Capítulo Dez

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A floresta começava a ficar cada vez mais escura e ainda não tínhamos visto nenhum animal, muito menos algum tipo de comida. Meu estômago estava gritando dentro de mim, depois de quase uma hora de caminhada.

— Acho que eu nunca fiquei com tanta fome na vida. — Mitt falou suas primeiras palavras desde que saímos de perto dos outros. Nós dois sabíamos que aquilo era só um exagero, já tínhamos passado mais de um dia sem comer dentro do buraco.

— Nem me fale. — Concordei. — Eu só espero que a gente consiga encontrar alguma coisa para comer.

— Você lembra o que o Peter costumava dizer sobre as cores das frutas?

— Acho que era alguma coisa sobre nunca comer frutas roxas. — Tentava me lembrar, sem muito sucesso.

— Roxas são para os trouxas. Acho que era assim. — Ele falou.

— Vamos passar longe dessas então. — Acabei rindo.

Confirmei com a cabeça. Meu pai dizia que algumas frutas eram altamente venenosas e que tínhamos que ficar longe delas. Eu nunca questionei o porquê disso, apenas aceitei que não deveríamos comer essas frutas. Alex provavelmente sabia o motivo, por ser tão questionador.

— Lexi, eu andei pensando no que você falou sobre não ficar pelos cantos chorando pela morte do seu pai. — Mitt foi bem direto e eu não estava esperando por isso. — Às vezes é bom chorar.

Olhei para ele, sem entender muito bem onde ele queria chegar. Ele não costumava ser tão direto.

— Quando soube dos meus pais, apesar de eu nunca ter conhecido eles... Foi muito difícil. Porque, você sabe né? Todo mundo tem esperança de se encontrar com a família um dia e eu ainda achava que esse dia ia acontecer para mim. Mas não vai mais.

Os pais do Mitt haviam morrido em um acidente há cinco anos. Eles estavam voando em um dos planadores, um tipo de nave redonda que funciona com oito hélices e que pode voar com muita velocidade se o piloto for experiente. Também era conhecida como octacóptero. O pai do Mitt era piloto e inclusive já trabalhou com o meu pai em algumas missões, mas ele estava fora do serviço quando aconteceu o acidente. Na verdade, só estavam ele e a mulher no planador quando caíram.

— Eu sei. — Ele realmente tinha ficado muito mal e não saiu da cama por dias. Apesar de ele ser conhecido como preguiçoso, nós sabíamos que não era apenas por preguiça.

— Então... Está tudo bem se quiser se abrir. — Ele falou meio sem jeito.

— Obrigada. — Foi tudo o que consegui dizer.

Eu não tinha certeza se queria falar para ele tudo o que sentia, mas realmente me identificava com o que ele estava falando. Fiquei alguns minutos em silêncio, enquanto caminhávamos lado a lado. Dentro da minha cabeça havia um turbilhão de pensamentos e eu sentia que ia explodir, mas me segurava para tentar não mostrar nada daquilo.

— Às vezes eu acho que vocês estão certos. — Falei me referindo ao Mitt e aos outros. — Mas você sabe que eu me sinto responsável por todo mundo e sempre foi assim.

— Não precisa mais. — Ele rebateu. — Nós precisamos ajudar uns aos outros. Você não tem que nos carregar nas costas.

— Eu só não quero que nada de ruim aconteça com ninguém. — Segurei as lágrimas o melhor que pude. — Queria não sentir esse peso de ter que carregar todos nas costas, mas não consigo evitar. Não consigo parar de pensar que estamos em perigo desde o minuto em que decidimos deixar o buraco. E estaremos em perigo até depois de chegar às ilhas.

— Lexi, nós sempre estivemos em perigo. — Mitt estava calmo enquanto falava. — Nós estamos em perigo desde que nascemos. Fomos escondidos dentro de uma montanha e sempre tivemos aquela sensação dentro de nós de que alguma hora, algo de muito ruim iria acontecer. Apesar disso, sempre tivemos uns aos outros, mesmo nas horas mais difíceis.

Depois do Fim do MundoOnde histórias criam vida. Descubra agora