🌻07| Pérola

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Duas... Três... Eu não paro uma noite em casa e não apareço no trabalho havia três semanas. Já consigo ouvir os gritos da minha mãe. Que eu ando bebendo demais, dormindo pouco e transando demais. Não posso culpá-la, eu ando mesmo meio descontrolada.

Isso acontece, às vezes. Mesmo eu aceitando o meu destino, há dias em que o medo me consome. O medo de dormir e não acordar mais. Aí eu surto e começo a beber sem parar, transar sem parar. Tentando encontrar um meio para que tudo seja menos doloroso.

Agora estou eu dentro de um Uber me acabando no banco de trás com um carinha qualquer. Não sei o nome dele, apenas sei que ele é perfeito para satisfazer minhas necessidades.

- Minha casa ou a sua gata? - Ele disse mordendo minha orelha e alisando meus seios.

- Vamos para a minha. Mas, assim que isso acabar você dá o fora! - Eu falei com minha boca colada na dele.

Quando cheguei ao meu apartamento eu já estava praticamente nua e ele muito vestido. Eu queria me libertar da angústia, do medo. Queria algo que me fizesse parar de sentir. Eu queria que aquele homem me tirasse do meu próprio abismo. Mas, ele não o faria. Eu sei que não. Nenhum deles conseguem! No fim de cada noite eu sou uma mulher sozinha esperando o dia da sua morte.

Sem acender as luzes fomos para o meu quarto e assim que passei pela porta as luzes do abajur se acenderam sem eu dar nenhum comando. Olhei para trás e vi a figura linda e morena. Muito bem vestida e com cara de quem está prestes a cometer um homicídio.

- Mamãe? O que você está fazendo aqui? E como entrou na minha casa?

Ela se levantou com a mais pura calma do mundo e se retirou do meu quarto. Ah, que maravilha! Esse é o doce jeito da Dona Victória dizer educadamente, quando tem estranhos no recinto, de que precisamos conversar. De novo!

- Olha gato, sinto muito, mas você vai ter que ir embora.

- Oh claro! Mas, você pode me dar seu telefone? A gente marca de sair de novo. - Ele disse.

- Ah querido. Nosso lance foi legal, mas nós não vamos nos ver de novo. - Eu disse a ele que ficou um pouco desapontado.

Nos despedimos e então ele foi embora. Voltei minha atenção para a senhora brava que me esperava do outro lado da sala.

- Olha mamãe antes que você comece com todo aquele papo de novo... - Fui interrompida com uma dor aguda do lado esquerdo do meu rosto. Minha mãe acabou de me dar um tapa na cara. - Que porra é essa mãe? Você enlouqueceu?

- Primeiro, olha o jeito que você se dirige a mim mocinha! Você tem 25 anos, mora sozinha, mas eu ainda sou a sua mãe! Eu é que pergunto que porra você quer da vida Pérola? Com quantos caras você já transou essa semana? Dez? Vinte? O que você anda fazendo com a sua vida minha filha? Olha só o seu estado! Quase não consegue parar em pé de tão bêbada. Você está tentando se matar de vez é isso? - O olhar dela era o mais horrível que eu já tinha visto até hoje! O pior olhar que a minha mãe já havia me dado. Minha mãe me olhava com pena!

- Não me olhe assim! Já basta os olhares de todos no restaurante!

- Então, é por isso que você não aparece mais lá? Por que todos tem dó de você por ter câncer? Pérola as pessoas são assim! Olham assim pra qualquer pessoa doente! E eu olho assim pra você não porque você é doente, mas porque quem está te matando não é essa doença, mas sim você mesma! Você nem está tentando melhorar minha filha. Você começou o tratamento tão bem e do nada desistiu. Por quê? Me explica por quê está fazendo isso consigo mesma? Eu queria saber o que acha que seu pai diria se ainda estivesse vivo! O que ele acharia da filha dele agora?

- É uma pena que nunca saberemos, não é mesmo? Já que ele está morto e enterrado, assim como eu estarei em pouco tempo! - Minha mãe chorou como se algo a tivesse golpeado no peito. Aquelas palavras, eu jamais as diria se não estivesse tão bêbada.

Eu precisava descansar, dormir. Estava estressada demais para ter aquela conversa agora. Ela não sabia do motivo de eu ter desistido e nem precisava. Minha senteça já foi decretada ela não precisava sofrer mais do que isso. Eu pediria desculpas depois, mas não agora. Mais do que ela eu estava decepcionada comigo mesma, por ser tão egoísta. Por não poder viver e fazer ela feliz todos os dias como fazia desde quando meu pai se foi.

Eu me odiava por ter que deixá la sozinha. Eu odiava essa doença por ter que me tirar do lado dela tão cedo. Eu me odiava por ter que morrer.

Eu a abracei. Deixei que ela chorasse nos meus braços e depois que ela parou se afastou. Me entregou a chave reserva que eu deixava na planta que ficava do lado de fora do apartamento, pegou sua bolsa e se dirigiu a porta. Antes de abri-la ela se virou e me encarou. Seu olhar agora era de compaixão e amor. O olhar de uma mãe que sofre, que sente raiva, mas ainda assim é uma mãe.

- Eu ainda não desisti de você! Eu rezo a Deus todos os dias que alguma luz atravesse seu caminho e mude seu pensamento. Você pode ter pouco tempo de vida Pérola, mas ainda assim tem uma vida. E você precisa vivê-la antes que se arrependa. Eu amo você. - Ela disse sem esperar que eu respondesse e se foi.

Fui até a porta e a tranquei. Encostei minhas costas nela e deslizei até o chão deixando as emoções tomarem conta de mim. Minhas lágrimas eram de dor e arrependimento.

Minha mãe estava certa em tudo inclusive na parte em que eu desisti. Naquele momento em só queria estar morta e não ter que sentir como se estivesse morrendo aos poucos. Porque era exatamente isso que estava acontecendo.

Plano B (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora