Capítulo 33

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Narração de Louise

       Abri os olhos lentamente, e de novo minha cabeça rodava. Um odor forte entrava em meus pulmões e tudo estava escuro. Devagar olhei para cima e deslumbrei me com correntes prateadas que prendiam meus pulsos fortemente, sacudi os punhos, tentando quebrá las, mas elas continuaram intactas. Tentei mais uma vez, com toda força que pude, porém a única coisa que consegui foi rasgar minha carne com o ferro das algemas, senti o sangue quente fluir e escorrer pelos meus braços. Como se não bastasse isso, a sede de sangue estava me deixando louca, eu só desejava poder me distrair e esquecer por um minuto sequer da dor que corroía minha garganta. Dormir seria ótimo, porém eu nunca mais iria ter esse privilégio de novo, de sentir sono como antes, de sonhar, ir para longe daquele mundo que me metera. Lembrei de minha antiga e monótona vida, aquela de que eu tanto reclamava, e que não ia ter novamente, era uma vampira, e nunca ia escapar disso. A saudade da rotina bateu, das preocupações com dever de casa, com o paquera da esquina. Coisas que se tornaram tão medíocres comparado com tudo. Semicerrei os olhos e observei a sela rústica e úmida em que me encontrava. Era tão diferente do meu confortável e iluminado quarto. Fechei os olhos de novo e lembrei da minha mãe abrindo as janelas de manhã e me irritando por isso, do meu irmão caçula mexendo em tudo, da vista tumultuada e cinza dos prédios e pessoas que corriam apressadas para seus compromissos. Como eu queria tudo de volta, e no entanto ali estava eu, presa a semanas sem ouvir nada além do gotejar de um cano furado, sozinha e com uma sede de sangue me estraçalhando. Ficar só não era do meu feitio, eu era uma garota literalmente urbana, gostava de pessoas, e de falar com pessoas, a solidão era de longe meu maior medo.
       - Me tira daqui!!! - gritei esperando uma resposta - Eu já aprendi a lição! Não vou mais confrontar o grande e poderoso chefão de vocês, mas por favor, não posso mais! Não aguento ficar tanto tempo aqui embaixo.
        Minha voz ecoou pela sala e percorreu todo o lugar, sem resposta. Levantei a perna para me exercitar um pouco, ficar em pé ali me deixara quebrada, faminta e imunda. Um banho seria ótimo, tanto tempo sem nem ao menos ver água, tinha me destruído. Meu cabelos, geralmente radiantes e bem penteados estavam embaraçados e sujos, e minhas roupas grudadas no corpo.
Para não lembrar da minha atual situação me pus a pensar em outras coisas. Sebastian. Ele tinha sumido, com certeza se juntara ao seu criador e estava sendo fiel como sempre. Balancei a cabeça para espantar a ideia, Sebastian era o único que podia me tirar daquele lugar, minha única esperança, e só em pensar que ele podia ter traído a todos, me dizia que certamente minha sentença estava assinada, eu ficaria presa para sempre.
       Tinha sido com certeza uma má decisão xingar Kian, se bem que eu não me arrependera, dizer umas verdades tinham me dado uma grande satisfação e muito tempo para pensar. Engoli em seco, sentindo novamente a onda de ansiedade para me alimentar, os dias em jejum não me matavam, mas me deixavam totalmente descontrolada. Eu sentia tremores, arrepios e a sensação de ter uma pedra de gelo à horas encostada na minha pele. Encostei a cabeça no braço erguido e descansei.
      O tédio era a pior coisa, ficar sem fazer nada, sem falar nada. Até que um ruído fraco chegou aos meus ouvidos, o primeiro barulho em um mês. Levantei a cabeça depressa e esperei que algo se passasse, mas não houve nada, a mesma calmaria de sempre. Repousei de novo a cabeça e tornei a pensar se estava ficando louca por tanto tempo encarcerada ali.
       - Psiu... - alguém chamou.
Saltei assim que abri os olhos e vi um rosto entre as grades da pequena janela na porta. Era um semblante masculino, pálido e desconhecido, o cabelo tão bem arrumado quanto um modelo de revista. Ele olhou para os lados do saguão e sussurrou:
       - Você é a vampira nova não é? A que veio com Sebastian?
       - Sim, por favor, me tira daqui. - implorei.
       - Eu quero te ajudar, você tem que ir embora! Coisas ruins vão acontecer, não pode continuar aí. - ele cochichou ainda mais baixo.
       - Quem é você? Por que está me ajudando?
       - Meu nome é Zack, eu estava lá em cima, com Kian, e Sebastian...
       - Sebastian?! - exclamei - Então ele está mesmo do lado daquele filho da mãe? Meu Deus, vou ficar aqui para sempre!
       Meu coração se apertou dentro do peito, tudo estava perdido. Eu ficaria ali, eternamente sofrendo, e Angel? Ela seria morta, e seu pai, e Hector... Não o Hector!!! Senti vontade de correr, fugir, mas quanto mais eu forçava as correntes mais fraca ficava.
       - Não faça barulho! - pediu o rapaz pálido à porta. - Vai chamar atenção!
       - Que chame! - gritei - Não podem me deixar aqui! Isso é muito cruel! Me tirem daqui seus estúpidos!!!
       - Escuta! Eu vou te soltar, você é muita nova nisso, vai sofrer demais dentro dessa sela. Sebastian não pode ajudar, ele simplesmente não pode. Vá embora, suma para o mais longe possível tá bem?
       - Por que tá fazendo isso? Eu não tenho nada para te dar em troca.
       - Eu sei... mas não posso te deixar aqui... gostei de você, é corajosa.
       - Você estava lá não foi? Na noite que chegamos. Foi um dos caras que eu tentei dar um pontapé?
       - Sim, sou um dos caras. Mas chega de conversa. - falou ele sem humor - Você está longe de qualquer casa ou hotel que tem por aqui, então assim que fugir pela saida de ar, vá na direção Norte, depois de duzentos metros você vai encontrar uma estrada de terra bem estreita, entre nela, caminhe até chegar num pequeno ponto de ônibus, pegue o que passar primeiro e vá o mais longe possível, não olhe para trás e nem espere nada. Eles vão perceber logo que você fugiu e vão te caçar, então não perca tempo, assim que eu abri essa porta fuja, eu vou ver se tudo está limpo.
       Ele abriu a porta sem dizer mais nada e entrou. Foi até mim e encostou a pele gélida contra a minha. Olhou para as minhas mãos com as sobrancelhas unidas. O rapaz tinha os cabelos acobreados, olhos um pouco caídos e parecia cansado, mas ainda assim era lindíssimo. As correntes foram soltas e meus braços caíram pesados sobre meu corpo, eu estava dormente, fraca demais, precisava de sangue, cambaliei maneira para o chão quando Zack me segurou e me ergueu, segurando me pelos braços.
       - Você está fraca, mas tem que aguentar, tem que ir embora. - ele disse nervoso.
       - Preciso de sangue... - sussurrei.
       Ele pareceu pensar por algum instantes, olhando sem parar para a entrada da sela, depois olhou para mim piedoso e disse:
       - Beba de mim. - ordenou.
       - Como assim? Vampiros podem se alimentar um dos outros?
       - Não é muito comum, mas se o sangue humano estiver fresco, pode ser bebido. Eu me alimentei a pouco tempo, vai servir.
       - Não posso fazer isto... - disse me dúvida.
       - Você precisa, anda, tem que beber.
       Ele pôs o pescoço perto do meu rosto. Eu pude ouvir o sangue bombeando rápido pelas veias. A pele dele tinha cheiro de ervas, um cheiro extasiante. Mordi devagar e notei que ele se enrijeceu. Enquanto o sangue descia pela minha garganta, pude sentir tudo voltar ao normal, minhas forças e minha vitalidade. Eu queria mais, bem mais que aquilo, suguei mais forte, sentindo o líquido descer mais implacável.
       - Chega! - arquejou Zack, mas eu não o soltei, não queria - Já chega! - ele sussurrou entre os dentes e me empurrou para o lado.
Zack estava trêmulo e com a pele mais escura. Tive medo que o tivesse machucado.
       - Me perdoe, você está bem? Doeu? - ele riu.
        - Estou bem, e não, não doeu.
       - Não? Mordidas de vampiros dói, e como dói.
       - Não de vampiro para vampiro, é mais como... sexo. Um tipo de orgasmo em sequência, cansa, literalmente. - abri um sorriso sem tamanho.
       - Obrigada, de verdade, nunca vou esquecer o que fez por mim.
       - Espero que nos encontremos mais uma vez, agora vá!
       O abracei e disparei para longe daquele ninho de cobras. Desci por um corredor extenso, sempre vigiando se alguém vinha. Já perto de sair, uma voz familiar atraiu minha atenção. Uma voz rouca e fria, e tinha também outra. Eram as vozes de Sebastian e de Kian. Eu sabia que devia ir embora o mais rápido que pudesse, mas não consegui prosseguir sem pensar em Sebastian, ele nos traíra, voltara para o lado de um vampiro que trouxe morte e dor para todos, ele era igual ao seu criador, ruim e demoníaco. Espreitei pelos corredores, guiada pela fala de Sebastian, ele falava sem parar. Cheguei até a parede de onde as falas viam e encostei a orelha ali, pude Ouvir Sebastian falar sem nem ao menos gaguejar.
       - Ela é poderosa, tem sangue de lobisomem, é uma híbrida. Uma mistura de lobo e vampiro, não pode ser atingida pelos poderes sobrenaturais.
        - Onde aquela desgraçada está? - perguntou Kian parecendo calmo.
       - Em Toronto, no Canadá. O pai dela é o lobisomem que se casou com Annie.
       - Por isso demorei tanto para encontrá la. - Ele estava entregando Angel e os outros. Seria um massacre, todos aqueles vampiros tão cheios de poderes indo atrás dela. Eu tinha que avisar! - Tem mais algum vampiro? - ele continuou.
       - Sim, tem outros, Hector, Janice... Hector foi criado por você, mas fugiu. - disse Sebastian lentamente.
       - O quê?! - sibilou Kian incrédulo - Aquele desgraçado devia está morto! Ele fugiu da minha irmã em plena luz do dia, ele devia ter virado cinzas! Como pode está vivo? E ainda tramando contra mim com essa garota que devia ter morrido?
       Vamos atacar eles o mais rápido possível, e você Jones, vai nos levar até lá.
       Eu não podia perder mais tempo. Corri como uma louca através da casa tentando achar a saída que Zack me ensinara. Eu tinha que avisar aos outros, antes que o clã de Kian chegasse lá. Todos estavam em perigo, incluindo Hector, eu só tinha algumas horas, só daria tempo de avisar que eles estavam indo. Minutos depois de tanta agonia, correndo como louca, encontrei o caminho, respirei aliviada e fui em direção a saída que estava tão próxima. Mas antes que eu pudesse passar por ela, um vampiro alto me acertou na cabeça com algo e disse:
       - Vai para algum lugar mocinha?
       - Saí da minha frente! - exclamei nervosa, com medo de voltar para aquela sela fria.
       - Acho que não. - ele sorriu inclinando a cabeça de lado e me olhando dos pés a cabeça - Sabe? Faz tempo que eu não me divirto com uma vampirazinha tão linda como você! Quer brincar um pouco comigo quer?
       - Não encosta em mim seu desgraçado! Não chega perto! - gritei me afastando.
       - Calma, - falou o homem rindo - eu não vou te machucar, vou só me distrair um pouco, depois te entrego para Kian e está tudo bem.
       - Eu disse não!!!
       Ele veio para cima de mim com um desejo irrefreável. Me segurou pela lateral do meu corpo enquanto eu tentava me afastar batendo sem parar nele. Mas o sujeito não parava de beijar meu pescoço e eu não conseguia me soltar. Eu estava com nojo, medo e raiva. Pensei que ia ser molestada por aquele homem horrível, mas de repente um barulho alto acertou a cabeça dele e ele virou para trás com os olhos em chamas de tanto ódio. Zack tinha o acertado com uma barra de ferro. Os dois entraram em uma luta, e de repente o homem pareceu cego, olhando aterrorizado para baixo enquanto eu segurava minha blusa rasgada morrendo de vergonha por está mostrando meus seios.
       - Fuja! - bradou Zack - Vá agora! Não posso segurar ele por muito tempo!
       - E você? Kian vai te matar quando descobrir. - falei receosa pelo que ia acontecer com ele depois que fosse descoberto.
        - E ele vai ser sua idiota! - gritou entre dentes o homem que estava preso em sua própria mente, ele tateaca o ar eufórico.
       - Não há tempo para pensar em mim, fuja! Vá agora! Eu ficarei bem! Vá!
      - Obrigada...
      Não tive opção, corri para fora daquela confusão e sumi no meio do nada. Certa de que tinha que encontrar os outros e avisá los a tempo, antes que fosse tarde demais.

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