é isso. Eu fui molestada pelo meu namorado quando tinha 14 anos. Você se sente um lixo, mas saiba que um lixo é a pessoa que fez isso com você. Fran, eu estarei aqui para o que você precisar. Posso lhe recomendar uma psicóloga excelente para te ajudar. Alguém está ali fora, certo? Alguém já está trabalhando no seu caso? - pergunta ela.
- Eu... eu ainda não o denunciei - digo com receio.
- Bom Fran, eu não poderia estar te examinando sem uma permissão judicial ou de um médico legista. Mas, entendo o que você está passando. Vou te ajudar de qualquer forma. Agora, Fran, preciso que me conte tudo com detalhes para que depois possamos fazer alguns exames. Te darei seu tempo. Me conte, seu pai usou camisinha? Ou não? Você faz uso de métodos contraceptivos?

-Sim - respondo e ela continua:
- Bom, mesmo assim, você irá fazer um teste de gravidez, por mais que ainda seja cedo para ser realizado, é por precaução. E quero fazer um exame de sangue em você também.
Depois de meia hora conversando, descubro que não estou grávida. Ganho um pequeno curativo no canto do olho e estou bem, fisicamente. Enquanto me arrumo a doutora me diz:
- Olha, por mais difícil que seja se aproximar de um homem agora, não perca o Vinícius de vista, ele é uma ótima pessoa. E Franciny, você precisa denunciar seu pai o mais rápido possível, certo? E a propósito, vou te recomendar a psicóloga.
- Eu farei doutora. Agradeço muito - digo.
Me senti um pouco envergonhada pelo fato de ela perceber que tem uma míni química rolando entre nós, mas não posso corresponder, não agora, e talvez nunca.
- Esse é o número da psicóloga, Gisele de Martina. Ligue para ela assim que tiver um tempo - diz. A doutora me acompanha até a porta, e quando saio Vinícius levanta rapidamente e me pergunta como foi, e a doutora diz:
- Vinícius, posso falar com você por um minuto?
Ele faz que sim com a cabeça e então entram na sala.

A Profundidade Do SilêncioOnde histórias criam vida. Descubra agora