Rixa familiar.

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     Afastei-me de Nicolae. Me pareceu inapropriado abraça-lo, assim. Mal nos conhecíamos.
     _ Me desculpe!_ eu disse.
     Ele pareceu tão sem graça quanto eu. Acho que não estava acostumado com carinho.
     _ Tudo bem! Eu sei que está passando por um momento difícil.
     _ Obrigada por entender. Vamos?
     Eu o segui para fora da faculdade. Alguns alunos estavam chegando. No meio do grupo, uma menina de cabelo castanho escuro e olhos castanho claro, estava olhando em nossa direção. Não era uma mera curiosidade sobre a novata. Era um olhar de repulsa. E eu me perguntei se ela sabia alguma coisa.
     _ Conhece aquela garota?
     Nicolae ficou tenso.
     _ É uma garota da qual deve manter distância.
     Ele não parecia inclinado a explicar.
     _ Qual é o problema?
     Ele suspirou exasperado.
     _ Existe uma animosidade entre os Bartholy e os Osborne.
     Eu tinha que manter distância então. Poderia querer me fazer mal. Mas, para haver uma rixa entre as famílias, eles eram...
     _ Osborne são lobisomens? Ela é uma lobismulher?
     Até uns dias atrás eu teria dado risada. Mas, agora estava comprovado, que os livros e filmes, não existiam à toa. "Onde há fumaça, há fogo". Pensei.
     _ Não, são bruxas e bruxos.
     Ele parecia querer dar risada.
     _ O que foi?_ perguntei.
     _ Você inventou um novo termo? "Lobismulher".
     E eu o vi dar uma risadinha contida.
     _ Ah, qual é? Não posso chamá-la de "homem lobo". É uma "mulher loba".
     _ Acho que ela não se importaria se usasse o termo masculino com ela.
     De repente, ele pareceu ter falado de mais. Deu uma tossidinha, para disfarçar. E eu não tinha certeza de ter entendido as entrelinhas.
     _ Por que bruxas teriam rixa com vampiros?_ indaguei curiosa.
     _ O Viktor denunciou várias, durante o período de caça às bruxas. Mas, elas se vingaram. Se uniram aos lobisomens e mataram muitos originais. Ainda hoje, dá para sentir a tensão no ar. Fique longe dela. Não queremos encrenca.
     A garota ainda me encarava com desprezo. Eu dei um sorriso, mostrando as presas. Ela recuou assustada. "É bom não mexer comigo. Não sou como Nicolae". Pensei.
     Fomos para a mansão e fiquei pensando sobre o que fazer, para passar o dia. Drogo e Peter estavam na faculdade. Lorie, na escola e Nicolae, no hospital.
     Aquela mansão parecia precisar de um toque feminino. Eles reclamariam se eu colocasse flores pela casa e trocasse as cortinas?... Como eu havia acabado de chegar, preferi me limitar a tirar poeira dos móveis e limpar a casa. Tirei do meu bolso à única coisa minha, que eu trouxe. O resto foi dado por Viktor. Era o pen-drive que estava no meu bolso, no dia do acidente. A tristeza veio forte e afastei aqueles pensamentos. Nas horas depressivas, eu gostava de escutar algo que fizesse mais barulho do que meus pensamentos ruins... Rock. Então, liguei o som deles, me surpreendendo pela potência. Com certeza, era do Drogo. Esperava que ele não fosse brigar por causa disso. A pasta se abriu e veio o som tão familiar e aconchegante, no momento de dor. Tinham músicas de três bandas... "Nightwish"; "Evanescence"; "Within Temptation". Eu comecei a varrer a sala quando os primeiros acordes de "Silver Moonlight" começaram. Sabia que levaria muito tempo para terminar. Quando finalmente terminei com a sala, fui para a cozinha. Que estranho! Por que vampiros teriam cozinha?... Meu estômago se revirou quando fui tirar o lixo. Eu sabia que se alimentavam do sangue de animais. Mas, eles caçavam. Não pensei que ia me deparar com isso. Até me lembrar de Lorie. Ela provavelmente não ia caçar. Eles traziam para ela. O odor podre da morte, me fez correr para o banheiro e vomitar. Eu nem queria saber que animal tinham dado a ela. Meu coração doeu e amaldiçoei Nicolae. Chorei pelo pobre animal. Depois, saí do banheiro e prendi a respiração para tirar o lixo. Foi mais fácil limpar os corredores. Havia uma porta no final, que emanava uma energia diferente. Curiosa, abri de vagar e espiei. Parecia uma espécie de porão. Era escuro lá embaixo.  A luz só mostrava os primeiros degraus da escada. Devia ficar completamente escuro, com a porta fechada. Eu não quis entrar. Sempre tive medo de escuro. Por mais irracional que fosse. Era como se algo espreitasse e quisesse me machucar. Enfim, odiava a escuridão. Que belo medo para uma vampira ter!...
     O quarto de Drogo era típico de um rebelde. Havia um pôster de banda de rock na parede. Uma guitarra. Estava com a cama bagunçada. Roupas espalhadas. Eu sabia que as pessoas não gostam de ter seu espaço pessoal invadido. Então, fiz o máximo que pude para limpar, sem tirar nada do lugar.
     O quarto de Lorie era o típico quarto de uma princesinha. Vários tons de rosa, rendas, seda. A única coisa diferente eram aquelas horríveis bonecas, de pano. Como podia ela gostar daquilo? Era macabro de mais. Havia até, uma sem cabeça. Recolhi aquelas pelúcias estranhas e limpei rápido.
     Meu corpo começou a reclamar. Estava cansada. Mesmo assim, me dirigi ao quarto do Nicolae. Não sei porquê, mas hesitei em entrar. Ele ficaria bravo?... bem, eu já tinha limpando os outros, então... Coloquei a mão na maçaneta e girei. Porém, uma mão, grande e gelada se colocou sobre a minha.
     _ O que pensa que está fazendo?
     Olhei assustada para Nicolae. Era tão tarde assim, para seu turno no hospital ter acabado?
     Lá embaixo, no primeiro andar, a música pareceu aumentar o volume. O menino rebelde estava em casa. E pelo visto gostava de "Call me when you're sober". Apesar do clipe fazer referência a "chapeuzinho vermelho e o lobo mal". Acho que ele gostava da ideia de um lobo ser o vilão da história e ao mesmo tempo, se identificava com o cara mal. Não sei. Talvez fosse outra coisa. O que importava agora, era o olhar irado que Nicolae me lançava.
     _ Só estava limpando._ expliquei.
     _ Só entre no meu quarto, se eu te der permissão!
     Ele estava brigando comigo. Então, porque meu coração disparou e eu me arrepiei. Quase desejando que ele permitisse minha entrada... "Não disse pra quê" sussurrou minha mente maléfica.
     _ Desculpe._ minha voz saiu baixa.
     Era hora de parar a faxina. Precisava de um banho. E descanso. Ainda não senti necessidade de me alimentar de novo.
     Fui para o meu quarto e tentei acalmar meu coração, respirando fundo. "Te proíbo de começar a gostar dele". Disse a mim mesma. Aqueles olhos frios, voltaram à minha mente. "Se eu te der permissão". Reverberou nos meus ouvidos. "Droga". Pensei. Acho que era tarde de mais. Algo já havia começado a mover em mim, na direção dele. "Maldito seja, vampiro lindo".

Is It Love? Nicolae - No limite do desesperoOnde histórias criam vida. Descubra agora