CAPÍTULO 29

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23 de Maio
Olho para o céu triste derramando lágrimas. Os dias não estiveram tão ruins. Me cobri mais ainda com o cobertor de lã. Eram 3:55 da manhã e eu estava no sofá da sala. Tudo estava quieto, apenas o som das lágrimas perturbavam a janela.
O meu humor se misturava com a natureza e meus olhos cansados resolveram se fechar. O meu celular estava na mão com uma luz acesa que me incomodava. Desliguei e deitei-me no sofá finalmente tentando encontrar os sonhos de volta. O frio se passava pelo meu corpo, mas eu me aquecia com o calor. Meus pensamentos estavam passando por mim e eu observando como se fosse um filme. De repente senti pipocas na minha língua saltitando para ficarem prontas e serem comidas. É como se a minha boca fosse a panela.
Abri meus olhos e me deparei com um gato. Espera, eu estou sonhando?
-Laura, acorda!-meu irmão me faz tornar ao mundo real.
Olho para a janela, o céu está mais feliz do que nunca.
-Cadê o gato?-percebo meus cabelos em pé.
-Que gato?-Thiago fica feliz com a esperança de que tivesse um animal de estimação aqui em casa.
Ele ama animais.
-Nada não. Acho que eu estava sonhando.
-Você sonhou um gato?
-Não...Quero dizer, mais ou menos.

Minha mãe entra no quarto tirando meus cobertores e abrindo as cortinas das janelas.

-Você acordou tarde hoje. O que houve?-minha mãe me empurrava pra cozinha.
-Nada...-fui em direção aos biscoitos e pus eles na minha boca. Fui mordendo lentamente, ainda achando surreal o meu sonho.
Logo depois, fui me trocar. Coloquei roupas quentes, porque apesar de estar ensolarado, o ar ainda estava resfriado.
Escovei meus dentes, pentiei meus longos cabelos e fiquei observando meu rosto. Eu ainda tenho cara de bebê, mas tem alguma mudança. Eu estou mais amadurecida. Mais sensível. Meus olhos pareciam de coruja. Enxaguei meu rosto com água fria e peguei meu cachecol. Desci as escadas e fui ao encontro com a Vitória. Sim, se você ainda não sabe, eu ela estamos mais próximas. Estranho, né? É porque ela está me permitindo ser amiga.
-Oi.-ela sorriu ao me ver.
A história dela parece uma novela. Nunca acaba, tem sempre algo acontecendo. Não se sabe ao certo se é verdade ou não.
Nós somos tão diferentes, mas mesmo assim nos damos bem. Ela anda meio sozinha em casa, então eu vou (as vezes) pra passear e tirá-la de lá.
Vitória sempre reclama da escola, que os colegas são muito ignorantes e ficam falando absurdos sobre ela.
Ela me contou um dia porque fumava.

...
"Meu pai tinha um vício por cigarro. Ele só parou porque minha mãe jogou no lixo. Ele foi ao médico e descobriu que tem uma doença no pulmão. Não sei exatamente o que, porque ele prefere não falar sobre isso. Então, um dia, eu vi que ele estava fumando escondido, e eu tinha mais ou menos sua idade, quando eu tomei coragem e enquanto ele dormia, eu peguei os cigarros e pus no meu quarto. Eu não queria que ele os tocasse nunca mais. Então, eu meio que fiz um "sacrifício". Eu começei a fumar pra tentar ter a doença dele. Aí nós morreríamos juntos."

"Ah..." Eu não tinha muito o que falar...
"Não que eu queira te influenciar, eu não faço mais isso, eu faço porque eu gosto."
...

-Como vai?-sorri de volta.
-Quer mesmo saber?-riu.

Ela pegou a caixa de cigarros e tirou um que pôs em sua boca. A fumaça fazia uma dança no ar.
Tossi .
-Você já tentou evitar?-perguntei com o dedo apertando o nariz.
-Nunca.
-Tenta agora.
-Não, está louca? Isso é minha companhia em todas as horas.
-É, mas faz mal.
-Olha tem milhares de pessoas que fumam cedo e ninguém reclama.
-Porque ninguém conversa!
-Você está bem? Você nunca ficou reclamando disso.
-É, mas agora eu estou. Eu sou sua amiga, agora eu sei que isso te faz mal.
-Não vou parar. Nem obedeço meus pais direito, vou obedecer uma pirralha de treze anos?
-Me respeite! Até porque, você começou com quantos anos mesmo? Ah é, treze.
-É melhor você parar de insistir, porque eu sou a única que te faz companhia quando ninguém quer conversar com você!-berrou.
-Isso não tem nada a ver.
-Ah, tem sim! Porque quando você ficar resolvida com seus amiguinhos, tenho certeza absoluta que me deixará isolada!
-Não diz isso. Eu continuarei sua amiga, só estou avisando isso porque eu te conheci de verdade. Antes não era assim.
-Me poupe dos seus conselhos. Sou mais velha que você e sei me cuidar.
-Tá bom.-ficamos quietas.

Nos sentamos num banquinho no mesmo parque que fui ao primeiro encontro com o Marco.
O cheiro do cigarro passava pelas suas narinas de um jeito irritante. Revirei os olhos e cruzei os braços.

-Aliás, quais nomes dos seus amigos? Você nunca me contou.-ela parecia mais calma.
-Eu não gosto de citar nomes, por isso.
-Confia em mim. Aliás, o que eu posso fazer, se eu vivo solitária?
-Tá bom... a "Cornélia" se chama Lucrécia. Foi minha primeira amiga no meu primeiro dia de aula. O "Príncipe" é o Marco. O garoto que me fez confusa. A "bruxa" é a Alice....

Ela arregalou os olhos quando citei o último nome.

-Que foi?
-Como ela é exatamente? A Alice?
-Ah, do mesmo jeito que eu te descrevi. Cabelos pretos, baixa e atleta.
-Seu sobrenome?
-Esposito.
-Não acredito.
-No que?
-Ela é minha prima!
-Que?? Tem certeza?
-Sim! Se é do mesmo jeito que você descreveu, é ela sim!
-Mas como isso é possível? Vocês nem se parecem...
-Ela e o irmão gêmeo, são adotivos dos meus tios. Ela se mudou pra cá conosco. Os "pais"deles são mais financeiros que nós, então eles foram morar numa casa mais sofisticada.
-Não acredito! Adoção? Isso seria a última coisa que eu iria pensar. Mas que coincidência! Ela é chata com você?
-Muito. Eu conheço ela com a Palma da minha mão. Mas é esquisito eu não ter reconhecido ela pelo seu jeito de falar.
-Ai, por favor, não conte nada a ela.
-Não vou, prometo. Aliás, ela já fez coisas piores comigo! Ela parece ser a Santa, mas é um demônio em pessoa! O Luigi até é bonzinho, mas muito vaidoso pro meu gosto!
-Nossa, você até sabe o nome do irmão dela! Deve ser mesmo a sua prima.
-Ela já repetiu de ano e foi expulsa na antiga escola. E os pais mimam ela, compram tudo o que ela quiser!
-Ah, ela fica falando mal dos outros, sendo que já repetiu de ano e é adotiva! Acho que ela nunca falou isso pra ninguém.
-Alice não gosta de falar da sua vida pessoal.-e mudando de assunto-E o Marco,Laura?
-Er...

Fiquei cabisbaixa só de lembrar do seu toque. Da sua voz, de seus cabelos,do seu sorriso... Mal podia imaginar que aquele encantamento iria acabar tão rápido...

-O Marco já me demonstrou que gosta de mim. Mas acho que ele já se esqueceu.
-Por que?
-Prefiro não falar.

Ela revirou os olhos.
-Meninas são todas frescas. Ainda bem que não sou assim.

Ri só pra descontrair, mas ela não sabe mesmo o que eu passei.

O dia estava caindo e então eu levei ela até o portão de sua casa e em seguida fui pra minha.

Entrando em casa, fiz meus deveres e no dia seguinte teria que acordar cedo para ir a escola. Fiquei com um nervoso na barriga só de imaginar encontrar novamente todos aqueles olhares estranhos em torno de mim. Isso seria um grande desafio para superar.

Fiquei com medo de voltar aos meus sonhos estranhos e então, eu pedi para o meu irmão dormir comigo (coisa rara) , e ele, óbvio, aceitou.

-Que estranho você pedir isso, irmã.-disse ele sussurrando no meio da noite.
-É pra isso que os irmãos servem, certo?-falei mais baixo que pude.
-É, mas você odeia quando eu estou com medo e peço pra dormir com você.
-É porque você ronca.-ri o que fez ele rir também. O abracei forte o que nos fez dormir assim. Abraçados.

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