Definitivamente havia acabado... minhas malditas férias. Me toquei quando o alarme que tinha posto na noite passada soou de manhã e abri meus olhos com raiva de o ter feito. Minha mãe sempre era a primeira a acordar em nossa casa seguido de meu pai, ambos desciam as escadas em direção a cozinha para tomarem café da manhã. Meu pai como sempre sentava em sua cadeira favorita que ficava encostada na parede enquanto lia seu jornal que sempre era entregue na porta de casa, sempre de terno e gravata mesmo estando desempregado. Minha mãe bancava a família trabalhando no salão de beleza que ficava a dois quarteirões de onde morávamos. Me sinto sortudo de ter herdado o cabelo ruivo que ela tinha mas também azarado por ter as sardas dela.
Levantei da cama, abri minha cortina, logo senti o sol da manhã tocar meu rosto enquanto ouvia os pássaros cantarem, estávamos entrando na primavera, o dia estava um pouco nublado mas a neve já tinha derretido. Dia 26 de Março, era a data do primeiro dia de aula na Saint Davis High School, o lado bom de ir para a escola é que eu podia ter um tempo só para mim diferente do que acontece dentro de casa, meus pais sempre discutem e na maioria das vezes o velho está bêbado. Mesmo eu deitando na cama e cobrindo minha cabeça com o cobertor a discussão nunca parava.
Minha mãe chegou até o rodapé da escada e berrou até sua voz alcançar meus ouvidos - MARVO QUERIDO! Não vai se atrasar para a escola, hoje é seu primeiro dia - Eu suspirei com desdém quando a ouvi e retruquei comigo mesmo - E aqui vamos nós, ir para a escola ver alguns desconhecidos -.
O maior porre é ser filho único, as pessoas sempre falam que eu sou mimadinho e que tenho tudo que quero na mão. Hmpf! Se eles soubessem o que rola na minha casa todos os dias, eles não iriam aguentar nem 24 horas. A escola ficava á alguns quarteirões da minha casa então não precisava pegar o ônibus, aliás... Acho que todos iam para escola á pé ou de bike. Nos obrigavam a vestir um uniforme horrível, um conjunto de roupas brancas com detalhes cinzas de tecido de algodão dos pés á cabeça. Meus olhos reviravam só de ter que vesti-las, mas era necessário, sem uniforme, sem escola. Por mais que eu gostasse de matar aula, eu não podia deixar muito claro que estava fazendo isso e fazer com que a direção ligasse para a minha mãe porque eu não estava indo á escola. Maldita Saint Davis High School.
Desci a escada que por sua vez me levou inconscientemente para a cozinha onde meus pais estavam. Meu pai me olhou por cima de seu jornal por alguns segundos e depois voltou a cobrir seu rosto com o papel que segurava firmemente em suas mãos. - Está atrasado. - Ele disse, com uma entonação seca sem expressar sentimento. Não o respondi. Na verdade, o ignorei. Minha mãe seguia virada de costas fingindo que limpava algum talher que estava em cima da pia enquanto ouvia o silencio que tomava a cozinha lentamente. Sabia que ela estava apreensiva de responder meu pai e ser repreendida na sequencia, tinha uma conexão com ela que nunca tive que meu pai então sabia o que ela estava pensando naquele momento. Após rapidamente tomar um suco de laranja e comer alguns biscoitos eu levantei da cadeira e falei baixo quase como um sussurro ''já vou indo''. Andei em direção a porta e não olhei para trás até sentir o sopro gelado do vento do lado de fora da casa.
Depois de uma breve caminhada, passei pelos portões principais da escola vi que a escola estava pouco movimentada, o pátio mesmo, estava vazio. Foi quando atrás de mim surgiu uma sombra bem alta, que ia me engolindo dos pés a cabeça, fui lentamente virando meu corpo com receio de ver oque tinha atrás de mim. Um homem, carrancudo, com os olhos cerrados e braços cruzados me olhando de cima a baixo, só percebi oque era quando ele abriu a boca.
- O que está fazendo aqui fora? Vá para sua sala. - Eu achei que ele estava de brincadeira com a minha cara, não tinha ninguém no pátio ou até mesmo no corredor. Então respondi:
- Quem é você? - Disse com um ar de arrogância. E ele então completou:
- Sou o Inspetor da escola! Quer levar uma suspensão logo no primeiro dia? Está atrasado moleque! Vá para sua classe.
Na hora eu comecei a soar frio, não acreditei que tinha sido o sorteado para pagar mico logo no primeiro dia. Me desculpei com o Inspetor e fui procurar minha sala. Pensei comigo mesmo "vou entrar na sala e todo mundo vai me olhar porque cheguei atrasado" meu ódio de ser notado em publico foi se alastrando dentro de mim enquanto eu andava pelo corredor vazio tentando achar minha sala. Entre alguns toques na porta e um "pode entrar" mais ou menos uns 33 olhares foram direcionados á mim. Me sentiria melhor se tivesse matado a aula. - Você é novo? - Disse o professor que parou sua aula para dar atenção para mim. - Me passou pela cabeça varias formas de responde-lo mas respondi apenas com um simples ''sim''.
Já tinha alguns caras lá atrás da sala dando risada mas achei melhor deixar eles pra lá e ficar na minha. Dei uma breve olhada na sala e achei uma carteira vazia, sentei e logo abaixei a cabeça, a aula era de biologia, a pior. Eu preferia historia, achava demais o fato de saber o que aconteceu vários anos atras, o professor Germaine de biologia assim como estava escrito na lousa era um saco, seus olhos esbugalhados por causa de seus óculos de grau, seu cabelo castanho creme enrolado e suas roupas cafonas o faziam mais tedioso do que sua própria aula. O único som que eu queria escutar era o barulho do sinal.
Acabei dormindo, quando me dei conta o dia já tinha se passado, levantei meio sonolento com uma babinha seca num lado da boca, peguei minhas trouxas e fui embora. A sala já estava vazia, ninguém fez questão de me acordar, nem mesmo o boçal do professor Germaine. Na saída todo mundo a minha volta estava com um grupinho de amigos, na frente, atrás, dos lados, e eu no meio andando sozinho na multidão de alunos que sairá dá escola. Pensando no que ia ter para comer quando chegasse em casa, eu fui olhando para o céu azul, estava de tardezinha mas ainda continuava bonito.
Perto da escola tinha um pequeno parque onde os alunos iam lá, alguns pra namorar, uns pra brigar, tinha vezes que rolava até drogas lá também. O caminho mais rápido para a minha casa era passar pela rua deste parque, e como sou um cara bem ''sortudo'' não deu nem tempo de atravessar a rua que uns caras me gritaram ''AÊ NOVATO!''
Eram três caras, pareciam durões tinham um ar de serem punks, um deles inclusive estava com uma jaqueta de couro preta e com um cigarro na orelha, os outros dois estavam com o mesmo uniforme brega com o que eu estava usando mas ainda assim metiam marra. - Você que é o tal do Marc? - Disse um dos que estava de uniforme. - Não cara, o nome dele é Marco. - Respondeu o outro que estava do lado dele.
Os dois davam medo de início mas eram completos babacas se achando o tal só porque estava com o cara de jaqueta de couro do lado deles. O fato de falarem com um sotaque de interior num jeito meio caipira faziam os dois ficarem mais bobocas ainda, eu nasci em Londres então não falava do mesmo jeito, pareciam ter a mesma idade que eu talvez uns 17, mas o outro cara eu tinha certeza que era furada me meter com ele, já parecia ter uns 21 e poucos por aí.
- É Marvo, com V. - Eu os corrigi. Um dos que estava de uniforme iniciou um breve dialogo:
- Dizem que você é bem marrento e que já respondeu pro Inspetor cara a cara e ainda saiu impune. - Queria saber como diabos ele já sabia disso, enfim, notícias.
- É... - E dei uma risada superficial enquanto já dava alguns passos para trás para sair de lá. Neste ato, um deles colocou a mão no meu ombro virando meu corpo novamente em direção a eles e me deu um folheto, era um ingresso para uma festa que ia acontecer na noite do dia seguinte.
- Dá uma passada lá, vai ser perto da indústria. Vamos beber e pegar umas garotas, dizem que lá tem várias assanhadinhas. - Deu uma risadinha no final enquanto pegava seu pente do bolso para pentear seu topete castanho.
Era óbvio que ia ser naquele lugar, a área industrial, o pior bairro de Hilltown. Ali a noite tudo pode acontecer. Mesmo eu estando receoso com essa ideia eu não ia arregar na frente deles. - Tô dentro, vejo vocês lá. - Falei com o peito estufado mostrando ''confiança''. Aceitei a proposta dos caras, Não sabia se queriam fazer amizade comigo ou se queriam outra coisa, mas de uma coisa eu sabia, eu ia entrar numa merda das grandes.
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A Verdadeira Amizade
Ficção AdolescenteSeu nome é Marvo, um garoto ruivo da Inglaterra de 16 anos que está de mal com a vida, quando ele entra no ensino médio acaba sendo procurado pelos greasers, os valentões da escola Saint Davis, mas quando ele precisa tomar uma decisão difícil o rumo...