Capítulo Dois

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— Me ilumine, Senhor… — Beatrice Blanche sussurrava a si mesma, enquanto caminhava cabisbaixa pelas movimentadas ruas de Nova York.

Estava se sentindo perdida. Observando os rostos desconhecidos que passavam por ela, Beatrice se perguntava como eles conseguiam caminhar tão impassíveis quando tinham milhares de problemas a enfrentar.

Filinha de papai.

A frase reverbera em sua mente fazendo-a soltar um suspiro. Ela teve tudo, durante toda sua vida e agora quando os problemas surgiam ela não sabia como agir.

Como diria a seu pai que havia abandonado a faculdade de medicina depois de mais de 5 anos de curso?

Beatrice não fazia ideia. Só tinha certeza que o pai não aceitaria facilmente.

Tinha acabado de tomar uma atitude drástica em sua vida, e não sabia se ficava aliviada ou com a consciência atormentada.
Parou de andar, olhando para o céu como se assim alguma solução literalmente caísse de lá. Só que aquele céu nublado de Nova York, com aparente chuva a caminho, apenas serviu para deixá-la ainda mais deprimida.

Achava a medicina uma das profissões mais belas que existiam. Ajudar alguém, salvar vidas... No começo quando aceitou a proposta praticamente imposta por seu pai, achou que com o tempo se adaptaria, e foi a ideia de salvar vidas que a manteve todos esses anos no curso.

Só que agora Beatrice se sentia sufocada. Curar pessoas não era seu dom. Seu talento era a arte.

Desenhar, pintar... Passar horas com um pincel na mão enquanto deixava sua mão deslizar por uma tela em branco dando vida a ela. Aquela era a satisfação de Beatrice. Queria ter feito Artes Plásticas, mas depois de tanta objeção do pai e de tanto se sentir oprimida por ele, deixou esse sonho de lado. Não culpava-o por tê-la feito seguir aquele caminho. A única responsável era ela, pois se tivesse se mantido firme em sua decisão, não estaria caminhando sem rumo pelas ruas agora.

Só que firmeza não era um ponto forte de Beatrice Blanche. Sensível ao extremo, se magoava muito facilmente. E só a ideia de que pudesse ser a causadora do sofrimento de alguém, era inconcebível para ela.

Ainda caminhando melancólica, sente as primeiras gotinhas geladas cairem sobre ela. Olha novamente para o céu com desânimo e pensa como o dia estava terrivelmente triste. Abre o guarda-chuva com dificuldade, voltando a caminhar lentamente. Enquanto andava Beatrice deixava seus pensamentos vagarem sem direção, assim como ela. Odiava se sentir daquele jeito, impotente, mas naquele momento se deixou levar.

A chuva estava ficando mais forte, e quando Beatrice parou para esperar um carro passar, notou do outro lado da rua uma moradora de rua que tentava se agasalhar e se proteger da chuva com papelão velho. Observando de longe a cena, com o guarda-chuva na mão, o coração de Beatrice se aperta no peito. Agindo por instinto sem se importar com os carros que buzinaram quando ela cruzou a rua correndo, ela vai na direção da mulher.

A desconhecida se assusta ao ver alguém se aproximar. Sem conseguir enxergar direito, pensa que era outro mendigo tentando roubar seu velho cobertor, por isso tenta inutilmente escondê-lo atrás de si.

Sem dizer nada, Beatrice continua fitando-a, e sem pensar duas vezes, retira sua jaqueta de couro junto com seu cachecol dando a mulher. Olhando-a sem entender e com desconfiança a mendiga hesitava em pegar as peças de roupa da mão de Beatrice.

— Aqui, pode pegar. — diz oferecendo também seu guarda-chuva à ela.

— A senhorita irá se molhar… — a mulher maltrapilha parecia muito surpresa com a atitude bondosa da desconhecida.

Le ℳonsieurOnde histórias criam vida. Descubra agora