Capítulo Quatro

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Eu não podia acreditar. Eu sabia que estávamos nos acostumando com a ideia, mas isso levava tempo e eu deveria saber que esse era um luxo que não tínhamos. Meu coração acelerava e minha mente estava a mil. Pensava em várias coisas ao mesmo tempo. Apesar disso, meu corpo estava intacto, em uma espécie de transe. Não conseguia fazer nada. Apenas olhava para meu pai, falando de novo para fugirmos. E dessa vez era real, não tinha escapatória. Tinha que ser naquele momento.

Respirei fundo e tentei acalmar os nervos. Eu sabia que se não me movesse ninguém mais iria. Tínhamos que correr e não tínhamos mais tempo. Olhei para o James, ele também parecia ter tido a mesma reação: nenhuma.

— Vocês o ouviram. Temos que ir andando! — Falei como se tivesse acordado de vez de um pesadelo. Percebendo que esse pesadelo não se resolveria quando eu acordasse.

Mitt balançou a cabeça, concordando. Então virou as costas, começando a andar em direção à tenda dele. Aos poucos, todos foram fazendo o mesmo, seguindo-o.

Depois que todos tinham ido para suas respectivas tendas, fiz o mesmo. Deixando o meu pai sozinho, agora que já havia se recuperado. Ele deveria ter corrido muito, pois como chefe da guarda, seu condicionamento era impecável. Não seria qualquer corridinha que ia derrubá-lo.

Assim que entrei na tenda, fui direto para o fundo para procurar a mochila que estava juntando poeira por debaixo de algumas roupas. Era uma mochila verde, um verde bem escuro. Meu pai a tinha me dado no meu aniversário de dezesseis anos. Essa era uma idade que significava muito para o meu... Para o povo da montanha. Era um aniversário especial na montanha, pois era quando nos tornávamos jovens adultos. A mochila tinha uma estampa de flores que só podia-se ver quando chegava mais perto, pois era quase da mesma cor que a própria mochila. Na verdade, fora um dos únicos presentes que ganhei, além do pingente da minha mãe, que agora eu colocava em um pequeno bolso na frente da mochila. Era um pingente retangular, que de um lado tinha a foto da minha mãe, com um sorriso enorme, e do outro a do meu pai, esboçando o que poderia ser o começo de um sorriso. O pingente não fora um presente de aniversário, na realidade, minha mãe me dera assim que nasci. É uma lembrança de que ela um dia pôde me ver e que eu nunca poderia esquecer isso. Esse pequeno objeto, era tudo o que me restava dela.

Peguei todas as minhas roupas: duas calças, algumas blusas e casacos, roupas de baixo e meias. Era tudo que eu tinha para falar a verdade. Joguei tudo dentro da mochila e peguei o resto dos meus pertences, além de um canivete velho que eu nunca tinha usado, mas que poderia ser muito útil, e o resto da comida que estava na nossa tenda, que meu pai havia trazido uma semana antes. Não levei muito tempo para pegar as minhas coisas e a mochila nem sequer chegou a ficar totalmente cheia.

Ao meu lado, Liz e Vanessa também arrumavam suas coisas. Ninguém falava uma palavra. Apenas fazíamos movimentos repetitivos, quase que automáticos, tentando pegar tudo o mais rápido possível.

Então, uma a uma, andávamos em direção a fogueira, onde todos se preparavam para sair. Pouco antes de sairmos da tenda, coloquei as mãos nos ombros de Liz, segurando-a enquanto deixávamos Vanessa continuar na direção da fogueira. Eu precisava ter certeza de que ela estava encarando essa situação do melhor jeito possível. O que era mais difícil ainda para ela.

— Tá tudo bem? — Eu sabia a resposta, e agora que pensava nisso, sabia que não era uma boa ideia ter perguntado, pois não era uma resposta que eu queria ouvir.

— Nós vamos sair finalmente... Certo? — Apesar do medo, que consumia a menina meiga que eu conhecia, ainda podia ver que ela estava se esforçando para ver um lado bom nisso tudo.

— Certo. — Sorri, sem vontade alguma. Mas queria fazê-la se sentir melhor. — Vamos ficar bem.

— Como será que vai ser? — Ela parecia meio confusa, não conseguia decifrá-la. Não sabia se estava fingindo estar ansiosa para sair, ou se realmente sentia tudo que estava falando. Uma coisa era certa: ela não escondia o medo. Ou não tinha sucesso em escondê-lo.

Depois do Fim do MundoOnde histórias criam vida. Descubra agora