Capítulo 05

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Bruno

Maravilhado com a criatura caída à sua frente no meio da floresta, Bruno ficou a observá-la, extasiado. Pelas formas corporais do ser de forma humanoide, ele julgava que a criatura era uma fêmea. Mas não uma fêmea qualquer.

Ela... é magnífica!

Com enormes asas azul-esverdeadas oriundas de suas costas, com os antebraços e pernas cobertos por penas das mesmas cores. Seus braços e coxas, porém, eram nus e tinham um leve tom esverdeado, assim como seu rosto. Suas mãos e pés eram parecidos com garras, com unhas protuberantes como as de um falcão. Sua cabeça era coberta por longas penas verdes que desciam por seus ombros como se fossem cabelos, que emolduravam um rosto semi-humano. A boca tinha tamanho e formato próximos a de um ser humano, com os lábios num tom de anis. Aquele animal lhe recordava um ser mitológico.

Uma... harpia.

Instintivamente, Bruno começou a caminhar para se aproximar da criatura.

– Tome cuidado, Olsen! – Jacqueline recomendou – Você não sabe se essa... coisa... é perrigosa!

Tão absorto, Bruno sequer ouviu o alerta de sua tenente. Ao invés, se aproximou para examinar o que parecia ser um "traje". A área do tórax e logo abaixo da cintura eram cobertos por uma camada de pele distinta do restante do corpo, num tom verde escuro bem próximo ao das copas das árvores.

Com cautela, Bruno estendeu seu braço para examinar aquele ser. Tal qual deduziu, a camada que cobria as supostas áreas íntimas eram pele de algum outro animal, talvez um mamífero. Ao tocar a pele dela, uma surpresa.

Ela é... fria? Não tinha um termômetro para confirmar, mas a temperatura corporal da criatura deveria estar por volta de uns quinze graus celsius. Não é à toa que os sensores de calor dos nossos drones não identificaram esses seres.

Após tocá-la, a "harpia" se mexeu e, instintivamente, Bruno saltou para trás.

Ela acordou?

A "harpia" abriu seus olhos. Suas córneas eram impressionantemente negras e a íris alaranjada, fazendo-a se parecer com um felino. Seus olhos encararam Bruno, mas não parecia haver a intenção de atacá-lo.

– Nem acrredito no que você encontrrou, Olsen! – a tenente Jacqueline felicitou Bruno através do radiocomunicador e tirando-o de seu transe – Agorra volte com os registrros parra cá.

– Espere mais um pouco – Bruno pediu, sacando de um compartimento de seu traje papel e caneta – Quero os meus registros pessoais.

Kukara

O que ele está fazendo? Kukara se indagou ao ver o verme branco arrancar um pedaço de sua pele e arranhá-lo com uma de suas unhas.

A cabeça do verme se contorcia na direção daquele fragmento de pele e depois na sua, num constante ritual que deixava Kukara extremamente tensa a cada movimento. No entanto, aquele olho único e enorme a atraía para chegar mais perto, ao mesmo tempo que a amedrontava.

Deve ser um ritual antes de me devorar, pensou Kukara com a boca seca e as garras inferiores tremendo. Preciso escapar antes disso.

Kukara sentiu sua asa latejar de dor e, naquele instante, praguejou contra seu meio-irmão pelo desastrado voo daquele instante. No entanto, percebeu que não escorria mais sangue do local da ferida: ao invés, havia algo branco envolvendo o machucado.

Ele me marcou com um pedaço da pele dele também?

Parecia que o rito do verme branco se alargaria por mais algum tempo, então Kukara torcia para que sua asa ficasse um pouco melhor até lá.

Bruno

Bruno, extremamente concentrado, desenhava a harpia. A quantidade de detalhes dela o empolgava, assim como a beleza peculiar da criatura. A harpia se mexia pouco, provavelmente pelo ferimento, o que ao menos tinha um lado bom: a tornava uma modelo "obediente". Por sorte, a lesão dela não era grave e o kit de primeiros socorros que estava no hover era o suficiente​ para tratá-la.

– Isso mesmo, continue assim – falou Bruno inutilmente, pois seu capacete de astronauta impedia que sua voz alcançasse o alvo de sua arte.

– Você ficou maluco? – Jacqueline esbravejou. Esta, sim, lhe escutando claramente – Parre de enrolar e volte logo prra cá!

– Só mais um pouco – retrucou Bruno – Estou quase terminando.

Prra quê essa porcarria de desenho, Olsen? – inconformada, a tenente insistia em demover Bruno daquela ideia estúpida – Você sabe que o que você vê está sendo grravado aqui no sistema.

Bruno não respondeu, pois era um capricho seu desenhar aquilo que admirava. Pouco importava o que ficaria num sistema eletrônico, mas sim sua própria experiência.

Quase lá.

Finalizando o desenho – até mesmo por ser um perfeccionista -, Bruno, todavia, foi surpreendido pela harpia, naquele instante já recuperada, que saltou sobre ele, tomando-lhe o desenho e decolando por entre as copas das árvores.

Kepler - três sóis, dois povos (amostra)Onde histórias criam vida. Descubra agora