Traumas

4.1K 351 23
                                    



Era quase meia-noite quando encontramos uma lanchonete de esquina ainda aberta, vi algumas pessoas lá dentro e imaginei se estavam numa companhia tão magnífica quanto eu. Samantha sabia ser irritante, mas, de alguma maneira, eu não estava chateado ou irritado por estar ali. Antes de entrar, olhei para ela tentando, de alguma forma, confirmar se estar ali era mesmo necessário. Ela me ignorou e entrou chamando a atenção de todo mundo com seu vestido de gala e se sentou numa mesa no canto da parede. Percebi olhares irem dela a mim e quando a olhei de novo, notei que segurava a risada.

- Será que acham que sou milionária também? - ela sussurrou de propósito enquanto pegou o cardápio e colocou na frente do rosto, impedindo-me de vê-la.

- Duvido. Que milionária vem até uma lanchonete de esquina a essa hora?- ironizei quando já estava sentado e percebi que só havia um cardápio, então o peguei de sua mão e ela franziu o cenho de propósito.

- Você. Está numa lanchonete de esquina, a essa hora e é milionário.

Revirei os olhos e acabei nem prestando atenção no cardápio simples, escolhi um milk-shake de caramelo que, na foto, parecia bom. Um garçom apareceu e perguntou o que queríamos, fiz o meu pedido e ele anotou.

- E a senhorita? - perguntou o garçom olhando para Samantha. Ele era bem alto e magro, muito magro. Os ossos do rosto saltavam e os olhos grandes e castanhos grudaram em Samantha e pareciam não sair mais. Ele nem piscava.

- Hum... Eu vou querer...

- Samantha, escolhe logo. - apressei-a.

- Não precisa se apressar. Eu espero. - o garçom sorriu largo e meio nervoso, seu rosto ficou vermelho de repente e eu tentei não prestar atenção nos dentes tortos e amarelos que ele tinha. Ele também parecia não ver a luz do sol há uns dez anos.

- Ah, obrigada. - Samantha o olhou rapidamente e sorriu. Voltou-se para o cardápio e finalmente escolheu. - Eu quero um milk-shake de chocolate, por favor. - ela sorriu para o garçom mais uma vez eu podia jurar que o vi suspirar.

- Volto num instante. - ele saiu.

Samantha começou a rodar o cardápio na mesa e então eu perguntei:

- Por que fez aquilo?

Ela levantou os olhos.

- Aquilo o quê?

- Sorriu daquele jeito para o garçom.

Ele se derreteu por ela e quase a comeu com os olhos em poucos segundos. Ela sorriu largo pra ele e, de alguma forma, parecia haver algo de errado naquilo. Era quase como se ela soubesse que está mil degraus acima dele por ser linda e inatingível e o máximo que ele poderá conseguir é um sorriso.

Lembrei-me de quando falei com Natalie pela primeira vez, quando fui até o campus de direito e a encontrei por acaso. Ela me tratou mal e deixou bem claro o quão superior era.

- Como assim sorri daquele jeito? Que jeito? - ela riu.

- Sorriu como se fosse um consolo, pois o cara é esquisito. Como se dissesse que é superior e ele estivesse sendo privilegiado por ganhar um sorriso seu.

Samantha fez a mesma cara confusa e engraçada de outras vezes.

- Sinto-lhe informar, mas você está ficando maluco. Eu não sou superior a ninguém e um sorriso não quer dizer isso. Você é quem tem complexo com essas coisas.

- Complexo? - franzi o cenho.

- Natalie Jackson, esse é o seu complexo pessoal. - ela mexeu no cabelo e de repente jogou tudo para trás bagunçando os fios e jogando a enorme franja para o lado.

O AcordoOnde histórias criam vida. Descubra agora