4. Soco no estômago

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  Fui na praia depois disso. Não queria chegar em casa, pra ser mais exata, não queria chegar na minha vida. Fiquei um tempão lá, vendo o pôr-do-sol,e não me preocupando em mais nada se não os raios solares que causam manchas e câncer de pele. Aproveitei bastante, até que resolvi que tinha que enfrentar aquele inferno novamente. Peguei o mesmo ônibus que eu cheguei aqui, e estava lotado, horário de pico.
Suja, fedorenta e com areia da praia cheguei em casa, nem sinal da minha mãe. Ótimo, deve ter passado a noite fora também. Em um momento de insanidade eu pensei que ela se preocuparia... bobagem a minha. Fui na cozinha procurar alguma coisa pra comer, encontrei um bilhete dela.
"Fui no médico, deixei seu café da manhã no microondas. Abraços".
Me assustei com aquele bilhete, até agora "abraços" foi a coisa mais materna que eu escutei dela.
Comi muito rápido, e estava realmente pensando em passar o dia em casa. Mas eu sabia que minha mãe ia chegar a qualquer minuto, e um dia inteiro de aula era melhor que um dia inteiro perto dela.
Subi, e me arrumei depressa. Nem olhei pro espelho. Nem me importava também. Sabia que não ficaria satisfeita comigo mesma, veria no meu rosto as olheiras e o cansaço. Teria pena de mim mesma e do zumbi que eu me tornei.
No caminho pra escola não deixava de me lembrar da noite de ontem, nem do Daniel. Ele deve ter me achado uma louca e nem deve ter se importado por eu ter ido sem falar nada, mas eu não ligo, tive com ele conversas que eu não tinha há muito tempo. Gostaria de ter contato com ele, ser amiga dele e... arhg, esquece.
O sinal tocou no mesmo instante que eu cheguei no colégio, subi correndo pra minha sala e o professor ainda não havia chegado. Sentei na cadeira de costume e abaixei a cabeça, só ai notei como eu estava com sono.
- Não sei.. coitada né? Parece que nunca vai superar, sinto tanta pena dela. – Cochicou a Nathália, uma menina da minha sala em que eu falava às vezes, até passava o intervalo com ela, ela era amiga do Samuel. Ela tinha muita espinha, eu sempre desviava o olhar se era pra falar com ela, as espinhas chamavam minha atenção.
- Ah. Já faz mais de seis meses, né? Acho que já daria pra superar... – disse Safira, a Best friend forever da Nathália – nossa, como eu odeio essa palavra – como elas mesmo se chamavam.
Pena, pena! COMO EU ODEIO ESSA PALAVRA! Não aguentava mais que sentissem pena de mim, nem as Best friends forever. Elas não tem o direito de sentir nada. Mas que saco, o que elas sabem sobre mim? Sobre minha vida?
Levantei a cabeça e olhei pro lado – Da próxima vez, sintam pena de vocês e de suas vidas medíocres, se eu sofro é porque um dia fui feliz demais. E vocês, que nunca sentiram nada nesse coraçãozinho fútil, em? Juro que já ia partir pra cima das meninas, mas o Samuel apareceu na porta e me contive. Só sai da sala enfurecida e todo mundo saiu do meu caminho. Ótimo. Só ouvia atrás de mim sussurros do tipo "como ela é grossa" e "coitada..". Acho que preferia a ideia de ser grossa.  

E se o acaso, for por acaso? ♥Onde histórias criam vida. Descubra agora