O portão

405 58 143
                                    

    Aquele dia tinha sido incrivelmente longo, de uma forma que Léo jamais pensou que um dia poderia ser. O relógio insistiu em prolongar as voltas que dava, como se soubesse da ansiedade que o garoto guardava. O tempo estagnara; até o momento em que Camila aparecera em sua casa, no fim daquela tarde, pronta e disposta a colocar o plano em ação. Somente então Léo percebeu que o tempo estava lhe guardando do que viria pela frente, a noite que se seguiria não seria a das melhores e qualquer instante a mais de preparo se mostrou bem vindo.

   Porém, como havia estupidamente desejado durante todo aquele dia, a hora de agir estava próxima e se aproximava em uma velocidade aterradora. Seu peito se comprimia a medida que o táxi avançava em direção ao centro de pesquisas e seu estômago revirava com a vontade crescente de possuir o tempo que tanto regeitara.

   Uma sensação ruim tomava todos dentro do veículo, até mesmo o motorista havia percebido a tensão entre os garotos; e certamente, pensou Léo, não estaria sendo muito diferente no outro táxi, que vinha logo atrás com Camila, Pedro e Márcia. Léo repassava as ideias da ruiva, enquanto imaginava as melhores e as piores coisas que poderiam acontecer. Eram muitas hipóteses, e quanto mais ele tentava se preparar para elas, mais surgiam novas hipóteses.

   O céu limpo, com uma lua apagada pelas luzes da metrópole, destoava do vento úmido que entrava pela janela aberta. O barulho externo parecia distante da realidade; a vida havia perdido o sentido durante aquela sexta-feira. Ninguém fora capaz de agir naturalmente durante as horas de espera, não eram estúpidos para subestimar aquela situação.

   — Parece até que tamos indo pra um funeral… — Mônica tentou quebrar a tristeza que tinha se instaurado, porém o comentário não surtira efeito.

   Pelo retrovisor, Léo observou as três garotas no banco de trás; Clara olhava para fora, para as lojas que passavam por eles, e Mônica e Janaína fitavam uma a outra, como se conversassem com os olhos. A ligação entre as duas parecia tão forte quanto a que ele possuía com Pedro.

   — Isso é loucura… — Janaína  cochichou, contudo alto o bastante para que todos ouvissem. Ainda não estava conformada com a decisão que Mônica tinha tomado. A todo instante balbuciava pequenas frases de pessimismo, sem perder as esperanças de que poderia fazê-la mudar de opinião.

   Mas o olhar de decisão da morena permanecia vivo em seu rosto e estava longe de desaparecer. Mônica segurou a mão da amiga, acalentando-a da maneira que podia.

   — Vai dar tudo certo — falou, sussurrando, porém antes que pudesse terminar sua fala, os fios loiros de Janaína já estavam chacoalhando com o balançar da cabeça em negativa.

   — Ainda dá tempo da gente voltar — ela rebateu; o que fez Léo revirar os olhos de onde estava.

   Mônica não respondeu, não adiantaria em nada argumentar, aquilo tinha sido conversado e reafirmado dezenas de vezes durante todo aquele dia e a decisão não mudaria ali, a alguns poucos quilômetros do confronto.

   — E então? — o taxista cortou o silêncio, após alguns minutos. — Aquela região não é muito frequentada, ainda mais a noite. — Referia-se ao complexo industrial para onde se dirigiam. — O que vão fazer lá?

   Léo sorriu. Com todas as mudanças que o projeto havia causado, uma coisa permanecia como antes: eles ainda eram meros adolescentes aos olhos da sociedade — coisa que até ele se esquecia de vez em quando. E nada mais normal que questionar o motivo de crianças estarem indo para um local tão isolado como aquele complexo. Afinal, como adolescentes, eles deveriam estar em casa, preocupado-se apenas em terminar de ler a famigerada Carta de Caminha para a aula de literatura.

Projeto Gênesis - Exposição Onde histórias criam vida. Descubra agora