3. Memória de Lila

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Lila Rose

Sinto uma dor forte na cabeça. Estou deitada numa maca e não há nenhuma luz, não vejo nada. Quero levantar, quero muito, mas não sou capaz, é como se cada movimento que eu fizesse eu levasse um soco forte no crânio. Fico deitada e tento lembrar o que aconteceu. Não sei onde estou, não faço ideia do que está acontecendo. Que merda.

Matsso Nyage

Hoje as ruas já estão ficando mais limpas, eu, Mattie e mais alguns moradores estamos tentando deixar tudo mais "organizado".
Os poucos meios de transporte que restaram já estão ativos e isso significa que posso ir para outros lugares, e é isso que farei, Lila está em algum outro lugar e eu vou achá-la.
Ontem à noite, a nossa querida mandante pediu para que nós -cidadões de Laicon- nos reunissemos no centro. Vou ir pra lá e depois parto em viagem atrás da Lila. Arrumei uma mochila surrada com algumas peças de roupas, ferramentas, comida e o que restou do meu dinheiro. Vou andando até o centro e quando chego lá há uma multidão, fico tão feliz com isso, muitos morreram, mas muitos sobreviveram também.
Um certo tempo se passa até que ouço os trompetes tocarem, é um sinal que a mandante está perto, todos olhamos para trás e lá vem ela, em cima de um cavalo azul com a crista prateada que quando bate o sol ilumina a sua face, do seu lado direito vem Tonter, o superior, também em cima de um cavalo só que esse é preto com a crista azul escuro, do lado esquerdo da mandante e do lado direito do superior vem dois soldados armados e com armaduras pratas em cima de um cavalo branco, atrás deles vem os anunciadores andando, sempre muito bem vestidos com as roupas detalhadas em ouro e em suas mãos há trompetes e atrás deles mais dez soldados com a mesma vestimenta dos soldados em cima dos cavalos. O povo vai abrindo caminho para quê eles possam ir até o meio de toda aquela multidão. Quando finalmente chegam, os cavalos param todos juntos e os trompetes também cessam como se tudo fosse cronometrado. Todos nós ficamos parados e quietos esperando o anúncio de Claire, a mandante de Laicon. Ela está com o que parece um microfone que é ligado na cela do cavalo e vai até sua boca, e o som sai bem alto, todos com certeza conseguem ouvir, uma de suas mãos ficam pousadas em sua coxa e a outra na coxa de Tonter.
Queridos moradores de Laicon, eu como mandante de nossa região venho informá-los sobre todas as tristes notícias que surgiram com o último bombardeio vindo de Chimion. Primeiramente devo lhes informar sobre a morte de Rissan, o escolhido herdeiro que iria comandar Laicon daqui a quatro anos. Estamos todos muito abalados e peço que todos vocês venham para nosso lago principal às sete horas onde será feita a despedida do corpo de Rissan.

Um silêncio toma conta ali do centro por um minuto, até que Claire continua sua fala.

Bem, nós decidimos que não haverá uma revanche contra Chimion, porque como esse bombardeio foi uma vingança deles depois de nossos ataques à sua mandante, agora estamos "quites". Ouviram? Não há porque ter uma outra guerra. Vamos ficar em paz.

Sua voz é firme e decidida, todos ainda estão quietos e atentos para o que ela vai dizer. No fundo, todos estamos com medo.

Ficamos sabendo que os Chims invadiram nosso território, não sabemos o porquê, mas seja o que for que eles vieram pegar, nós não vamos ir atrás, não vamos invadir o território deles novamente. Vamos ficar em paz.

Como assim invadiram aqui e nós não vamos fazer nada? Eles não podem pisar na nossa região! Estou furioso. Claire tem que fazer algo.

Sei que seus lares foram destruídos, e já providenciei a construção de novas casas para cada família.

Todos aplaudem e alguns gritam elogios à ela. Ela realmente é uma mandante ótima, Laicon melhorou muito depois que ela assumiu o cargo.
Esse discurso todo está demorando e eu não vejo a hora de pegar o primeiro ônibus que passar e achar Lila, ver seus olhos brilhantes e abraçá-la, sentir vida em meus braços.
Claire passa a vez para Tonter finalizar o comunicado.

Meus queridos, nossa Laicon é forte graças a cada um de vocês. Vocês fazem a nossa região ser a melhor de todas. É tão bom ver vocês fortes e vivos bem aqui na minha frente. Nós prometemos que a vida de vocês vai voltar aos eixos, não se preocupem; agora estamos em paz.

Os trompetes começam a tocar novamente e os cavalos começam a andar, o superior e a mandante mantém uma expressão séria, mas ao mesmo tempo com um pingo de dó, sinto isso. Espero que minha vida volte mesmo aos eixos, quero minha vida normal com Lila do meu lado. Está na hora de ir para a avenida, pegar uma condução e partir para Aico*.

Lila Rose

Quando finalmente consigo me levantar sem quase morrer de tanta dor, ando pelo cômodo que estou e parece uma ala de hospital. Vou até a porta e a abro, parece uma casa, parece não, é uma. Me atrevo a sair e vejo alguém passar.
-Oi! -digo um pouco alto para ser escutada.
-Rose! Você acordou, querida. -ele vem em minha direção.
É um homem alto, já deve ter uns 50 anos e seus olhos verdes claríssimos me hipnotizam, uau. Ele chega perto e me abraça.
-Venha, vou pegar uma roupa pra você. -ele olha pro meu corpo e me sinto constrangida, ele vai entrando no cômodo da onde eu saí e eu o sigo, ele abre um pequeno armário que há lá e tira uma peça de roupa. -Aqui, vai ficar lindo em você, vou lhe dar licença.
Pego o vestido azul e meio sem jeito me visto, me sinto muito bem com ele. Abro a porta e o homem está me esperando lá fora.
-Uau, ficou belíssima Rose! -ele pega em minha mão.
-Obrigada. Ainda não sei seu nome. -falo meio sem jeito, não quero parecer deselegante.
-Oh sim, me desculpe, sou Jason, o superior de Chimion. -ele beija minha mão  e me encara.
-Prazer. Eu sou... Rose, né?
-Isso querida, você é a mandante daqui de Chimion. Você bateu forte a cabeça, não deve estar se lembrando de muita coisa. -ele faz uma cara triste depois de falar.
-Eu sou a mandante daqui! Uau, eu sou uma boa mandante?
-A melhor que já conheci. -ele dá um sorriso apaixonado.
-Somos um casal?
-Sim. Vamos para o nosso quarto, vou te deixar informada de tudo que houve nesses últimos dias e depois você vai tentar descansar, ok?
-Ta, tudo bem.
O sigo pela grande casa e vamos para um quarto enorme; uma linda cama de casal arrumada está no meio e a mobília toda de madeira me deixa apaixonada, estantes com livros, quadros grandes de lugares históricos deixam o lugar tão formal e agradável. Esse é o meu quarto! Ou melhor, meu quarto e do superior, meu marido.

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*Aico: Pequena área de Laicon. Bem longe do local do bombardeio.

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