Cap 16

10.1K 426 3
                                    

Makaila Narrando:

Eu ainda não consigo acreditar que deixei o Mateus por causa do Alemão. O que eu estava pensando? As manhãs, que costumavam ser tão simples e tranquilas, agora são preenchidas por esse silêncio cortante. Ele me ignora completamente, e isso só aumenta minha frustração. A verdade é que, por mais que eu odeie essa situação, uma parte de mim ainda anseia por ele. O meu coração parece uma balança desequilibrada, balançando entre o amor e a dor.

Pego as coisas da Sofia e a coloco no colo, sentindo o peso da responsabilidade sobre os meus ombros. Olho para ela, seu sorriso inocente é um lembrete do que realmente importa. Dirijo-me para o carro, destravo a porta traseira, coloco a Sofia na cadeirinha e prendo o cinto, tentando manter a calma. O gesto simples de fechar a porta me dá uma sensação de proteção, mas, ao mesmo tempo, uma sombra de ansiedade se instala em meu peito.

Quando estou prestes a entrar no banco do motorista, sinto uma mão firme me puxar pelo braço. É o Alemão. O contato inesperado me faz sentir um frio na barriga.

—  O que aconteceu ontem não é pra você dizer a ninguém. E mais: não quero ver você de papo com nenhum macho. Agora você é minha amante, só minha e de mais ninguém.

Suas palavras ressoam na minha mente como um eco distante, e meu estômago se revira. Um amante? Essa ideia é absurda. Eu não posso ser apenas mais uma na lista dele. Ele pode se envolver com várias mulheres, mas eu não sou uma dessas piranhas. Isso não sou eu. O desejo de me libertar daquela prisão emocional cresce dentro de mim, mas o que ele disse me deixa confusa.

— Você está louco se acha que vou ser sua amante.

Ele simplesmente vira as costas e entra em casa. Fecho os olhos por um momento, tentando me acalmar. Não posso deixar que ele controle minha vida.

Entro no carro, coloco a chave na ignição e sigo em direção a casa, respirando fundo. O caminho parece interminável, mas a imagem da minha filha me dá força. Ao chegar, percebo a bagunça na entrada. Roupas espalhadas do JP e de alguma mulher, e a cena me faz suspirar. Mais uma vez, a realidade me confronta. Respiro fundo, lembrando que a vida não pode parar por causa disso. Sou mãe, e isso é o que importa.

Coloco a Sofia sentada no tapete da sala e ligo a TV, escolhendo "Masha e o Urso", um dos seus desenhos favoritos. Enquanto isso, começo a catar as roupas, organizando a casa, mas minha mente está em outro lugar. Lembro-me das conversas que tive com o Alemão, da intensidade dos nossos momentos juntos, e sinto um aperto no coração.

Quando estou na cozinha, preparando o almoço, ouço a Sofia chorar alto. Meu coração dispara e largo tudo, correndo até a sala. Ao chegar, deparo-me com uma cena que, em outras circunstâncias, teria me feito rir: a minha menina chorando porque "Masha e o Urso" acabou.

— Filha, amanhã dá mais, tá? — digo, tentando balançá-la para acalmá-la, mas nada parece funcionar. O desespero começa a se instalar em mim. — Vá, princesa, não chora, por favor.

Passam-se dez minutos e a situação não melhora. Já estou quase chorando junto com ela, a pressão me sufocando.

— Por favor, princesa, não chora — imploro, a voz falhando enquanto as lágrimas começam a rolar. — Eu sou uma mãe péssima!

— Boa, agora são duas a chorar! — ele diz descendo as escadas, parecendo ensonado. A sua presença me traz um alívio instantâneo.

— la não para de chorar, JP! Eu não sei o que fazer.

Ele se aproxima e, com um gesto gentil, pega a Sofia no colo.

— Você só está nervosa de vê-la assim. — Ele toca a testa da Sofia, seu olhar se torna sério. — Mana, essa menina está ardendo! Ela tem febre!

Assustada, coloco a mão na testa da minha filha e sinto a temperatura elevada. A culpa me invade. Como não percebi antes?

—  Eu não acredito que não percebi que a menina tem febre!

— É normal, Makaila. Você nunca teve um filho antes, e ela veio pra você já com um ano. Não se culpe. Vamos agora, vou contigo ao posto.

—  Obrigada por ir conosco, maninho — digo, limpando as lágrimas com o dorso da mão, sentindo uma onda de gratidão.

—  De nada, vocês são a minha família, pô.

Ele pega as chaves do carro e saímos juntos, ele dirigindo até o posto de saúde. A atmosfera no carro é tensa, e a preocupação pela saúde da Sofia pesa sobre nós. Olho para ela no banco de trás, sua carinha preocupada me faz sentir um nó na garganta.

Ao chegarmos, vejo dois agentes na porta. Um deles se aproxima de mim, enquanto o outro fala algo em seu rádio.

Agente 1: Patroa, o que está fazendo aqui com a menina? — diz, com uma sobrancelha arqueada.

Quando vou responder, JP fala antes de mim, a tensão visível na sua voz.

— O que você tem a ver com isso, Eli?

—Só estava perguntando, JP. O patrão não disse que ela viria hoje.

— O Alemão não manda em mim. Não preciso avisar sempre que quero sair.

Nesse momento, a Sofia se mexe no meu colo e, de repente, grita:

— Papai!

—  Princesa! — diz, pegando-a nos braços com um olhar alarmado. — O que vocês estão fazendo aqui?

—A Sofia está com febre, então vim com a Makaila ver o que ela tem.

O Alemão toca a testa da Sofia, e seus olhos se arregalam em preocupação.

— Ela está ardendo, caralho! — grita para uma enfermeira que passava. — Essa menina aqui é minha filha, é bom que ela entre já!

A enfermeira se aproxima correndo.

— Desculpe, senhor. Vou levar a menina já. Podem acompanhar-me e trazer a paciente.

Acompanhamos a enfermeira até uma sala onde uma médica, que aparenta ter uns cinquenta anos, está sentada com seu jaleco branco.

— Olá, eu sou a Raquel. Vou dar uma olhada nessa bonequinha aqui. Pode deitá-la aqui?

— Sim, claro — digo, colocando a Sofia na maca. Mas ela se agarra ao meu pescoço. — Está tudo bem, filha. Ela só vai ver o que você tem...

Olho para o Alemão, que está encostado na porta com os braços cruzados, seu olhar agora é de preocupação genuína.

Após examinar a Sofia, a médica se senta novamente e nos observa.

— Então, doutora Raquel, o que ela tem?

— Ah, ela só está com uma pequena inflamação na garganta, mas não é nada grave. Como ela é pequena e não entende, é normal que chore tanto. Aqui estão os medicamentos que ajudarão ela a ficar boa logo.

Agradeço à médica e pego os remédios que ela me entrega. Enquanto isso, o Alemão toma a folha da minha mão e sai rapidamente, a expressão dele é uma mistura de preocupação e raiva.

Na sala de espera, vejo JP e Leila conversando animadamente, e a cena é um lembrete do que tenho e do que perdi. Eles quase vêm correndo até mim.

—  O que ela tem?

Reviro os olhos antes de responder.

— É só uma infecção na garganta, mais nada. Queria comprar os medicamentos, mas o ogro levou a folha.

Eles começam a rir alto, aliviados.

—Acho que ele ficou magoado!

— Olha a minha cara de preocupação com ele — digo, saindo também, mas indo para casa com a Sofia e a Leila. O JP entrega as chaves para a Leila, que dirige até casa, comigo e a Sofia no banco de trás. O carro está silencioso, mas há uma tensão palpável no ar. Sinto a mão da Sofia na minha, e isso me dá um pouco de conforto.

No caminho de volta, as palavras do Alemão ressoam na minha mente. A ideia de ser sua amante não me sai da cabeça. Preciso me libertar disso, encontrar a minha própria identidade e a forma como quero ser vista. Não quero mais ser apenas uma mãe ou uma amante, quero ser mais.


De dois Mundos (antigo No morro sendo reescrito )Onde histórias criam vida. Descubra agora